Com nova turma, RenovaBR tenta enterrar desconfianças e se firmar como curso político

Associação que tem apoio de Luciano Huck selecionou 1.400 participantes em programa para eleições municipais

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São Paulo

Considerado um dos indutores da causa da renovação política na eleição passada, o RenovaBR vê em sua nova turma, de potenciais candidatos para o pleito municipal de 2020, uma maneira de dissipar desconfianças que ainda pairam sobre a entidade.

Fundada pelo empresário Eduardo Mufarej, a iniciativa divulgou nesta semana a lista de 1.400 pessoas selecionadas para o curso, direcionado a líderes que pretendem entrar na vida pública. São pessoas de 445 cidades, em todos os estados, que nunca ocuparam cargo eletivo antes.

O número de alunos no RenovaBR Cidades (como foi batizada a iniciativa) é dez vezes maior do que o registrado em 2018, quando 133 pessoas fizeram as atividades de olho em cadeiras no Legislativo. Dos 120 que se candidataram, espalhados por 22 partidos, 17 se elegeram para o Congresso e Assembleias.

Bancado com doações privadas, o projeto tem entre os principais divulgadores o apresentador Luciano Huck, que quase entrou na corrida pelo Planalto em 2018 e é lembrado para 2022. Ele mantém conversas com políticos e partidos.

Huck foi um dos incentivadores da criação do Renova, em 2017, ao lado de nomes do PIB como o empresário Abilio Diniz, o ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga e o publicitário Nizan Guanaes.

Suposições sobre agenda de interesses do grupo se difundiram desde então. A iniciativa chegou a ser chamada de "fundo da burguesia" pelo PSTU, partido de esquerda que se enfureceu diante da notícia de que um filiado se inscreveu na seleção anterior.

Para Mufarej, a nova turma será a chance de provar que a iniciativa é, de fato, suprapartidária e não cobra dos beneficiados mais do que compromisso com ética, boas práticas, combate a privilégios e transparência, independentemente de ideologia.

"Seria impossível exercer controle ou exigir qualquer coisa de um conjunto tão amplo e diverso de pessoas, que moram tanto em grandes capitais quanto em cidades minúsculas. Não tem como influenciar mais de mil pessoas em realidades tão distintas", afirma.

Os porta-vozes da organização insistem que o Renova não é um movimento de renovação política, como o Agora!o Acredito, que têm causas e posicionamentos. Sempre preferiram se colocar como uma escola para capacitar novos quadros.

Para comprovar que os apoiados eleitos não formam uma bancada, citam o exemplo da deputada federal Joênia Wapichana (Rede-RR), que na votação da reforma da Previdência destoou dos oito colegas oriundos do Renova e marcou não ao projeto.

"A gente sempre disse que a prática mostraria que não existe influência [da organização sobre os parlamentares]", afirma Mufarej. "Os questionamentos foram se diluindo ao longo do tempo. Não tem isso de ser 'financiado pelo capital', como alguns falam."

Na nova turma, segundo os recrutadores, 59% dos alunos são filiados a legendas e estão distribuídos por 30 partidos —informações detalhadas, contudo, não são divulgadas pelo grupo, sob o argumento de respeito ao sigilo dos participantes.

A lista contém apenas os nomes dos selecionados. A reportagem detectou filiados a Novo, Rede, PSB, MDB, Cidadania, PSDB, PSOL e PT.

O debate sobre supostas agendas ocultas de organizações afeitas à bandeira da renovação voltou com tudo há algumas semanas, com o imbróglio em torno de deputados que foram apoiados por movimentos e desrespeitaram a ordem das cúpulas partidárias na votação da Previdência.

A controvérsia foi personificada na figura dos deputados federais Tabata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES), que são ligados ao Renova e ao Acredito e foram dissidentes em suas respectivas siglas, marcando sim à proposta de mudança no sistema previdenciário.

PDT e PSB abriram processos contra os rebeldes que podem culminar na expulsão deles por infidelidade partidária. Caciques foram a público dizer que o parlamentar tem que decidir se serve ao movimento independente ou à legenda.

