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Celso Amorim

Eixo da Paz

No conflito entre Rússia e Ucrânia, Brasil e China oferecem oportunidade de ação diplomática

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Celso Amorim

Assessor-chefe da Assessoria Especial da Presidência da República; ex-ministro das Relações Exteriores (2003-2010, governo Lula) e da Defesa (2011-2015, governo Dilma)

O conflito na Ucrânia continua sem perspectivas de resolução, gerando mortes, destruição, riscos de escalada e fissuras no sistema internacional.

Desde o início, seguindo sua tradição diplomática de respeito ao direito internacional, em particular à Carta da ONU, o Brasil condenou a invasão da Ucrânia pela Rússia. Essa posição foi afirmada em votações do Brasil nas Nações Unidas e reiterada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em diversos pronunciamentos e contatos com líderes mundiais.

O presidente Lula discutiu o conflito diretamente com Volodimir Zelenski e Vladimir Putin e me enviou a Kiev e Moscou, onde mantive encontros com os dois chefes de Estado.

O presidente Lula e seu colega ucraniano, Volodimir Zelenski - Ricardo Stuckert/Presidência da República - Via REUTERS

Ao longo do último ano, o Brasil participou de uma série de reuniões promovidas pela Ucrânia, para as quais foram convidados principalmente países do G7, outros países europeus e algumas nações do Sul Global. Nesses encontros, é de se notar a ausência da Rússia como parte e o limitado engajamento da China. Pelo fato de a primeira reunião ter ocorrido na Dinamarca, a iniciativa ficou conhecida como "Processo de Copenhague". Foram realizados outros encontros na Arábia Saudita, em Malta e na Suíça.

Está sendo programada a Conferência de Alto Nível na Suíça entre os dias 15 e 16 deste mês. O Brasil indicou como observadora nossa embaixadora na Suíça. Essa iniciativa ocorrerá em formato similar ao das anteriores. Independentemente das intenções, a não participação de uma das partes beligerantes permite antecipar que não será possível dar início a um real processo de negociação com base nessa plataforma.

Existe um verdadeiro anseio pela paz, que percebemos em contatos com interlocutores em diferentes partes do mundo. Acreditamos que tanto os países que mantêm boas relações com a Ucrânia quanto os mais próximos da Rússia devem auxiliar as partes a encontrar as bases para a retomada do diálogo. Por seu peso geopolítico, o engajamento da China é reconhecido como fundamental, inclusive por vários interlocutores ocidentais com quem tenho falado.

Celso Amorim, assessor especial da Presidência da República, e Wang Yi, chanceler da China, encontram-se em Pequim - Yue Yuewei/Xinhua

No contexto da visita recente que fiz à China, divulguei com meu colega chinês Wang Yi um comunicado conjunto sobre a guerra na Ucrânia. É uma relação de princípios e atitudes que poderiam colaborar para a paz. Vários dos países contatados demonstraram compartilhar da mesma visão.

A ideia central é de que não há alternativa ao diálogo e à negociação. Brasil e China apoiam o início de um processo que esteja aberto à participação de todos os atores relevantes e a diferentes propostas de paz.

O documento também menciona a importância da desescalada. Outro tema de grande importância é a oposição ao uso de armas nucleares e outras armas de destruição em massa. Temas humanitários, como proteção de civis, crianças e trocas de prisioneiros, também são destacados.

Kofi Annan, que foi secretário-geral das Nações Unidas e um ativo defensor da paz, costumava dizer que uma verdadeira negociação ocorre entre adversários, não entre aliados.

Ao refletirmos sobre possíveis caminhos para a paz na Ucrânia, observamos que não podemos nos render a narrativas simplificadas. Por mais que isso seja complexo, é preciso considerar fatores históricos e políticos. Legítimas preocupações de segurança de todas as partes devem ser consideradas. Essas questões precisam ser encaradas com realismo —não no campo de batalha, mas na mesa de negociação.

A articulação entre Brasil e China não é contrária a nenhuma iniciativa. Ela oferece uma renovada oportunidade de ação diplomática, que seguiremos explorando, em contínuo diálogo com a Ucrânia, a Rússia e todos os atores relevantes.

Continuaremos trabalhando para construir o Eixo da Paz.

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