O ex-juiz Sergio Moro disse que entrou na política para fazer correções "de dentro pra fora", em discurso na cerimônia de sua filiação ao Podemos, nesta quarta-feira (10).
O evento do partido, realizado em Brasília, o anunciou como "futuro presidente da República", mas Moro não confirmou se disputará as eleições para presidente ou para outro cargo em 2022.
Ele fez críticas à gestão de Jair Bolsonaro (sem partido), da qual participou como ministro da Justiça e Segurança Pública até abril de 2020, e a governos petistas. Moro evitou, contudo, falar sobre o fato de sua atuação ter sido considerada parcial nos processos que envolveram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Operação Lava Jato.
A Lupa analisou algumas das declarações do ex-juiz. A reportagem contatou a assessoria de imprensa de Moro a respeito das checagens, mas não obteve resposta.
Confira a checagem.
Eu sempre (...) fiz justiça na forma da lei
FALSO
Em junho deste ano, o STF (Supremo Tribunal Federal) concluiu que Sergio Moro foi parcial na condução de um processo da Operação Lava Jato. O caso levou à condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex de Guarujá (SP). Nos últimos anos, a atuação de Moro como juiz à frente da Lava Jato foi alvo de críticas e nem sempre foi considerada justa.
De acordo com o princípio da imparcialidade, previsto na Constituição Federal (artigo 5º), um juiz deve estar numa posição de imparcialidade diante das partes e isso é um pressuposto para a validade do processo. Ou seja, a pessoa que julga precisa estar isenta de qualquer tendência para tomar uma decisão justa.
O princípio da imparcialidade também aparece no primeiro capítulo do Código de Ética da Magistratura, que diz que o trabalho deve ser norteado pelos princípios da "independência, da imparcialidade, do conhecimento e capacitação, da cortesia, da transparência, do segredo profissional, da prudência, da diligência, da integridade profissional e pessoal, da dignidade, da honra e do decoro" e, ainda, que deve respeitar a Constituição.
Segundo magistrados brasileiros e estudiosos de fora do país, esse não foi o comportamento de Moro. Em março, durante o julgamento na Segunda Turma do STF sobre um habeas corpus da defesa de Lula –que acusava o ex-magistrado de ter sido parcial nos processos envolvendo o petista–, o ministro do STF Gilmar Mendes criticou Moro pela ordem de condução coercitiva do ex-presidente em 2016 e classificou esse episódio como "hediondo espetáculo policialesco".
"(...) A pretensão política do ex-juiz Sergio Moro se evidenciou logo com a eleição do partido de oposição àquele de Luiz Inácio Lula da Silva", disse Gilmar. Também afirmou que as narrativas seriam de que "as tratativas entre o presidente eleito e o ex-juiz Sergio Moro iniciaram-se em momento anterior, ainda durante a campanha presidencial."
Ao jornal The New York Times, o mestre em ciência política pela universidade Sciences Po de Paris Gaspard Estrada escreveu que Moro e outros promotores "perverteram os avanços institucionais da Operação Lava Jato ao transformar uma simples força-tarefa temporária em uma entidade acima da lei".
Um outro episódio colocou em xeque a legitimidade da atuação de Moro durante a Lava Jato. Em 2019, uma reportagem do The Intercept Brasil mostrou conversas entre o então juiz e o ex-procurador Deltan Dallagnol. Nas mensagens, Moro aparece sugerindo testemunhas, dando pistas sobre futuras decisões e até aconselhando membros do Ministério Público Federal. Pela lei, juízes não podem aconselhar partes de um processo que estejam julgando. Esse episódio ficou conhecido como Vaza Jato.
Desde a época do governo do PT o desemprego começou a crescer e não parou mais
FALSO
Os dados da Pnad Contínua(Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que a taxa de desocupação média anual começou a subir em 2015, no segundo mandato de Dilma Rousseff (PT), continuou a crescer em 2016 e 2017, na gestão de Michel Temer (MDB), mas caiu em 2018 e em 2019, primeiro ano do mandato de Jair Bolsonaro (sem partido).
Em 2020, contudo, voltou a subir. Por isso, é falso que o desemprego cresceu continuamente ao longo de todo esse período, como afirmou Moro.
Em 2012, quando se iniciou a série histórica, a taxa de desocupação média anual foi de 7,4%. Já em 2020, último dado disponível, atingiu 13,5%.
Apesar de ter sido registrado crescimento se comparados esses dois anos, houve variações ao longo do período.
Em 2013 e 2014, a taxa diminuiu para 7,1% e 6,8%, respectivamente. A partir de 2015 o dado começa a subir, passando para 8,5% naquele ano, e 11,5% e 12,7% nos dois anos seguintes. Novas baixas são registradas a partir de então, com 12,3% em 2018 e 11,9% em 2019. Os dados estão disponíveis nos quadros sintéticos da Pnad Contínua.
Nos anos anteriores a 2012, a taxa de desocupação não é comparável com as mais recentes, já que era divulgada pela Pesquisa Mensal de Emprego, que possuía metodologia e amostras diferentes e foi descontinuada.
