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Bolsonaro introduz o 'desconhecereis a verdade' em ato que fundiu Cristo e motoclistas

Presidente participou neste sábado (12) de motociata coorganizada por pastor evangélico

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São Paulo

“E desconhecereis a verdade, e a inverdade vos libertará”, corruptela do versículo 32 do capítulo 8 do Evangelho de João, o favorito de Jair Messias Bolsonaro, seria mais apropriada para o discurso do presidente neste sábado (12), após a “Acelera para Cristo”, procissão de motocicletas que desembocou no Ibirapuera (zona sul de São Paulo).

Fake news continuam sendo a tática preferencial para engajar eleitores. Só nesta tarde, Bolsonaro voltou a defender a suspensão do uso obrigatório de máscara para quem já foi infectado ou vacinado contra a Covid-19, dizendo que a ciência teria provado que vacinados não transmitem. Mentira.

Também exaltou o tratamento precoce na pandemia. Disse que foi “acometido pela Covid”, tomou hidroxicloroquina e “no dia seguinte estava curado”. Não há nenhum estudo científico sério que valide o uso desse medicamento contra o coronavírus, embora o presidente insista nessa ideia.

O presidente Jair Bolsonaro no ato Acelera para Cristo - Adriano Vizoni/Folhapress

Bolsonaro evocou ainda um documento inserido por um servidor no sistema do TCU (Tribunal de Contas da União) com informações distorcidas sobre a Covid. Dá a entender que o Brasil sofre com a supernotificação de casos da doença, quando o mais provável é que o país tenha mais vítimas do que as 485 mil registradas.

O próprio tribunal já deixou claro que a hipótese é estapafúrdia, o que não impede o presidente de encaixá-la em sua fábula sobre um Brasil exitoso no combate ao vírus.

O país ainda estar atolado na pandemia foi justamente o que levou ao adiamento da Marcha para Jesus, que num ano normal seria realizada em junho. A de 2020 foi cancelada, a deste ano, empurrada para novembro –e mesmo assim sua realização só será possível se mais braços forem agulhados até lá.

O Acelera para Cristo se apresentou como substituto deste que é o maior evento evangélico da América Latina (e que promoverá uma versão motorizada em julho, a Carreata da Solidariedade).

O ato introduziu uma figura que luta por seu lugar ao sol no panteão bolsonarista, Jackson Vilar, dono de uma loja de móveis na periferia paulistana do Capão Redondo.

Pastor e irmão de cantor gospel, Jackson é um dos organizadores da motociata e sua face mais pública. Na véspera, estimou à Folha quantos líderes evangélicos ela reuniria. “Olha, é muito pastor, tá? Mais de 5.000 pastores. Pode colocar aí 10 mil pastores. Pra mais.”

Bem menos. Entre os milhares de simpatizantes de Bolsonaro que se aglomeraram em frente ao parque Ibirapuera, muitos seguindo o exemplo presidencial de não usar máscara, certamente havia evangélicos.

Mas não era um clima de evento gospel, e pastores ali, só um ou outro. Havia mais jaquetas de couro típicas de motoclubes do que símbolos cristãos, onipresentes na Marcha para Jesus.

O presidente tratou o governador João Doria (PSDB-SP) como anticristo e enalteceu o presidente da bancada evangélica, Cezinha de Madureira (PSD-SP), um dos apóstolos bolsonaristas que subiram no carro de som.

Outros: os ministros Ricardo Salles (Meio Ambiente), Tarcisio Freitas (Infraestrutura) e Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia), além da deputada-escudeira Carla Zambelli (PSL-SP).

“Hoje sabemos mais nomes de ministros do que de titulares da seleção”, disse o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) depois de seu pai discursar, para sustentar que a vitória do grupo em 2018 não será uma onda passageira.

O presidente espera contar com o eleitorado evangélico para se reeleger em 2022, ainda que o empate de Bolsonaro (sem partido) e Lula (PT) no segmento, projetado em maio por pesquisa Datafolha, balance esse plano.

Em “A Religião do Bolsonarismo”, o youtuber conservador Yago Martins alerta para o perigo teológico de apoiar incondicionalmente um político e escancara o que chama de “profanações espirituais” do movimento.

A fé evangélica refuta a veneração de santos, mas o presidente vê vantagens eleitorais em criar em torno de si uma imagem messiânica. Encarnou em São Paulo um selvagem da motocicleta a serviço de Deus.

Diante da multidão que o santificava, citou mais uma vez a Bíblia: "Se te mostrares frouxo no dia da angústia, a tua força será pequena". Não tem ninguém frouxo aqui, tá ok?

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