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Roberto Allegretti

Constitucionalidade do indulto: premiação da barbárie ou julgamento técnico?

Decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre o Carandiru foi absolutamente correta

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Roberto Allegretti

Coronel da Polícia Militar, foi secretário-chefe da Casa Militar (2001-04) e secretário Nacional de Políticas sobre Drogas (2016-17); presidente da Associação Fundo de Auxílio Mútuo dos Militares do Estado de São Paulo

No artigo "Premiação da barbárie: as feridas reabertas do massacre do Carandiru" (9/8), publicado nesta Folha, o autor, membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), desqualifica decisão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo que, em julgamento realizado no último dia 7 de agosto, considerou constitucional o indulto presidencial concedido no final de 2022.

Utilizando percurso discursivo carregado de sofismas, a demonstrar o viés ideológico da narrativa, desconsidera princípios básicos de direito e ignora o enorme ativo de conhecimentos jurídicos dos ilustres desembargadores integrantes do órgão especial da mais alta corte paulista, que de forma amplamente majoritária —18 votos a favor e apenas 6 contrários— consideraram que o indulto obedece integralmente ao comando constitucional relativo ao tema.

Parentes e curiosos em frente à Casa de Detenção do Carandiru após a intervenção da Polícia Militar - Luiz Carlos Murauskas - 2.out.1992/Folhapress - Luiz Carlos Murauskas/Folhapress

Procurando, de forma intencional, vincular o julgamento realizado, cujo objetivo era o controle incidental de constitucionalidade de decreto presidencial, à continuidade do julgamento de processo criminal contra policiais militares que atuaram no controle da rebelião da Casa de Detenção, encerrado há tempos, demonstra ou falta de conhecimentos jurídicos básicos ou, o que parece mais provável, deliberado desvio intelectual.

Sabendo-se que, em sede de análise incidental de inconstitucionalidade, os efeitos serão sempre entre as partes, não pode o órgão julgador ampliar a análise para além do que permite a Carta Política e adentrar na seara dos efeitos da decisão. Apesar da alegação de que houve, além da análise da constitucionalidade, considerações sobre o mérito da intervenção, o que se viu, em verdade, foi um julgamento essencialmente técnico.

O que não se mostra técnica, mas, bem ao contrário, preconceituosa e desrespeitosa, é a utilização pelo autor dos termos "massacre", "bárbaro assassinato em massa" e "atrocidades", entre outros, em total desrespeito à dignidade de profissionais de segurança pública e de seus familiares e à própria instituição militar estadual. E, ressalte-se, sem fazer qualquer menção aos homicídios praticados pelos próprios presos, que nem sequer foram processados e julgados. O que também não se mostrou técnica foi a forma coletiva como foram condenados os policiais, ausente a individualização de conduta e com base unicamente na teoria do domínio do fato, sem que a imputação tenha sido acompanhada da devida descrição, no plano fático, do nexo de causalidade entre a conduta e o resultado delituoso. "Como não se pode identificar os responsáveis por eventuais excessos, punam-se todos." Essa foi a lógica do julgamento.

Ainda de forma irresponsável, lança dúvidas acerca do propósito da antecipação do julgamento do Incidente pelo Tribunal de Justiça, precedendo o julgamento pelo STF da ADI 7330 sobre o mesmo tema. Talvez não tenha tido o cuidado de verificar nas decisões intercorrentes da ADI aquela em que o ministro relator, atendendo a pedido formulado por "amicus curiae", solicita ao TJ-SP que prossiga no julgamento do incidente, independentemente da decisão da Suprema Corte.

A propósito, a entidade de que o autor é membro tentou, mas não conseguiu, ser admitida como "amicus curiae" na mesma ADI. Na decisão sobre o tema, o ministro relator ressaltou: "O artigo 7º, § 2º, da lei federal 9.868/1999 autoriza a admissão da manifestação de órgãos ou entidades investidas de representatividade adequada nos processos de controle abstrato de constitucionalidade que versem sobre matérias de grande relevância. Por isso mesmo, o ingresso no feito não se traduz em direito subjetivo". E concluiu: "Cabe, portanto, ao relator a análise do binômio relevância-representatividade, previsto no artigo 7º, § 2º, da Lei 9.868/1999, conjuntamente com a avaliação dos benefícios auferíveis dessa participação".

Talvez, especificamente em relação à matéria da ADI, não tenham sido atendidos pela entidade os pré-requisitos de relevância-representatividade, bem como identificados possíveis benefícios de sua participação —provavelmente, em razão dos posicionamentos carregados de viés ideológico, como aqueles que aqui estão sendo contestados.

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