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Cezar Miola

Aos 35 anos, Constituição é o lastro da nossa democracia

Não foi só nos últimos anos que a Carta esteve em xeque

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Cezar Miola

Presidente da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), é conselheiro do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul (TCE-RS)

Lançado há alguns meses, o documentário "O Repórter do Poder" retrata a vida de Jorge Bastos Moreno, um dos mais reconhecidos jornalistas que já passaram por Brasília. O filme tem entre seus méritos reviver para as novas gerações o clima no país no final dos anos 1980, momento da promulgação da Constituição da República. Havia um ar de esperança e expectativa que aparece nitidamente no discurso de Ulysses Guimarães no Congresso, naquele dia 5 de outubro de 1988. A Carta Magna completa agora 35 anos sob outro ambiente político, mas mesmo assim mantém-se firme como lastro da democracia brasileira.

Em diversos momentos, a Constituição foi submetida a ataques. Por vezes, a atmosfera beligerante, expressa no embate entre divisões partidárias e ideológicas. Nas ruas e nos plenários, pareceu que iria transbordar. Até mesmo as mais altas esferas da República estiveram em intenso tensionamento. Mas o país soube caminhar dentro da legalidade constitucional, e esta demarca os limites a quem apostou em outra direção.

Levada durante os atos de vandalismo no edifício-sede do Supremo Tribunal Federal (STF) no último domingo (8), a réplica da Constituição Federal de 1988 que ficava em exposição no Salão Branco será devolvida à Corte. A presidente do STF, ministra Rosa Weber, recebe  o exemplar das mãos do ministro da Justiça e Segurança, Flávio Dino
O ministro da Justiça, Flávio Dino, entrega à ministra do STF Rosa Weber exemplar da Constituição que ficava na sede do STF e foi roubada por vândalos em 8 de janeiro - Rosinei Coutinho/SCO/STF

Curiosamente, não foi apenas nos últimos anos que a Constituição esteve nominalmente em xeque. Em 2013, época de inúmeras manifestações, a Carta entrou na mira na esteira da onda de protestos que varreu o Brasil. Líderes políticos e movimentos de rua defenderam a convocação de uma nova assembleia constitucional como saída ao impasse daquele momento. Novamente, o bom senso prevaleceu e a ideia não foi levada adiante.

Em vez de cogitar uma nova Carta, o Brasil deve apostar na sua plena concretização. Ao mesmo tempo, aprimorar significa reconhecer que se trata de um diploma vivo, que não pode ficar desconectado de cada tempo. Assim, por exemplo, cabe manter fortalecido o controle externo, assegurando-se sua autonomia e seus instrumentos de ação, a fim de que possa continuar agindo cada vez com mais ênfase na prevenção, na orientação, nas soluções consensuais e, quando necessário, na sanção.

Enquanto tivermos a Constituição e seus princípios como referências, será possível avançar dentro das regras do pacto firmado em 1988, consolidando a democracia, com menos desigualdades e em prol do desenvolvimento. Para tal, a própria Lei Maior nos oferece os substratos e o norte, indicando os objetivos fundamentais da República, os direitos individuais e coletivos protegidos e os meios para alcançá-los. Entre esses, certamente o mais democrático, justo, efetivo e duradouro é a educação, começando-se por cuidar da primeira infância na sua plenitude.

Naquele dia 5 de outubro, no plenário da Câmara dos Deputados, como nos mostra o documentário, Ulysses resumiu o sentimento de uma sociedade que deixava para trás duas décadas de ditadura: "Ecoam nesta sala as reivindicações das ruas. A nação quer mudar. A nação deve mudar. A nação vai mudar".

Sim, doutor Ulysses, o Brasil mudou e a nossa geração tem o desafio de seguir trabalhando e mudando, zelando pela Carta que expressa nosso grande acordo civilizatório, cuidando do presente e mirando o amanhã.

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