Descrição de chapéu
O que a Folha pensa

Jogo de compadres

Senado dá aval esperado a Zanin; leniência fragiliza princípio da impessoalidade

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Cristiano Zanin, durante sabatina no Senado Federal, em Brasília (DF) - Evaristo Sá/AFP

Sem surpresa, Cristiano Zanin Martins, o advogado pessoal de Lula, teve sua indicação para o Supremo Tribunal Federal confirmada pelo Senado Federal. O placar foi folgado, 58 a 18 —bastavam 41 votos.

Na sabatina, Zanin cumpriu o roteiro esperado. Estava calmo, foi claro e objetivo. Fez loas à democracia, à separação dos Poderes, à independência dos magistrados, às garantias fundamentais.

Não respondeu às perguntas mais específicas sobre temas que estão em pauta, afirmando que não poderia antecipar seu voto em caso de assumir uma vaga no STF.

Se o processo de confirmação foi tranquilo e politicamente bem costurado, seu significado institucional é dos mais lamentáveis. A indicação, afinal, só atende de forma precária ao requisito essencial exigido para o cargo e viola de forma flagrante um dos mais venerados princípios constitucionais aplicáveis à administração pública.

O requisito é o notório saber jurídico. Ninguém duvida de que Zanin seja um advogado correto. Mas há, ou, pelo menos, deveria haver, uma diferença entre competência para atuar no mercado advocatício e o saber de que fala a Constituição.

Zanin não detém títulos acadêmicos de destaque nem é autor de obra jurídica de relevo. Sua reputação deve-se principalmente ao fato de ter defendido Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Lava Jato. E, vale observar, suas teses sobre o caso vinham sendo derrotadas em todas as cortes até o vazamento de diálogos comprometedores envolvendo o ex-juiz e hoje senador Sergio Moro (União Brasil-PR).

O princípio violado é o da impessoalidade. Como o próprio Lula reconheceu durante a campanha, é errado ocupar o STF com amigos.

O remédio institucional para tais moléstias se chama Senado Federal. Conforme o modelo aqui adodado, o presidente da República propõe o nome para a vaga no STF, mas ele só é efetivado se os senadores, após sabatina, o aprovarem.

Na prática, entretanto, rejeições têm probabilidade quase nula. Houve apenas cinco na história, e todas elas no longínquo 1894, sob o governo de Floriano Peixoto.

Há um problema de desenho. No Brasil, devido ao chamado foro especial, os senadores, ao decidirem se aprovam ou reprovam ministros do STF, estão escolhendo quem vai julgá-los caso enfrentem problemas com a lei —e ninguém quer correr o risco de indispor-se com seu juiz natural.

A consequência dessa atitude mais complacente é tornar o sistema muito pouco efetivo. Como o controle exercido pelo Senado é frágil, presidentes se sentem livres para indicar quem bem entenderem, mesmo que isso viole princípios fundamentais como a impessoalidade do poder público.

editoriais@grupoflha.com.br

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.