Empresário vai de 'sucateiro' a executivo e é alvo em suspeitas com políticos

Na mira de PF e Procuradoria, Carbonari é ligado a dono da Precisa Medicamentos, alvo da CPI; ele nega irregularidades

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São Paulo

O empresário Marco Antônio Carbonari, 57, apresentou-se de diversas formas nos últimos anos. Foi executivo das áreas de engenharia, tecnologia e moda e ainda disse ser diretor de uma companhia que atua na saúde.

Para a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, porém, ele é um operador financeiro de esquemas que envolvem as práticas de lavagem de dinheiro, corrupção e fraude fiscal.

Tanto em 2020 como em 2021, em apurações sobre supostos esquemas que envolvem contrato com a Petrobras e com uma estatal de tecnologia, a PF chegou a pedir a prisão de Carbonari. A Justiça, porém, não permitiu a medida nas duas ocasiões.

O empresário Marco Carbonari, alvo de operações policiais
O empresário Marco Carbonari, alvo de operações policiais - @marco-antonio-carbonari no Linkedin

Carbonari passou a ser um personagem considerado chave em investigações policiais desde 2019. Aparece no noticiário, no entanto, sempre de forma lateral, em meio a políticos, empresários e operadores mais conhecidos.

Ele foi alvo em uma investigação que envolve empresas implicadas na CPI da Covid, em outra relacionada a um personagem do mensalão e ainda em uma que apura desvios em estatal de ciência e tecnologia. É apontado nas investigações como próximo a operadores financeiros de políticos de MDB e PP.

Além disso, era um dos expoentes de uma firma que teve contato intermediado com o BNDES pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente da República.

Procurada, a defesa de Carbonari diz que ele não cometeu ilícitos e tem 36 anos de experiência na área de eletrônica e tecnologia, com reconhecimento internacional, e por isso prestou serviços a diversos setores.

Formado em engenharia mecânica na Universidade Federal de Itajubá (MG), Carbonari se considera um "investidor em companhias brasileiras".

Em suas redes sociais, costuma defender reformas que reduzam a tributação e menciona dificuldades que atrapalham atividades empreendedoras no país.

Mas o contexto que envolve as empresas de Carbonari indica supostas irregularidades graves ligadas à área fiscal. A principal firma dele, a IMA do Brasil, foi alvo de um inquérito da Polícia Civil de São Paulo em 2014, por suspeita de crime tributário.

Investigações mais recentes, da PF e do Ministério Público Federal, afirmam que a IMA vendia sucatas superfaturadas para permitir a geração de dinheiro em espécie para pagamentos de políticos.

Essa empresa, cujo CNPJ foi criado em 1982, já se rotulou de diversas formas. Em 2003, dizia ser uma empresa de engenharia. Em 2008, afirmava em seu site ter uma "atuação diversificada", que ia da engenharia à comercialização de ímã e fitas adesivas.

Cinco anos depois, em 2013, dizia atuar com meio ambiente, recuperação de placas de celulares e computadores e "serviços de alta qualidade" para "maior rentabilidade através de processos de inspeção, verificação e retrabalho de peças ou componentes".

Já em 2021, em meio às investigações, passou a atuar no ramo da moda.

"Atraída por novos desafios em suprir uma necessidade do mercado decidimos [a IMA do Brasil] entrar com foco total no segmento da moda", afirma um texto no site da empresa. Segundo o comunicado, os produtos usados são importados de fornecedores chineses.

Investigadores e colaboradores dizem que uma das pessoas próximas de Carbonari é Milton Lyra, apontado como operador de políticos do MDB.

Lyra, segundo os relatos dos delatores, pedia a Carbonari que providenciasse dinheiro vivo para o pagamento de caixa dois a políticos como o ex-senador Romero Jucá e o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, ambos emedebistas.

Para conseguir esses recursos, Carbonari recorria a aliados como os advogados Luiz Carlos D’Afonseca Claro e Gabriel Claro, ambos delatores no âmbito da Operação Descarte, da PF e do MPF em São Paulo.

Ele atuava como "responsável pela área comercial do escritório" —na prática, segundo as colaborações, captava clientes que queriam lavar dinheiro ou sonegar tributos. Em troca, ficava com um percentual de "comissão" do dinheiro que circulava nessas transações irregulares.

Por meio de um esquema que envolvia seu escritório e empresas de fachada, os Claro providenciavam dinheiro vivo aos interessados.

