Descrição de chapéu Eleições 2018

Novatos eleitos pelo Renova relatam xingamentos e apoios na campanha de rua

Vitoriosos do grupo de formação de candidatos, do PDT ao PSL, pregam combate à polarização

Joelmir Tavares
São Paulo

Os 16 eleitos com a ajuda do RenovaBR (deputados estaduais e federais e um senador de oito estados) ouviram durante a campanha muita gente dando apoio à causa da renovação política.

Mas também escutaram xingamentos, gritos de amor e ódio ao presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) e suposições de que seriam tão corruptos quanto os políticos que queriam substituir nos parlamentos estaduais e nacionais.

Eleitos pelo RenovaBR são apresentados em evento promovido pela entidade em São Paulo; o empresário Eduardo Mufarej (à dir.) idealizou a iniciativa
Eleitos pelo RenovaBR são apresentados em evento promovido pela entidade em São Paulo; o empresário Eduardo Mufarej (à dir.) idealizou a iniciativa - Sara De Santis/Divulgação

"Nunca tinha sido chamado tantas vezes de corrupto na minha vida. Todo dia que eu estava panfletando na rua, alguém vinha falar: 'Ah, mais um que quer mamar na teta do governo'", disse o empreendedor Tiago Mitraud (Novo-MG), futuro deputado federal, em evento nesta segunda-feira (15) em São Paulo promovido pela entidade para apresentar seus vitoriosos nas urnas.

Mitraud e outros sete colegas de partido (maioria no grupo de eleitos do Renova) exibiam colado na roupa, durante a entrevista coletiva, um adesivo do candidato a governador de Minas pelo Novo, Romeu Zema, que disputa o segundo turno contra Antonio Anastasia (PSDB).

Os depoimentos, no auditório do Civi-co (um coworking "para empreendedores cívico-sociais" em Pinheiros, na zona oeste), resumiam o que foi pedir voto num momento de aversão a políticos, desejo de mudança e intolerância entre ideologias.

O Renova, uma iniciativa para formar novas lideranças políticas idealizada pelo empresário Eduardo Mufarej e financiada por benfeitores dispostos a oxigenar os quadros do poder, elegeu 13% do total de 120 participantes que concorreram no dia 7 de outubro. O percentual, de acordo com os porta-vozes, superou o esperado, de 10%.

Dos principais partidos em atividade no país, só o PT não tinha representante na lista de candidatos. O Novo, com seus oito vitoriosos, dominou a relação de eleitos, mas nela também figurou gente de siglas como PDT (caso de Tabata Amaral, escolhida pelos paulistas para deputada federal), PPS (Marcelo Calero, também federal, pelo Rio) e Rede (Marina Helou, estadual em São Paulo, e Joenia Wapichana, federal por Roraima).

"Representando Bolsonaro na rua, [foi] amor e ódio, paixão e ódio, xingamento, abraço, agressão", relatou o ex-nadador profissional Luiz Lima, do Rio, eleito para uma cadeira na Câmara dos Deputados pelo PSL, a legenda do capitão reformado.

"A gente fez um trabalho [...] sem usar recursos públicos, sem comprar nenhuma liderança, nenhum apoio, nada, sabe? Fazendo tudo do jeito certo", contou o economista Daniel José (Novo-SP), futuro membro da Assembleia Legislativa.

Os 16 eleitos usaram o evento para enfatizar o papel do Renova em suas vitórias. A entidade ofereceu preparação e treinamento na teoria e na prática, ao longo de seis meses. Também forneceu uma bolsa a título de ajuda de custo a cada um dos 133 participantes —o valor variou de R$ 5.000 a R$ 12 mil. Uma das regras para ser selecionado era nunca ter exercido mandato antes.

"A primeira coisa em que o Renova me ajudou demais foi convencer os meus pais que eu podia ser candidato. Porque, gente, foi uma oposição enorme dentro de casa", disse o engenheiro Felipe Rigoni, um dos mais jovens na turma, com 27 anos. Ele, que é cego, foi eleito deputado federal pelo PSB no Espírito Santo.

Mulheres foram minoria no grupo: representavam 10% no total de inscrições, chegaram a 28% nos selecionados do programa (após um trabalho da entidade para atrair interessadas) e são 18% no time de vitoriosos.

Com exceção da indígena Joenia e de dois autodeclarados pardos, os demais eleitos do Renova informaram à Justiça Eleitoral que são brancos.

"Eu brinquei que a desigualdade entre a renovação política e quem tem cargo é algo que deveria ser analisado pelo Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica], porque a concorrência é completamente desleal", disse Mufarej. "Mas estas pessoas aqui provaram que é possível."

Segundo o diretor do Renova, a organização não atuará como um partido ou um bloco na Câmara dos Deputados, onde terá nove representantes, filiados a várias legendas. Os parlamentares da "bancada" do movimento poderão atuar em conjunto se e quando acharem que têm agendas em comum, praticando o combate aos extremismos ensinado no curso.

Uma divergência se explicitou já durante o evento de apresentação dos eleitos. Luiz Lima, do PSL de Bolsonaro, disse que segue o entendimento de seu partido sobre a demarcação de terras indígenas e é contrário à ampliação. Joenia Wapichana, da Rede de Marina Silva, tem como bandeira justamente lutar pelos territórios.

O Renova diz não apoiar nenhum candidato no segundo turno presidencial. O discurso reiterado é o de que a entidade luta contra a polarização e quer promover debates sobre questões que mexem diretamente com a vida do cidadão, para além de rótulos como direita e esquerda e Estado mínimo e Estado máximo.

"O anseio da população era que houvesse uma renovação com consistência, com novas práticas", afirmou Marcelo Calero, ex-ministro da Cultura e futuro deputado federal. Para ele, a lição que fica é a da política com diálogo e entendimento: "Não a do compadrio, da prevalência do interesse particular, de interesses mesquinhos. Acho que o que eu vivi no caso Geddel é prova disso".

Dois anos atrás, ele deixou a pasta da Cultura do governo Michel Temer, detonando a bomba que derrubou o então ministro Geddel Vieira Lima. Calero denunciou ter sofrido pressão do colega de 
​Esplanada para liberar uma obra em Salvador. 

O próximo passo do Renova será dar capacitação específica para os eleitos sobre como exercer o mandato —princípios como transparência, conexão com o eleitor e redução de gastos e privilégios são inegociáveis. Novas inscrições já estão sendo recebidas, para uma turma que será aberta no ano que vem e deve catapultar candidatos para as eleições municipais de 2020.

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