Anistia controversa

Projeto de Tarcísio que perdoa multas da Covid premia infratores como Bolsonaro

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O então presidente Jair Bolsonaro retira máscara de proteção facial durante agenda pública em Guaratinguetá (SP), em junho de 2021 - Foto Reprodução - Reprodução

É nebuloso o interesse público do projeto do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) para perdoar multas aplicadas na pandemia de Covid-19, ora aprovado pela Assembleia Legislativa de São Paulo —e não apenas porque um dos principais beneficiados é Jair Bolsonaro (PL), padrinho político do titular do Bandeirantes.

A medida foi inserida em uma proposta mais ampla para facilitar a cobrança da divida ativa de São Paulo —esta foi aprovada sem controvérsias. Já a anistia, votada à parte e sob protesto da oposição, passou com aperto: apenas 4 votos além dos 48 necessários para que a sessão tivesse quórum.

Para o Executivo, a politização eclipsou a discussão técnica. Adotada por decreto do governo João Doria (PSDB), a cobrança de multa deveria ter caráter educativo, não arrecadatório. Outro ponto seria a burocracia: seriam mais de 10 mil autuações pendentes, e a Secretaria da Saúde não estaria dando conta desse volume, fora o alto custo para processá-lo.

Em maio de 2020, Doria estipulou que as multas começavam em R$ 276, para uma pessoa sem máscara na rua, e poderia alcançar, em situações mais extremas, R$ 276 mil, aí incluídas festas clandestinas, estabelecimentos comerciais e demais aglomerações.

É legítimo questionar a desproporcionalidade de tais valores ante a gravidade dos delitos, como fez esta Folha à época. Uma soma simbólica seria mais adequada para os casos mais simples.

Trata-se, agora, de uma receita considerável de R$ 72 milhões, e parte dessa arrecadação será desprezada pelos cofres do governo.

Decerto também é injusto que o perdão vá contemplar apenas os inadimplentes, em detrimento dos que já arcaram com as quantias. O poder público, ademais, esvazia o que foi concebido como uma providência em prol da coletividade.

Quanto a Bolsonaro, seu negacionismo da crise sanitária o levou à condição de infrator contumaz, somando cerca de R$ 1,1 milhão em multas por não usar máscaras e provocar aglomerações, como nas famigeradas motociatas.

O beneplácito também favorece em R$ 136 mil o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), um dos filhos do ex-presidente.

A pandemia vitimou 700 mil brasileiros —dos quais cerca de 180 mil viviam em São Paulo. As chagas do morticínio ainda estão expostas; superá-las exige responsabilidade de governantes e legisladores.

editoriais@grupofolha.com.br

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