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Jaceguara Dantas da Silva

A sobrecarga de opressão sobre as mulheres negras

Há enorme correlação entre cor da pele e probabilidade de mulher sofrer violência

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Jaceguara Dantas da Silva

Desembargadora no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, é cofundadora do grupo TEZ (Trabalho Estudos Zumbi) e primeira promotora titular da Promotoria de Justiça dos Direitos Humanos de Campo Grande

A violência contra a mulher, que fere de forma indelével sua dignidade humana e impede o seu pleno desenvolvimento, representa um dos maiores desafios da atualidade para os direitos humanos. E, quando buscamos analisar a questão sob o prisma da interseccionalidade, constatamos a sobrecarga de opressão a que estão sujeitas as mulheres negras, discriminadas não apenas por seu gênero, mas por suas características sociais e étnico-raciais.

Em todo o país, os números da violência de gênero contra a mulher revelam que as negras sofrem o dobro das agressões perpetradas contra as brancas. Dos casos de violência física às vias de fato e estupro, a proporção se repete. Nos casos de homicídios e feminicídios, a relação se amplia: as negras sofrem o triplo. Esse resultado é insofismável e demonstra a profunda correlação entre cor e etnia e a probabilidade de a mulher sofrer violência.

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Mulher pouco antes de ser assassinada no Ceará após reclamar de uma cantada - Reprodução/G1

Conclui-se ser indispensável que o Estado invista em ações que previnam, coíbam e punam todo tipo de preconceito e discriminação. Incluir como obrigatória a disciplina de direitos humanos nos currículos escolares é apenas um exemplo a ser implantado, assim como a capacitação dos operadores do direito, promotores, defensores, magistrados e respectivos servidores, a fim de propiciar maior sensibilização desses atores para a realidade das mulheres negras. Mesmo com instrumentos legais eficientes, a falta de uniformidade de informações nos sistemas processuais, que nem sempre têm campo de gênero e raça, dificulta garantir a mulheres negras proteção semelhante à de brancas.

A inserção do elemento raça em todos os órgãos que trabalham com violência de gênero nos ajudará a dimensionar as fragilidades desse segmento e a atuar numa linha mais prospectiva. Importante também disseminar, junto às mulheres negras, informações sobre racismo, sexismo e classismo, fomentando a discussão desses temas, para que se torne público o sofrimento experimentado no ambiente privado, dando visibilidade aos conflitos nele estabelecidos.

Assim tematizados, poderão ser objeto de pesquisa e contemplados em leis e políticas públicas, mas, acima de tudo, impulsionarão novas formas de coibir, prevenir e punir todo tipo de preconceito e discriminação, sejam eles arraigados ou novos.

Na caminhada histórica pela conquista dos direitos civis, as mulheres traçaram suas próprias trajetórias, sendo as mais exitosas as uniram esforços para a concretização desses objetivos. Assim, é essencial dar destaque ao movimento que clama por mais mulheres negras no nosso Judiciário, que será tanto mais efetivo na promoção da justiça quanto mais diversa for sua composição.

É fundamental que os movimentos de mulheres negras e as instituições incumbidas da defesa de seus direitos prossigam vigilantes e atuantes, nestes tempos de intolerância e retrocesso no que diz respeito aos grupos vulneráveis, para que efetivamente a igualdade de gênero, social e étnico-racial seja realidade.

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