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'Pai da urna eletrônica' diz que hackers jamais vão conseguir acessá-la

Giuseppe Janino, ex-secretário do TSE, descarta risco de fraude e afirma não lembrar de tamanho interesse de militares

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São Paulo e Brasília

Secretário de Tecnologia do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por 15 anos, o gaúcho Giuseppe Janino, 61, refuta a possibilidade de manipulação dos resultados das eleições e diz garantir que a urna eletrônica é imune a ataques cibernéticos.

"O hacker pode fazer qualquer ataque, por mais violento que seja, conseguir quebrar os firewalls [soluções de segurança] e entrar na rede da Justiça Eleitoral, mas ele nunca vai conseguir entrar na urna eletrônica", afirmou.

Janino deixou o cargo no ano passado, em meio a ataques ferozes ao sistema eleitoral desferidos pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e seus seguidores.

Giuseppe Janino, que participou do processo de criação e evolução tecnológica das urnas eletrônicas - Pedro Ladeira-29.mar.18/Folhapress

Em entrevista à Folha, ele disse que teorias que inundam as redes sociais quanto à vulnerabilidade do equipamento, incluindo aquelas levantadas pelo próprio Bolsonaro, são suspeitas infundadas, sem comprovação fática e já superadas.​

Janino participou do processo de criação e de toda a evolução tecnológica das urnas eletrônicas, o que lhe rendeu nos corredores de TSE o apelido de "pai da urna".

Autor do livro "O Quinto Ninja", referência ao grupo do qual participou ao lado de militares na concepção do equipamento, Janino disse que não se recorda de interesse tão acentuado das Forças Armadas no tema como agora.

O que motivou a urna eletrônica? Há 30 anos, nós vivíamos um processo eleitoral convencional, onde se votava em cédulas de papel. Elas eram acondicionadas em urnas de lonas. No final da votação, essas urnas eram abertas. As cédulas eram colocadas sobre mesas. Ali se fazia o escrutínio e eram lançadas as informações em mapas. Ou seja, muita intervenção humana.

E onde há intervenção humana há pelo menos três atributos inerentes: lentidão, erro e fraude. Então, nós tínhamos, portanto, um processo lento, repleto de erros e com muitas fraudes inseridas.

Como a sociedade reagiu na época? Houve desconfiança? Vários desafios foram enfrentados. Lembro que se investiu forte em campanhas. Leva-se urnas para as praças, centros comerciais, igrejas, programas de televisão.

A preocupação era a de que as pessoas não conseguissem transitar para esse novo processo, mas houve adaptação rápida e segmentos da sociedade que estavam à margem no sistema convencional começaram a votar.

Após todo esse processo de aceitação, 25 anos depois ela está sob ataques na questão da segurança. O que mudou para ela ser questionada? Vejo algumas possibilidades. A primeira é de pessoas desinformadas que não viveram o processo convencional. Não conseguem perceber as vantagens dessa mudança. Por outro lado, elas são muito facilmente convencidas do fetiche do papel, que acham que o papel é o que tem de mais seguro. Sendo que é justamente o contrário.

Há outros segmentos com outras intenções. Quando nós mudamos do modelo convencional para o digital, a urna eletrônica incomodou a muitos que se beneficiavam do caos que era. Quanto mais vulnerável, mais lento, mais havia intervenção manual, mais interessava a muitos. Daí, houve uma resistência muito grande.

Entre os questionadores está o presidente Jair Bolsonaro. Há algo que o presidente fala que é preciso se preocupar? Há sempre uma preocupação na questão evolutiva do processo. Não é pelo fato de que a urna entrou no ar em 1996 que a equipe agora está tranquila, segura.

O que foi mostrado ali foram simplesmente casos de 2006 e 2008 totalmente esclarecidos, suspeições infundadas, sem comprovações fáticas, sem evidências, que foram já ultrapassadas, desqualificadas na questão de sua veracidade.

É possível inserir nas urnas algo que as faça ter um padrão? Esses programas são abertos para verificação um ano antes das eleições, para que instituições como os partidos políticos, a OAB, a Polícia Federal, o Ministério Público, são 16 instituições, incluindo universidades, que estão credenciadas a ir ao TSE e fazer análises de todos esses programas.

No final desse período [de um ano], é feito o que se chama de lacração dos sistemas. Esses programas que já foram avaliados passam por um processo matemático. Tudo que tem ali gera, no final, uma espécie de dígito verificador. Se alterar um ponto ou uma vírgula nesse texto, aquele dígito verificador não bate mais.

Como o sr. viu o convite do ministro Luís Roberto Barroso às Forças Armadas para compor a Comissão de Transparência Eleitoral? Acho muito positivo, é uma possibilidade de se verificar o quanto o sistema está robusto, preparado e resistente a qualquer tipo de ataque.

Em algum outro momento integrantes das Forças Armadas apresentaram questionamentos anteriores nos moldes do que foi feito agora? Dessa forma bastante aprofundada eu não me recordo. Evidentemente, nessa história, recebemos muitas visitas, várias comitivas das Forças Armadas.

É uma oportunidade muito interessante que deve ser utilizada efetivamente para o bem, para que seja compartilhada e que todos possam entender e questionar se algumas das respostas ali não estiverem ao nível de esclarecimento adequado.

