O Regulamento da União Europeia contra o Desmatamento em cadeias produtivas (EUDR) gerou intensa movimentação da comunidade internacional. A lei em questão é resultado de um longo processo que se iniciou com os compromissos climáticos assumidos pelo bloco europeu dentro do European Green Deal. Entretanto, diversos países, entre eles o Brasil, protestaram contra o regulamento.
A regulação proibiu produtos dentro do escopo de sete commodities de entrarem no mercado europeu ou dele saírem sempre que originados de local desmatado ou com degradação florestal a partir de 31 de dezembro de 2020, sendo a previsão para início das proibições no final de 2024. Visto não se limitar a ilegalidades na cadeia de produção, produtos brasileiros ficariam proibidos mesmo se produzidos apenas segundo a lei brasileira. Ademais, a regulação prevê a possibilidade de revisão periódica para, entre outros pontos, a expansão do rol de produtos e de outros ecossistemas abarcados.
O EUDR estabelece também uma série de instrumentos e obrigações às autoridades europeias e aos importadores desses produtos, inclusive contando com uma classificação de risco e a necessidade de apresentação de uma declaração de devida diligência. Essas obrigações devem ser cumpridas a fim de que o produto ingresse no mercado europeu. Portanto, os produtos brasileiros poderiam enfrentar barreiras comerciais adicionais relacionadas ao maior custo e risco exigidos pela devida diligência para importá-los.
A preocupação do governo brasileiro não é de hoje, ainda mais considerando-se o ritmo de desmatamento da Amazônia, que tem chamado a atenção de toda a comunidade internacional. Divulgou-se recentemente uma carta de grupo de 17 países produtores de commodities, liderados pelo Brasil e pela Indonésia, endereçada à UE no Conselho de Agricultura da Organização Mundial do Comércio (OMC). Nela, demonstraram-se as reiteradas preocupações dos impactos que a lei pode provocar nas relações comerciais. Segundo a posição brasileira, a lei fere regras do comércio internacional ao estabelecer um sistema unilateral de avaliação de risco discriminatório e punitivo. A questão se insere na discussão sobre ações climáticas que se apresentam como forma de protecionismo dos países desenvolvidos, chamado de "protecionismo verde".
A carta conjunta também leva diversas demandas dos países do Sul Global, como a consideração dos impactos socioeconômicos nos países em desenvolvimento. Alega que a lei afetará de forma desproporcional os pequenos produtores desses países, provocando piora na sua qualidade de vida e renda. Sobretudo, pede que a implementação da lei seja feita em constante diálogo e cooperação com os países produtores, o que, segundo oficiais brasileiros, não foi feito até agora.
Ademais, os países produtores têm enfatizado o impacto da regulação sobre seus pequenos produtores, comunidades locais e populações vulneráveis. Entretanto, entidades da sociedade civil e de populações vulneráveis são favoráveis a uma regulação para a proteção das florestas como a regulação europeia. Destaque-se que o próprio EUDR prevê a necessidade de cooperação com países de fora do bloco, abarcando todos os possíveis stakeholders, como as comunidades indígenas, mulheres e micro e pequenas empresas. Nesse sentido, a União Europeia tem entrado em acordo com alguns países, inclusive signatários da carta apresentada na OMC, como Indonésia, Congo e Egito. Contudo, a sociedade civil desses países criticou duramente a falta de transparência e de inclusão do público geral.
Uma das indagações a respeito da norma diz respeito à sua efetiva implementação. Nesse sentido, no âmbito da 28ª Conferência das Partes (COP28), concluída em 13 de dezembro deste ano, a União Europeia aproveitou a oportunidade para lançar diversas iniciativas relevantes, entre elas o Observatório de Desflorestamento e Degradação Florestal, que é uma plataforma para monitoramento global de florestas e de produção e comércio de commodities.
A sociedade civil e a comunidade internacional buscam soluções para o aquecimento global. A União Europeia avocou-se o papel de reguladora universal de um bem público global, como a Amazônia, cuja proteção incumbe a toda comunidade internacional. Diante do agravamento dos desastres climáticos no Brasil e no mundo, quem teria legitimidade para proteger as florestas e qual seria a melhor forma de regular isso? As respostas para essas questões vão necessariamente exigir um esforço conjunto para a coordenação de soluções coletivas tomadas em foros multilaterais.
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