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Raul Lycurgo Leite

Quem vai pagar a conta de Angra 3?

Custo é alto, mas desistir da usina será caríssimo para o país; trata-se de geração de emprego e energia limpa

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Raul Lycurgo Leite

Advogado e procurador federal, é presidente da Eletronuclear

A retomada de Angra 3 passará, em breve, por um momento decisivo na reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que decidirá pela conclusão ou não da usina levando em conta a análise do resultado do estudo independente do BNDES que avaliou a viabilidade técnica, econômica e jurídica do projeto. Segundo o documento, serão necessários cerca de R$ 23 bilhões para concluir Angra 3 e a tarifa de comercialização proposta é de R$ 653,31.

Mas, para além dos números, torna-se primordial considerar a correta apropriação e os agentes responsáveis pelos custos de uma obra de infraestrutura importantíssima para o sistema elétrico —em especial em um contexto de mudanças climáticas.

Vista geral das obras da usina termelétrica nuclear Angra 3, em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro - Divulgação Eletronuclear

As afirmações recorrentes sobre os altos valores que envolvem a construção de uma usina nuclear são verídicas, mas os empreendimentos garantem energia de base, firme, segura, constante —independem de fatores naturais— e limpa, sem emissão de gases de efeito estufa, por longos anos. Algumas por até 80, 100 anos, como já miram os órgãos reguladores dos Estados Unidos, onde existem atualmente quase 100 centrais nucleares em operação.

É compreensível discutir o investimento em novos projetos e seus modelos jurídicos, econômicos e financeiros. Contudo, a situação de Angra 3 demonstra ser infactível o debate sobre a sua retomada, pois é um empreendimento avançado, com quase de 12.000 equipamentos comprados e armazenados no sítio da Central Nuclear, esperando apenas montagem e comissionamento.

De 2009 até 2023, já foram investidos cerca de R$ 12 bilhões. E, para a sua conclusão, serão necessários pouco mais de R$ 23 bilhões, que serão financiados por um pool de bancos. O pagamento do "empréstimo" será feito, pelos próximos 16-20 anos, pela Eletronuclear, produzindo energia elétrica e gerando emprego, renda, oportunidades e desenvolvimento para o Brasil e para os brasileiros.

No entanto, é necessário dar luz ao outro lado da moeda. Se terminar a obra pode ser considerado caro, a não conclusão é "caríssima", deixando o cenário assustador e sem qualquer perspectiva de retorno ao Brasil e aos brasileiros.

Desistir de Angra 3, ao contrário do que muita gente pensa, não sairá "de graça". O estudo indicou que irá representar um custo de aproximadamente R$ 21 bilhões, valores estes que deverão ser quitados no curto prazo e agregam financiamentos já existentes (R$ 9,2 bilhões), devolução de incentivos fiscais (R$ 1,1 bilhão), desmobilização das obras (R$ 940 milhões), rescisão de contratos (R$ 2,5 bilhões) e o custo de oportunidade do capital investido (R$ 7,3 bilhões). Isso sem falar dos R$ 12 bilhões já investidos de 2009 a 2013 que seriam "afundados".

Em suma, os valores para a conclusão e para o abandono do projeto se aproximam, mas a diferença diz respeito a quem vai pagar a conta. Caso a decisão seja pela continuidade, a própria Eletronuclear será a responsável pelos custos, através de empréstimos obtidos a juros de mercado, e pagos, pelos próximos 16 a 20 anos, com a receita da energia gerada por Angra 3.

Por outro lado, não há recursos disponíveis na Eletronuclear para os pagamentos a curto prazo da desistência, ou seja, o custo de R$ 21 bilhões seria suportado pelos acionistas —ENBPar/União e Eletrobras— e, hoje, o controlador da Eletronuclear é a ENBPar, empresa pública da União.

Ademais, além de representar investimento e retorno, a magnitude do projeto permeia outros setores do país e posiciona o Brasil no cenário global, em perspectiva de crescimento.

Um estudo da Fundação Getulio Vargas, divulgado em fevereiro de 2024, aponta que cada bilhão de reais investido em energia nuclear provoca em um acréscimo de R$ 2 bilhões no PIB nacional e na geração de mais de 22 mil empregos diretos e indiretos.

A entrega de Angra 3, portanto, representa a geração de oportunidades, emprego, renda e desenvolvimento tecnológico, além de uma energia limpa, firme, de base e potência de 1.405 MW próximo ao centro de carga. E, ainda, uma lição a ser definitivamente aprendida: a pior obra de infraestrutura é a obra paralisada; obra de infraestrutura planejada e iniciada deve ser concluída.

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