Benefícios a juízes nos Estados têm disparidades e distorções

Em Rondônia e MS, auxílio-moradia ultrapassa teto estabelecido pelo CNJ

Belo Horizonte, Brasília e São Paulo

Os benefícios concedidos a juízes estaduais pelo país revelam um quadro de disparidade e distorções nas modalidades e valores de auxílios recebidos.

Isso se deve ao forte peso das legislações estaduais na definição dessas vantagens.

Há casos de Estados que oferecem auxílio-moradia que supera o teto estabelecido pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) para os juízes de todo país. No caso do auxílio-alimentação, a variação pelo país chega a 426%.

Prédio do TJ-SP (Tribunal da Justiça de São Paulo), na praça da Sé, em São Paulo - Avener Prado/Folhapress

Em Mato Grosso do Sul e Rondônia, 291 juízes estaduais recebem mais que os R$ 4.377,73 mensais de verba para moradia fixados pelo CNJ em 2014, após liminar dada pelo ministro Luiz Fux, do STF (Supremo Tribunal Federal). A diferença representou um gasto de R$ 1,5 milhão só no mês de dezembro.

Em Mato Grosso do Sul, todos os 213 magistrados que têm o auxílio-moradia (dos 216 do Estado) ganham de R$ 4.702 a R$ 6.094 mensais. Em dezembro, o valor chegou a R$ 12.188 por causa do 13º salário.

Em Rondônia, 78 dos 207 magistrados recebem o benefício acima do teto, com valores entre R$ 4.964 e R$ 6.094.

Questionado pela Folha sobre os valores que extrapolam o limite, o CNJ disse não haver posicionamento oficial sobre eles.

Em Mato Grosso do Sul, vale uma lei estadual de 1994 que fixa o valor do auxílio como 20% do salário do juiz.

Segundo o Tribunal de Justiça de Rondônia, o auxílio-moradia já era pago no Estado antes da resolução do CNJ, e os valores permaneceram os determinados por uma lei estadual de 1993: equivalente a 20% do valor dos subsídios para magistrados da capital e 15% para os do interior.

Para Fernando Cury, presidente da Associação dos Magistrados de Mato Grosso do Sul, o pacto federativo permite a autonomia dos Estados a respeito da administração e das finanças dos tribunais.

Ele afirma que o questionamento dos auxílios recebidos pelos juízes enfraquece o Judiciário e ameaça a República. Os poderosos que estão em Brasília sendo processados e muitos deles punidos jamais vão ser [mais] a partir do momento em que houver juízes mal remunerados ou que de alguma maneira possam sofrer alguma espécie de perseguição, disse Cury.

RETROATIVOS

Em Rondônia, 75 magistrados ainda recebem pagamentos retroativos de auxílio-moradia, que, em dezembro, somaram R$ 4,7 milhões.

O montante é referente a uma ação, encerrada no STF em 2014, para o pagamento de auxílio-moradia retroativo entre 1987 e 1993.

Segundo o Tribunal de Justiça de Rondônia, o valor devido, com juros e correções, foi dividido em 60 parcelas.

Em dezembro, os pagamentos de duas dessas parcelas foram de R$ 52.800 a R$ 103.667 para cada um, entre 41 dos magistrados envolvidos.

AUXÍLIO-MORADIA, EM R$
Folhapress

Em São Paulo, pelo menos quatro juízes e desembargadores que solicitaram no último ano o pagamento de auxílio-moradia receberam valores retroativos desde 2014 que somaram entre R$ 90 mil e R$ 162 mil por magistrado em três meses. Só em dezembro, os auxílios-moradia do Tribunal de Justiça do Estado somaram mais de R$ 10,3 milhões.

Em Minas Gerais, o presidente do Tribunal de Justiça encaminhou recentemente ao CNJ um pedido da Associação de Magistrados Mineiros para receber valores retroativos de janeiro de 2013 a julho de 2014. A categoria argumenta que a verba estava prevista em lei desde 1979, mas só passou a ser paga em 2014.

Cada magistrado teria direito a mais de R$ 83 mil. Segundo o TJ, qualquer pagamento depende da aprovação do CNJ e levará em conta o orçamento do tribunal.

AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO

No caso do auxílio-alimentação, uma portaria do CNJ de 2016 estabeleceu o valor em R$ 884 para os tribunais da União. O pagamento, de R$ 40,18 ao dia, acabou sendo seguido também em alguns tribunais estaduais, como de Minas Gerais e Paraná.

Numa outra ponta, no entanto, está o Amapá, que tem a maior média de auxílio-alimentação paga em dezembro R$ 2.840. Oito magistrados receberam R$ 3.047.

No Rio Grande do Sul, no Maranhão e em São Paulo, o auxílio é menor que R$ 884.

Embora a capital paulista tenha a terceira cesta básica mais cara do país, segundo o Dieese, o TJ de São Paulo é o que paga menor auxílio-alimentação, de R$ 540 a R$ 765. Em Salvador, capital em que o preço do alimento é o mais barato, os juízes recebem R$ 1.000 ao mês.

Em geral, os valores e as correções dos auxílios-alimentação são estabelecidas por resoluções da presidência de cada tribunal. Em alguns locais, como o Maranhão, por exemplo, a verba está atrelada a uma porcentagem do salário dos juízes.

O auxílio-saúde, pago em 12 Estados, também pode variar conforme a faixa salarial. Muitas vezes, a idade do magistrado também é levada em conta.

Em poucos Estados, são pagos ainda auxílio-educação, ajudas de custo e para transporte esse último só no Rio.

Além das chamadas indenizações, isentas de imposto, a renda dos magistrados também é reforçada com gratificações por acumularem funções ou exercerem cargos como o de juiz auxiliar, membro da mesa diretora ou de direção de fórum.

Os tribunais de Justiça dos Estados de ES, MT, MS, PR, AC, AP, BA, TO e do Distrito Federal não responderam à reportagem sobre como são determinados os valores de suas indenizações.

O TJ do Rio, o que oferece a maior quantidade de indenizações, informou em nota que os benefícios pagos a magistrados e servidores da Justiça decorrem de legislação específica e são custeadas por recursos próprios do Poder Judiciário, observando seu equilíbrio fiscal e orçamentário.

Os auxílios são eventuais, condicionados a regras, à situação específica de cada magistrado e não integram os salários, diz a nota.


BENEFÍCIOS PONTUAIS

RN - Salário família

Beneficiados: 114 de 247

Valores: de R$ 261,25 a R$ 1.828,27

Total pago: R$ 59 mil

> Segundo lei estadual, só quem ganha até R$ 586,19 pode receber, mas magistrados que tinham auxílio antes conseguiram manter

RJ - Transporte

Beneficiados: 638 de 1.273

Valores: de R$ 83 a R$ 2.513

Total pago: R$ 756 mil

> Pago apenas para magistrados de primeiro grau; tem base em lei estadual de 2013

RO - Auxílio-moradia retroativo

Beneficiados: 75 de 207

Valores: de R$ 3.392 a 103.667,52 (referentes a 2 parcelas em dezembro)

Total pago: R$ 4,7 milhões

> Magistrados ganharam em 2014 na Justiça direito a receber auxílio-moradia referentes a 1987-1993

SE - Parcela autônoma de equivalência

Beneficiados: 115 de 195

Valores: de R$ 4.005 a R$ 13.110

Total pago: R$ 1,2 milhão

> Pagamento de diferenças de remuneração em relação ao Legislativo Federal, relativas a 1994-2005

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