Em 2018, recebi um convite do presidente eleito para ser ministro da Justiça. (...) [Havia] uma persistente recessão (...)
EXAGERADO
A economia brasileira registrou retração em 2015 e 2016: o PIB caiu 3,5% e 3,3%, respectivamente, segundo dados do IBGE.
Entretanto, em 1º de novembro de 2018, quando Moro aceitou convite do então presidente eleito Jair Bolsonaro para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública, o país já havia retornado à tendência de crescimento.
Em 2017, no governo de Michel Temer, o PIB brasileiro cresceu 1,3%. Além disso, houve crescimento nos dois primeiros trimestres de 2018, cujos resultados foram divulgados antes de 1º de novembro daquele ano. O país fechou 2018 com um crescimento de 1,8%.
São atualmente mais de 14 milhões de desempregados
EXAGERADO
Segundo a Pnad Contínua referente ao trimestre encerrado em agosto deste ano, 13,7 milhões de pessoas estão desempregadas no país –este é o dado mais recente disponível.
A pesquisa foi divulgada pelo IBGE no dia 27 de outubro. O dado citado por Moro, de "mais de 14 milhões de desempregados", é, portanto, exagerado. A série histórica mostra ainda que houve uma queda no total de pessoas nessa condição ao longo do ano.
No trimestre que considera maio, junho e julho de 2021, a pesquisa mostrou que 14,1 milhões de brasileiros estavam buscando trabalho, o que correspondia a uma taxa de desocupação de 13,7%.
Já no segundo trimestre (abril, maio e junho), o Brasil somava 14,4 milhões de desempregados. No primeiro trimestre (janeiro, fevereiro e março), a taxa de desocupação e o contingente de desocupados atingiram suas máximas da série histórica, iniciada em 2012, totalizando 14,8 milhões na fila em busca de um trabalho no país.
Conseguimos, de fato, em 2019, diminuir a criminalidade violenta e combatemos, pra valer, o crime organizado. Cerca de 10 mil vidas brasileiras deixaram de ser ceifadas pelo crime neste meu primeiro ano como ministro da Justiça
VERDADEIRO
O país registrou queda de 17,7% no número de mortes violentas intencionais em 2019, aponta o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Foram 47.773 óbitos naquele ano, frente a 57.592 registrados em 2018. A diferença de um ano para o outro é de 9.819 mortes. No entanto, especialistas reforçaram à época que o número de assassinatos já estava em tendência de queda desde 2018, antes da posse de Bolsonaro.
Naquele ano, o índice de mortes violentas intencionais teve redução de 10,8% em relação a 2017, segundo o anuário.
Enquanto esteve à frente do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Moro comemorou os números consolidados pelo Sinesp (Sistema Nacional de Informações da Segurança Pública), ligeiramente mais positivos.
De acordo com a plataforma do governo federal, os crimes violentos letais intencionais (homicídios dolosos, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte) caíram 19% em 2019 na comparação com o ano anterior —uma redução de 10.107 mortes, segundo anunciou o então ministro em suas redes sociais.
Além disso, a metodologia utilizada pelo Sinesp até então era questionada por pesquisadores, informava uma reportagem da Folha. Especialistas apontavam falta de critérios técnicos para submissão das informações pelos estados que poderiam levar a dados consolidados incompletos.
Mais de R$ 4 bilhões foram recuperados dos criminosos
VERDADEIRO
Quando se leva em consideração as forças-tarefas da Operação Lava Jato nas instâncias de Curitiba, Rio de Janeiro e São Paulo, já foram recuperados R$ 8,4 bilhões.
Em Curitiba, foram ressarcidos R$ 4,3 bilhões — do total de R$ 14,7 bilhões previstos — até 24 de agosto deste ano. Esse montante é resultado de 209 acordos de colaboração e delação premiada, além de 17 acordos de leniência de empresas.
Já na instância do Rio de Janeiro, a força-tarefa da Lava Jato recuperou R$ 4,1 bilhões até 1º de junho. Esse valor refere-se a ressarcimentos e pagamento de multas compensatórias de 180 acordos de colaboração e nove acordos de leniência. A força-tarefa em São Paulo ainda não resultou em nenhum dinheiro recuperado.
Os valores vêm sendo ressarcidos aos cofres públicos de diferentes formas.
No âmbito da força-tarefa em Curitiba, por exemplo, em dezembro de 2019 o Ministério Público Federal do Paraná divulgou a aplicação de R$ 220 milhões pela EcoRodovias para subsidiar a redução de 30% na tarifa das praças de pedágio dessa empresa no estado, além de obras nas estradas paranaenses.
Outros recursos foram restituídos aos cofres da Petrobras, da União e transferidos para a 11ª Vara da Seção Judiciária de Goiás.
No braço fluminense da operação, em fevereiro de 2020 a 7ª Vara Federal Criminal determinou a transferência de R$ 670 milhões recuperados de colaboradores para contas do governo do estado do Rio e da União. Em 2017, R$ 250 milhões foram utilizados para ajudar no pagamento do 13º dos servidores do estado.
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