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Depoimentos em ação contra Lula não ligam compra de terreno a Petrobras

Marcelo Odebrecht disse em 2017 que não participou de contratos citados em denúncia

Felipe Bächtold
São Paulo

Uma das ações possivelmente afetadas pela decisão do Supremo Tribunal Federal de retirar das mãos do juiz Sergio Moro partes da delação da Odebrecht, o processo sobre a compra de um terreno para o Instituto Lula contém depoimentos que não relacionam essa negociação diretamente com ilegalidades na Petrobras.

Os procuradores, porém, ligam a aquisição do imóvel para o instituto do ex-presidente com um “caixa-geral de propinas” da empreiteira junto ao PT, que tinha como uma de suas fontes desvios na estatal.

Em depoimento em setembro do ano passado, Marcelo Odebrecht, ex-presidente do grupo e réu, disse que não se envolvia diretamente com o dia a dia da construtora com a Petrobras, atividade a cargo de um subordinado, e que a conta de propina chamada de “Italiano” tinha outras fontes de recursos, como contrapartidas referentes ao programa de submarinos Prosub e uma linha de crédito.

Os arquivos da conta Italiano, anexados na denúncia, mostram um débito referente a “Prédio (IL)”, o que, para a acusação, significa Prédio Instituto Lula.

Na terça-feira (24), a Segunda Turma do Supremo decidiu que depoimentos dos delatores da Odebrecht sobre a compra do terreno, dados à Procuradoria-Geral da República ainda em 2016, não têm a ver com a Petrobras e que os trechos da delação devem ser remanejados para São Paulo.

A defesa de Lula, autora do pedido, já pediu a imediata transferência de estado da ação penal. O efeito, porém, ainda é incerto.

O processo do Instituto Lula é um dos mais adiantados entre os ainda não sentenciados por Sergio Moro. A fase de audiência com réus foi concluída em 2017, mas pedidos de perícias e acréscimos de informações acabaram impedindo o caso de entrar em sua etapa de alegações finais.

A narrativa da denúncia tem trechos parecidos com os do processo do tríplex reformado pela OAS em Guarujá (SP), que levou à condenação do ex-presidente Lula a 12 anos e um mês de prisão: afirma que a empreiteira tinha um saldo de propinas com o partido derivado de desvios na Petrobras e que o petista se beneficiou pessoalmente dessa relação.

No caso do tríplex, porém, o empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, relacionou de maneira mais eloquente as irregularidades da Petrobras com a reserva e reforma do imóvel para o ex-presidente.

A denúncia a respeito do terreno cita como origens dos desvios oito contratos da Petrobras com a Odebrecht.

Marcelo Odebrecht voltou a depor no caso no último dia 11 e esclareceu afirmações feitas em emails entregues nos últimos meses. Não mencionou a Petrobras e disse que, quanto mais revisa seus arquivos, “mais complica a vida” de Lula.

Em setembro, ele afirmou: “Eu de fato não participei dos acertos desses contratos”.

Segundo o empresário, a estatal “não fazia parte” de sua agenda com os ex-ministros Antonio Palocci, também réu no processo, e Guido Mantega. “Na Petrobras não adiantava você vir por cima, quer dizer, as equipes tinham que construir a relação com o corporativismo da Petrobras”, disse o empreiteiro, que descreveu na audiência o processo de compra do terreno.

Outro delator, o patriarca do grupo, Emílio Odebrecht, que não é réu no processo, disse não ter “a mínima ideia” se havia relação entre o terreno e os contratos com a estatal.

Palocci, que tenta fechar um acordo de delação, disse, também em depoimento a Moro, que a Petrobras não era sua área de atuação direta. Mas concordou com a tese da acusação: “Essas obras e outras foram benefícios que a Petrobras e o governo deram para a Odebrecht, com esses benefícios ela pagou as suas obrigações e fez um caixa anunciado ao presidente Lula”.

A ação foi aberta ainda em 2016, antes, portanto, da homologação dos acordos dos delatores da empreiteira no Supremo Tribunal Federal, no ano passado.

PROCURADORIA DIZ QUE DEPOIMENTO REFORÇA TESE

Procurados pela reportagem, os procuradores da Lava Jato no Paraná dizem que o depoimento de Marcelo Odebrecht é uma das muitas provas que confirmam a acusação. 

“Ele reconheceu que, para além dos dois casos em que a planilha ‘Italiano’ envolveu contrapartidas específicas, o restante das fontes abarcava todo o relacionamento mantido entre o grupo Odebrecht e o governo federal nas gestões do Partido dos Trabalhadores. Neste relacionamento, comprovadamente, estava inserida a Petrobras.”

O elo entre os contratos e o terreno já foi questionado no processo por um dos réus, Roberto Teixeira, compadre de Lula. Sergio Moro, em resposta preliminar, disse que a denúncia não afirma que havia um “rastro financeiro entre cofres da Petrobras” e o dinheiro usado para comprar os imóveis. 

“Mas sim que as benesses recebidas pelo ex-presidente fariam parte de um acerto de propinas do grupo Odebrecht com dirigentes da Petrobras e que também beneficiaria o ex-presidente.”

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