Livro analisa STF em 2018 e identifica 'ativismo eleitoral' de ministros

Em coletânea de textos sobre o Supremo, pesquisadores e jornalista abordam sucessivas contradições da corte no período

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Uma análise do Supremo Tribunal Federal em 2018 identifica o “ativismo eleitoral” de alguns ministros, advogados, procuradores e políticos que se relacionam com o STF.

​“Não se viu nada de separação de Poderes. Viu-se o contrário. Interferência quase diária, apaixonada, fria ou sutil, necessária ou abusiva no processo eleitoral.”

A avaliação está no livro “O Supremo e o Processo Eleitoral”, publicado pela FGV Direito Rio e pelo site Jota. É o quarto volume do projeto Supra, uma “memória crítica” do STF.

A obra revela como as eleições influíram na dinâmica interna do STF, em meio à turbulência da Lava Jato, e projeta seus efeitos no governo Jair Bolsonaro.

São organizadores da obra os professores Joaquim Falcão, Diego Werneck Arguelhes e Thomaz Pereira, e o jornalista Felipe Recondo (sócio-fundador do Jota). O livro também reúne análises de outros professores e pesquisadores. É lançado pelo Grupo Editorial Letramento e Casa do Direito.

Os organizadores dedicam o livro a Otavio Frias Filho, “pioneiro e vencedor do jornalismo didático”. Jornalista, dramaturgo e ensaísta, foi diretor de Redação da Folha e diretor editorial do Grupo Folha. Morreu em agosto de 2018.

Hesitações e ambição

O que caracterizou o STF no período, segundo os autores, foram as “sucessivas e contraditórias hesitações”.

Nunca foi tão elevada “a ambição de alguns ministros” de se apropriar e privatizar suas decisões, capazes de influenciar, “intencionalmente ou não”, a escolha de dirigentes do Executivo e do Legislativo.

Essa militância é reforçada pela “ministrocracia”, o poder de um ministro para decidir casos importantes ou bloquear decisões, pedindo vista dos autos.

O período analisado envolve a troca de comando no STF e na Presidência da República, e alcança a guerrilha judicial que envolveu o “prende-solta” do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A ministra Cármen Lúcia assumiu o STF “avocando uma estranha função de pacificadora”. Admitiu que fracassou. Foi acusada de manipular a pauta de julgamentos e implodir pontes com colegas.

Toffoli se autoproclamou publicamente como ‘conciliador’. Buscaria pacificar um tribunal conflagrado. “Prometeu diálogo, colaboração e discrição, por parte do Supremo, neste primeiro ano de governo Bolsonaro”.

Em 2018, começou a moldar as ações dos políticos em 2019.

Sua mensagem —“deixar o governo eleito governar, em vez de criar obstáculos”— significaria “uma abertura do tribunal para formar sua pauta em diálogo com o governo”.

Toffoli revelou um “alinhamento político” com os militares. Nomeou um general em seu gabinete no Supremo.

Lançou uma ideia que pode minar a transparência do STF. Sinalizou a proposta de julgar virtualmente —e não presencialmente, com debates transmitidos pela TV Justiça— ações que fixam uma interpretação da Constituição.

No julgamento virtual, “os ministros adicionam seus votos no sistema do tribunal, sem que precisem jamais se encontrar, ou muito menos trocar argumentos de fato”.

Têm crescido também os julgamentos em bloco (“lista”), quando não são anunciados os temas envolvidos. A justificativa seria reduzir a grande quantidade de processos.

Decisões individuais

A Constituição não conferiu qualquer poder decisório a ministros individualmente. Apenas a maioria absoluta dos ministros pode declarar inconstitucional uma lei ou norma.

O livro cita vários exemplos que fogem às regras.

Alexandre de Moraes concedeu liminar monocrática numa Ação Direta de Inconstitucionalidade, quando o requerente tinha indicado que não queria a medida cautelar.

Marco Aurélio determinou a suspensão da execução provisória da pena a partir da segunda instância. Decidiu sozinho, no início do recesso judicial, e com efeitos para todo o país. Sobre o mesmo tema, Gilmar Mendes mudou de posição na mesma velocidade da conjuntura política.

Rosa Weber foi a única que, tendo votado vencida contra a possibilidade de execução antecipada da pena em 2016, curvou-se à jurisprudência do tribunal dali em diante.

“Sem um mínimo de cooperação republicana dos ministros, a reforma dos poderes individuais no Supremo não avançará”, preveem os autores.

“Infelizmente, já há sinais de resistência.”

O Supremo e o Processo Eleitoral

  • Preço R$ 72,50 (264 págs.)
  • Autor Joaquim Falcão, Diego Werneck Arguelhes, Thomaz Pereira e Felipe Recondo (orgs.)
  • Editora Grupo Editorial Letramento e Casa do Direito
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.