O sistema eleitoral é auditável? O que falar para as pessoas que acham que o sistema não é auditável, caso não seja mesmo? Tem um capítulo do meu livro que fala sobre mitos e verdades. E um dos mitos é esse, o de que a urna não é auditável porque não tem voto impresso. Existe uma espécie de fetiche brasileiro em relação ao papel, que só se confia se estiver no papel.

O movimento que nós fizemos há 30 anos foi tirar a informação do papel e da mão do homem. Porque onde há a mão do homem estão lá todos os problemas já mencionados, os erros, a lentidão e as fraudes.

Você começa a ter, então, aquela mesma informação totalmente protegida, com firewalls, assinatura digital, criptografias, rastreabilidade, elementos que só existem no paradigma digital. Se você pegar esse mesmo voto que está todo protegido com todos esses requisitos e colocar no papel, ele perde tudo isso.

Como explicar essa auditoria para o cidadão que está sendo bombardeado com declarações de que o voto não é auditável? Não existe apenas uma forma de se auditar. Existem outras formas, como a verificação dos programas. Estão abertos, podem ser vistos antes, durante e depois das eleições.

Se o cidadão falar que o voto está errado, como ele pode ter a prova de que ele votou e que foi registrada a opção que ele fez? Não existe uma forma direta para identificar no meio dos votos qual foi o meu. Existe o preceito constitucional da garantia do sigilo. Eu não posso ter vinculação do eleitor com o seu voto. Eu sei que meu voto está ali, mas não posso identificá-lo.

Há que se preocupar com ataques cibernéticos ao sistema eleitoral? Tem o momento de votação que é desligado da internet, mas tem uma hora em que as informações vão para a internet na hora da totalização. Há de se temer esses ataques cibernéticos, alguma possibilidade de influírem no sistema eletrônico de votação? A preocupação com ataques cibernéticos é cotidiana, principalmente no TSE com relação à visibilidade que ele tem no mundo. Nós realizamos a maior eleição digital do planeta. Existem mecanismos robustos que minimizam a possibilidade de intervenção externa.

Se o hacker invade a Nasa, o Pentágono, o FBI, por que não invade a urna eletrônica? Simples: a urna foi projetada para ser um sistema isolado. Não tem nenhum dispositivo de conexão com nenhuma rede externa. É blindada, fechada. Lacrada, inclusive.

O hacker pode fazer qualquer ataque, por mais violento que seja, e conseguir quebrar os firewalls e entrar na rede da Justiça Eleitoral, mas ele nunca vai conseguir entrar na urna eletrônica.

Vamos dizer que houve um bombardeio cibernético, acabam com o centro de dados do TSE e com a rede da Justiça Eleitoral, o voto está preservado dentro da urna eletrônica.

O TSE foi alvo de ataque, motivo de um inquérito da PF, o mesmo vazado pelo presidente. Ali se falava que o invasor teria tido acesso a código-fonte, a um programa. Como explicar que, mesmo com esse acesso, isso não representou um risco de fraude? O hacker entrou na rede da Justiça Eleitoral, deu uma passeada, ficou lá por alguns meses e teve acesso a programas. Esse programa [acessado] não é a urna eletrônica, é o programa que junta programas e os prepara para serem inseridos nela. Ele copiou trechos e publicou na internet dizendo que tinha acesso aos programas. Mesmo que fossem [da urna], esses programas já são abertos, são abertos durante um ano para que todas aquelas entidades tenham acesso a esses dados.

O fato de ele ter tido acesso a esses códigos não quer dizer nada. Ele, inclusive, poderia ter entrado pela porta da frente. Se apresentar ao TSE e dizer que gostaria de fazer a análise dos dados.

Em que ambiente ele chegou para acessar esses dados? Ele chegou na fase de desenvolvimento. Teve acesso ao computador de um determinado desenvolvedor. Ali ele pegou parte do código e fez toda aquela publicidade para ganhar notoriedade. Um computador que estava na rede da Justiça Eleitoral.

Mas, evidentemente, ele não faria nada com aquele pedaço [de programação]. Aquele pedaço não tem nada de oficial, não está lacrado e, mesmo que estivesse lacrado, seria perceptível em qualquer mecanismo de auditoria.

Se tivesse sido inserido algo para criar o suposto padrão mencionado pelo presidente Bolsonaro, isso seria percebido? Poderia ser descoberto já na fase de desenvolvimento. Se houvesse modificação, onde esses programas ficam guardados, existe um controle. Tudo que é modificado, a pessoa que está alterando tem que se identificar. Então, iria aparecer lá uma modificação sem dono e isso não passaria nas outras etapas, seria automaticamente bloqueado pelo sistema que guarda os programas na fase de desenvolvimento.

O que o sr. diria, como um dos pais da urna eletrônica, para políticos, ativistas e para a população em geral que duvidam da segurança das urnas? O antídoto para a suspeição é a informação. É olhar o fato, a história, a realidade. A realidade é que nós temos 25 anos de um processo digital e que até hoje não há um caso de fraude comprovada.

Várias suspeições foram levantadas, todas essas suspeições uma vez levantadas são investigadas por instituições independentes e competentes como o Ministério Público e a Polícia Federal.

RAIO-X

Giuseppe Janino, gaúcho, 61
Formado em matemática, ingressou no TSE em 1996 como analista de sistemas. Integrou a equipe responsável pelo desenvolvimento da urna eletrônica. Ocupou por 15 anos o cargo de secretário de Tecnologia do TSE. É autor do livro "O Quinto Ninja", em que narra sua participação na concepção e evolução do sistema eleitoral eletrônico

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