O ex-ministro Ciro Gomes, líder do PDT, defendeu a saída de Tabata e chamou os coletivos cívicos de "partidos clandestinos", o que gerou reação imediata. Mufarej divulgou uma nota dura, cobrando a modernização das siglas e dizendo que elas "não deveriam ter donos".

Nova turma

No grupo que começou a formação neste mês, 41% dos alunos ainda não são filiados. Embora tenham a intenção de saírem candidatos a vereador ou a prefeito em 2020, eles não se comprometeram a disputar a eleição obrigatoriamente. Parte deseja, por exemplo, ocupar cargos técnicos no setor público.

Dos 1.400 selecionados, 31% são mulheres; 39% se declararam pretos, pardos ou indígenas; 61% têm entre 25 e 39 anos; e 56% vivem no Sudeste (a segunda região com mais representantes é o Nordeste, com 19%).

Os escolhidos foram garimpados em um universo de 31 mil inscritos, o que superou expectativas dos organizadores —no processo anterior, em 2017, haviam sido 4.000 interessados.

Entre os participantes, estão: Filipe Sabará, que integra o governo João Doria (PSDB) e é pré-candidato a prefeito de São Paulo pelo Novo; Fred Luz, ex-diretor-geral do Flamengo, que atuou na campanha de João Amoêdo (Novo); e Cidinha Raiz, que foi candidata ao Senado em São Paulo pelo MDB.

O ativista político Samuel Emílio, coordenador nacional do Acredito; André Montoro, neto do ex-governador paulista Franco Montoro, um dos fundadores do PSDB; e Washington Fajardo, que foi auxiliar do ex-prefeito do Rio Eduardo Paes (hoje no DEM), também constam na lista.

Aparecem ainda nomes que compuseram a turma anterior e não se elegeram.

Os selecionados terão uma carga horária de 96 horas de atividades gratuitas, com aulas sobre temas mais genéricos, como renovação política e organização do Estado e dos Poderes, e assuntos específicos das cidades, em áreas como finanças, educação, saúde e planejamento urbano.

Também receberão dicas de comunicação, atuação em redes sociais, campanha eleitoral, montagem de gabinete e estruturação de mandato. O curso será oferecido pela internet, como uma faculdade a distância, até dezembro.

Receitas e gastos

A produção do treinamento e o recrutamento custaram R$ 3 milhões, de acordo com o Renova. Os inscritos passaram por prova de conhecimentos políticos, avaliação de currículo e teste para aferir integridade (para o caso de o controle ter falhado, há no site um botão para denunciar atitudes inadequadas de participantes).

No ano passado, segundo relatório financeiro ao qual a Folha teve acesso, a organização arrecadou R$ 18,5 milhões em doações e gastou R$ 9,8 milhões com formação.

O grosso dos recursos (R$ 6 milhões) foi destinado para as bolsas individuais concedidas a título de ajuda de custo, que iam de R$ 5.000 a R$ 12 mil. Desta vez, não haverá bolsa. "É inimaginável, dado o número de pessoas", diz Mufarej.

O auxílio foi concedido antes do início do calendário eleitoral oficial, para evitar acusações de financiamento privado de candidatos, o que é vedado desde 2015. O Renova é registrado como associação sem fins lucrativos.

A lista de 500 doadores de 2018 contém sobrenomes de famílias como Klabin, Lafer Piva, Villela, Jereissati, Moreira Salles, Horn, Setubal, Garfinkel e Botelho Bracher. O valor de cada contribuição não é público.

"Nossa meta é ter o maior número possível de doadores, não ser 'o programa de alguém'. Mas posso garantir que nenhum deles é responsável por mais de 5% da receita", afirma o fundador.

Segundo Mufarej, fortalecer a impessoalidade na origem do dinheiro ajuda a evitar pressões e conflitos de interesses. "Para nós, todos os doadores são importantes, desde o que dá R$ 50 até o que dá R$ 5.000. Divulgar nomes e valores chamaria atenção para um foco errado."

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