Pivô de crise, chefe da PF comanda estrutura autônoma com 13 mil servidores e 1.500 delegados

Cabe a ele e a outros chefes da corporação autorizarem recursos financeiros, físicos e humanos para as investigações

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Brasília

No centro de um imbróglio político e jurídico, o diretor-geral da Polícia Federal está no topo de uma estrutura com 13 mil servidores, entre policiais e funcionários administrativos, voltada para investigação de crimes, controle da migração e fiscalização de atividades como a segurança privada e a circulação de produtos químicos no país.

Para 2020, o órgão tem um orçamento autorizado de R$ 5,3 bilhões —outros R$ 2,4 bilhões estão condicionados à aprovação de um projeto de lei que abre créditos suplementares para as despesas correntes.

Sob o guarda-chuva do diretor-geral —ou DG, no jargão policial— estão cerca de 1.500 delegados, os quais, a exemplo do que ocorre com os procuradores da República no MPF (Ministério Público Federal), têm autonomia para tocar apurações, solicitar medidas judiciais e tirar suas conclusões em cada caso, com base nas provas reunidas.

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Agentes da PF cumprem mandado de busca e apreensão na sede do Ministério da Agricultura, em Brasília, na operação Carne Fraca - Pedro Ladeira - 17.mar.2017/Folhapress

Embora não haja uma regra expressa a respeito, não é praxe, por exemplo, que esses investigadores encaminhem à cúpula da PF dados e relatórios de inquéritos em tramitação na ponta, exceto se houver uma justificativa para isso —a necessidade de se mobilizar grande efetivo para uma operação policial, por exemplo.

O diretor-geral não investiga. Sua funções são principalmente de representante institucional e de gestor da PF. Cabe a ele, em última instância, e a outros chefes de escalões mais baixos da corporação autorizarem recursos financeiros, físicos e humanos para as investigações.

Segundo investigadores ouvidos pela Folha, essa prerrogativa é a que possibilita algum poder de interferência nos trabalhos.

Para se deflagrar uma grande operação, por exemplo, com o cumprimento de mandados de prisão e busca e apreensão, é necessário mandar grande efetivo a campo e pagar diárias de viagens —o que, necessariamente, depende da caneta dos chefes de delegacias, superintendências e, em alguns casos, dos diretores em Brasília.

Também é tarefa do DG, com demais dirigentes da corporação, definir as diretrizes da PF. Sendo assim, ele tem influência nas prioridades do órgão: pode retirar recursos do combate à corrupção e investir mais na repressão ao tráfico de drogas ou vice-versa, por exemplo.

O diretor-geral tem ainda papel na definição dos principais cargos da corporação e, portanto, grande influência sobre o que seus ocupantes fazem.

Uma vez escolhido e nomeado pelo presidente da República, em geral é ele quem escala os outros dirigentes.

A PF tem sete diretorias abaixo da Diretoria-Geral, entre elas a de Combate ao Crime Organizado, responsável pelas investigações criminais; a Técnico-Científica, que cuida dos trabalhos de perícia; e a de Inteligência, que municia a polícia de informações consideradas estratégicas.

A Casa Civil da Presidência da República é quem nomeia os chefes dessas áreas, mas a tradição é que eles sejam indicados pelo DG.

No caso dos superintendentes regionais nos estados, a designação é formalmente feita pelo Ministério da Justiça, ao qual a PF tem subordinação orçamentária. A escolha, em geral, também vem do gabinete máximo da polícia. A relativa autonomia investigativa é mais calcada na cultura institucional do que em regras escritas.

O pedido de demissão do ex-ministro da Justiça Sergio Moro, que acusou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de ingerência na polícia, gerou desconfiança sobre se haverá independência para conduzir inquéritos com potencial de atingir o clã Bolsonaro e seus aliados. A crise requentou a discussão sobre como blindar a instituição de ingerência política.

Em carta aberta, a ADPF (Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal) pediu a Bolsonaro que envie urgentemente um projeto ao Congresso prevendo mandato para o DG e que a escolha seja mediante relação previamente apresentada pelos delegados ao presidente, com sabatina.

Esse modelo era adotado para a definição do procurador-geral da República até a nomeação, por Bolsonaro, de Augusto Aras para a função. O chefe do Executivo ignorou lista tríplice com nomes sugeridos pela categoria.

"O projeto deve garantir ao diretor-geral escolhido pelo presidente a autonomia para nomear e exonerar todos os cargos internos da PF, mediante a obediência a critérios mínimos objetivos para cada cargo, definidos em lei", propõe a entidade.

"A partir da nomeação e posse do DG, manda o interesse público que o presidente mantenha uma distância republicana, de modo a evitar que qualquer ato seu seja interpretado pela sociedade como tentativa de intervir politicamente nos trabalhos do órgão, que por sua natureza costuma realizar investigações que esbarram em detentores do mais alto poder político e econômico, e tem como corolário de suas atribuições constitucionais exercer uma parcela do controle dos atos da administração pública federal, incluindo os da própria Presidência da República", afirma a ADPF na carta.

Moro deixou o governo após Bolsonaro demitir o então diretor-geral, Maurício Valeixo. O ex-ministro acusou o presidente de tentar obter informações de investigações e de estar preocupado com inquéritos que têm potencial de atingir seus filhos e aliados, em curso no STF (Supremo Tribunal Federal).

Desde o ano passado, em declarações públicas, o mandatário demonstrava interesse em preencher com pessoas de sua confiança cargos estratégicos da PF. Nesta quarta-feira (29), o ministro do Supremo Alexandre de Moraes suspendeu a nomeação de Alexandre Ramagem, amigo do clã Bolsonaro, para a Diretoria-Geral.

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