Carbonari também é conhecido como um dos principais parceiros de Francisco Maximiano, dono das empresas Global e Precisa Medicamentos e alvo da CPI da Covid.

A Precisa virou alvo da comissão de inquérito em apurações sobre suspeitas de fraude na negociação para a compra da vacina indiana Covaxin pelo governo Jair Bolsonaro.

Além das investigações da CPI, as empresas de Maximiano também são suspeitas de pagamentos de propinas para a obtenção de contratos, por exemplo, com a Petrobras e com os Correios.

Em emails acessados pelos investigadores, Carbonari se apresentava como diretor da Precisa Medicamentos, embora não fosse representante formal da empresa nem seu procurador, segundo a Polícia Federal.

Em agosto de 2020, em meio à pandemia da Covid-19, ele tentou comprar de uma empresa da Indonésia luvas de borracha e outros itens médicos.

Além disso, em celular apreendido, a Polícia Federal apontou "mensagens trocadas entre os dois [Carbonari e Maximiano] tratando da aquisição de vacinas nos meses de setembro e outubro de 2020".

Carbonari também era uma espécie de porta-voz da Xis Internet Fibra, outra empresa de Maximiano que se envolveu em uma polêmica: Flávio Bolsonaro intermediou um contato do presidente do BNDES com Max, em nome da empresa de fibra ótica. O caso foi revelado pela revista Veja.

Em 2020, em uma operação que investigava irregularidades na Ceitec (estatal vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia), a Justiça Federal em São Paulo autorizou busca e apreensão em endereços de Carbonari. Seu irmão, Mario Carbonari, que é sócio da IMA, também foi alvo da operação.

Carbonari também é investigado em uma operação que envolveu um ex-executivo do BMG que chegou a ser condenado em primeira instância por gestão fraudulenta, em 2012, em uma ação que resultou de desdobramento do mensalão, mas foi absolvido pelo TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região).

Nesse inquérito, a Procuradoria diz que Carbonari negociou uma venda superfaturada de equipamentos sucateados para gerar recursos em espécie.

Defesa diz que Carbonari não é operador e não há indícios contra ele

O advogado de Carbonari, Gabriel Domingues, afirma que seu cliente não cometeu irregularidades. Ele diz que as acusações de que o empresário é operador são falsas e nunca houve qualquer indício de efetiva entrega de valores em espécies ou pagamentos de vantagem a políticos.

Diz ainda que as operações da IMA sempre foram feitas com entrega de mercadoria e emissão de nota fiscal.

Ele afirma que o negócio de venda de aparelhos eletrônicos e de tecnologia para a Global e Precisa foi "lícito, real e com emissão de notas fiscais". Esses aparelhos eram, segundo ele, para rastreio de pacientes.

"O colaborador Luiz Carlos Claro citou indevidamente este negócio como 'forma' de lavagem de dinheiro e que os aparelhos eram 'sucata'", afirmou o advogado.

"Para comprovar a licitude da operação os aparelhos foram levados à PF, onde se comprovou que funcionam e possuem registro na Anatel, seguindo as demais normas da área de telecom."

A respeito do contrato com a Ceitec, ele argumenta que as buscas e apreensões foram feitas com base em auditoria da CGU (Controladoria-Geral da União) e do TCU (Tribunal de Contas da União) que foram arquivadas e, segundo o advogado, confirmaram a prestação de serviços.

Sobre a investigação que envolve o BMG, ele reafirma que a negociação foi lícita e que a IMA e Carbonari negociaram venda de tecnologia e aparelhos eletrônicos para rastreamento de gado.

Procurada, a advogada de Luiz Carlos Claro e Gabriel Claro, Danyelle Galvão, diz que seu cliente continua colaborando com a Justiça e que não irá se manifestar.

A assessoria de imprensa de Milton Lyra diz que ele não é próximo e não tem ligações com Marco Antônio Carbonari. Também afirma que Lyra não é operador financeiro e nunca pediu dinheiro para pagamento de caixa dois.

"As acusações contra ele são baseadas em notícias veiculadas na imprensa e delações premiadas desacompanhadas de provas", de acordo com a assessoria de Lyra.

A defesa de Francisco Maximiano não se manifestou. Anteriormente, os advogados dele vinham negando irregularidades e chamou a fase da Descarte que investigou a Precisa e a Global de "pirotecnia".

As defesas de Eduardo Cunha e de Romero Jucá não se manifestaram.

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