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Uma abordagem inovadora para a conservação da biodiversidade brasileira

Com o envio de alertas, projeto fiscaliza incêndios e desmatamentos no cerrado

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Esta Folha tem noticiado repetidamente a degradação do cerrado, inclusive em editorial ("Cerrado vulnerável", 24/6). De fato, o bioma, um dos 36 hotspots globais de biodiversidade, está ameaçado. Mais da metade de sua extensão já foi devastada, colocando em risco não só a biodiversidade da savana mais rica do mundo mas também a segurança hídrica do Brasil. O desmatamento ilegal e as queimadas no cerrado correspondem a 11,4% das emissões brutas anuais de gases de efeito estufa do país, agravando ainda mais o cenário de crise climática.

Nesse contexto, a unidade local do Ministério Público de Mato Grosso em Itiquira, um município ao sul do estado e que contempla os biomas Pantanal e cerrado, lançou em 2018 o projeto "Olhos da Mata". Utilizando a plataforma gratuita Global Forest Watch (GFW), o projeto realiza fiscalizações remotas para identificar flagrantes de desmatamento ilegal, notificar proprietários e solicitar fiscalização em campo quando necessário.

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Fogo em Correntina (BA), no cerrado - Lalo de Almeida - 15.mar.24/Folhapress

A GFW envia alertas com a localização de novos desmatamentos e incêndios quase em tempo real. Com as coordenadas da infração, o Ministério Público identifica o imóvel rural no Cadastro Ambiental Rural e seu proprietário, e envia-lhe uma notificação exigindo a suspensão imediata do desmatamento não autorizado ou a apresentação de autorização para realiza-lo.

Caso o proprietário interrompa a atividade ilícita, é convidado a assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para reparar o dano ambiental, incluindo a recuperação de áreas desmatadas e compensação monetária pelas emissões de CO2.

Nós publicamos um estudo no periódico especializado "Environmental Conservation" intitulado "The Public Prosecutor’s Office’s experience using Global Forest Watch to monitor and deter deforestation in the Cerrado", onde analisamos a eficiência do projeto Olhos da Mata. De 78 notificações emitidas entre 2018 e 2020, nenhum infrator deu continuidade ao desmatamento nos meses seguintes. Em cerca de 90% dos casos houve a suspensão de atividades não autorizadas.

Antes das ações do projeto e das notificações, os alertas de desmatamento tendiam a aumentar em Itiquira. Essa tendência foi revertida após março de 2019. Dado o crescimento do desmatamento em Mato Grosso e no cerrado desde 2018, Itiquira apresentou o menor aumento na taxa de desmatamento da série histórica.

A participação do Ministério Público resultou em mais ações de responsabilidade administrativa, criminal e civil pelos danos ambientais, ao mesmo tempo em que reduziu as taxas de desmatamento. Em 2019, em mais uma evidência do êxito do projeto Olhos da Mata, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso adotou um procedimento semelhante para monitorar todos os biomas do estado.

Ao agir no início de atividades ilícitas, o Ministério Público mitigou os danos ambientais, evitando o desmatamento de milhares de hectares. Dado o baixo custo e amplo alcance do Ministério Público nos municípios, o arranjo institucional do projeto Olhos da Mata tem potencial de replicação em outros municípios brasileiros, especialmente aqueles localizados no cerrado, onde o desmatamento ocorre através de grandes projetos agrícolas —o que facilita a identificação dos proprietários.

Claudio Angelo Correa Gonzaga
José Guilherme Roquette

Ministério Público de Mato Grosso

Fabio Angeoletto
Normandes Matos da Silva
Luis Otávio Bau Macedo

Universidade Federal de Rondonópolis (MT)

Ana Paula Valdiones
Vinicius De Freitas Silgueiro

Instituto Centro de Vida, Cuiabá

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