Ladrões de celular e golpe do Pix são desafios na segurança para próximo governador de SP

Manutenção da bem-sucedida política de câmeras acopladas aos uniformes da PM é um dos pontos

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São Paulo

A abundância de roubos e furtos de celulares e as quadrilhas que limpam as contas de vítimas por meio dos aparelhos são desafios na área de segurança que o próximo governador de SP vai enfrentar.

O estado ainda lida com problemas relativos à ação do crime organizado, já que abriga lideranças do PCC (Primeiro Comando da Capital), e quadrilhas dotadas de armas potentes para promover mega-assaltos em cidades do interior, fenômeno que ficou conhecido como novo cangaço.

As câmeras acopladas aos uniformes dos policiais militares, uma medida bem-sucedida na redução da letalidade policial, também foram colocadas em xeque por pré-candidatos. Especialistas alertam para o risco de retrocesso e defendem a manutenção de uma política exemplo para todo o país.

Policiais militares de SP com as câmeras corporais utilizadas pela corporação - Bruno Santos/Folhapress

Como está a situação de roubos e furtos no estado? No primeiro trimestre deste ano, houve aumento de furtos e roubos no estado, mas o patamar ainda é menor que o do início da pandemia.

Segundo dados do governo, foram registrados 132.782 furtos no primeiro trimestre do ano, alta de 28,5% em relação aos três primeiros meses de 2021 e de 7% na comparação com 2020. Em relação ao mesmo período em 2019, antes do início da crise sanitária, houve diminuição de 2,7%.

Nas cifras de roubos, foram contabilizados 59.905 casos nos primeiros três meses do ano, alta de 7,4% na comparação com 2021. Mas o valor representa queda de 4% em relação aos 62.372 episódios no período em 2019, e de 12% na comparação com 2020.

Ao analisar a sequência histórica, porém, enquanto houve grande queda de homicídios, roubos e furtos se mantiveram em patamares relativamente estáveis.

Quais são os maiores desafios no combate a esses crimes? Roubos e furtos de celulares têm aumentado a sensação de insegurança na população. Muitas vezes, os crimes são feitos em combinação com quadrilhas especializadas em limpar as contas das vítimas usando o sistema Pix.

Considerando os números gerais, de 2019 para 2020 os episódios de roubos de celular na capital paulista caíram de 114.050 para 92.195. Em 2021, chegaram a 89.866.

Os furtos, também de 2019 a 2020, diminuíram de 113.783 para 81.172 e registraram alta de 6,9% no ano passado, chegando a 86.754.

O combate a esse tipo de crime passa por maior integração entre Polícia Civil e Militar. "É histórica a ausência de articulação entre as polícias em SP. É fundamental desmontar as quadrilhas, atuando na busca de objetos roubados", diz Luis Flávio Sapori, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

O governo tem feito operações voltadas à fiscalização de motociclistas, já que muitas vezes os delitos são praticados com os criminosos em motos.

Ainda segundo a administração, a Polícia Civil, em colaboração com a Polícia Federal, já prendeu receptadores e localizou centrais de Pix com dezenas de aparelhos, além de ter detido mulas que levavam celulares roubados para países africanos.

Além de roubos e furtos comuns, que outros crimes patrimoniais causam preocupação? As ações do chamado novo cangaço causam grande apreensão em cidades do interior. Embora não sejam tão frequentes, esses crimes são marcados por cenas de terror.

Uma das últimas ações do tipo em SP ocorreu em Araçatuba, a 521 km de São Paulo, em agosto de 2021. Criminosos explodiram e roubaram duas agências bancárias, fizeram moradores reféns e incendiaram veículos.

Nesses casos, muitas vezes as forças policiais não têm capacidade de reagir a bandidos em maior número e mais bem armados.

O governo diz que foram criados nessa gestão dez novos Baeps (batalhões de ações especiais de polícia), focados no policiamento ostensivo, e que já foram presos 60 criminosos especializados nesse tipo de crime. Além disso, no geral, roubos a banco seguem tendência histórica de queda.

Qual é a situação do combate ao crime organizado no estado? A principal facção criminosa do país, o PCC (Primeiro Comando da Capital), é sediada no estado de São Paulo. Embora o grupo tenha atuação internacional, muitos dos principais líderes continuam coordenando a facção de dentro de presídios paulistas.

Os integrantes da organização atuam em diversas modalidades criminais, mas o principal negócio do grupo é o tráfico de drogas.

A atuação do PCC começa em países vizinhos, de onde é trazida a droga para o Brasil. Aqui, ela é distribuída e, em alguns casos, exportada para a Europa. A organização atua em diversos negócios com fachadas legais, usando laranjas em empresas de ônibus e postos de gasolina.

"Todo esforço para desmontar e desmobilizar os mecanismos de lavagem de dinheiro do PCC é uma tarefa constante para o governador do estado", diz Sapori, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Segundo dados do governo estadual, 59 integrantes de facções já foram transferidos para prisões federais fora do estado –a lista inclui o líder máximo da facção, Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola. Além disso, diz o governo, já foram recuperados mais de R$ 1 bilhão em ativos desses grupos.

Como a segurança tem sido tratada pelos pré-candidatos? O tema aparece principalmente relacionado à polêmica envolvendo as câmeras acopladas aos uniformes dos policiais.

Um dos pré-candidatos, Tarcísio de Freitas (Republicanos), levou o assunto à eleição ao prometer acabar com essa política. Ele sugeriu que as câmeras podem atrapalhar os policiais.

As críticas fizeram com que outros candidatos colocassem os equipamentos em dúvida, incluindo o atual governador Rodrigo Garcia (PSDB), que, depois, recuou.

As críticas às câmeras fazem sentido? Números não corroboram a teoria do ex-ministro da Infraestrutura. Em 2021, em meio à implantação das câmeras, a Polícia Militar registrou o menor número de agentes mortos em serviço em 31 anos.

A política de redução da letalidade policial levou a uma queda de 36% no número de pessoas mortas em supostos confrontos no estado de São Paulo em 2021.

Além disso, nas 18 unidades participantes dos programas de câmeras corporais —na capital, no litoral e no interior—, a diminuição de mortos resultantes de ações policiais chegou a 85% nos últimos sete meses do ano passado em comparação ao mesmo período de 2020.

Para Carolina Ricardo, diretora-executiva do Instituto Sou da Paz, o próximo governador terá de ter coragem para não ceder às pressões.

"São Paulo tem uma solução nas mãos. O estado profissionalizou o uso da força pela Polícia Militar", diz ela, acrescentando que a redução da letalidade não envolve apenas as câmeras.

Ela cita, por exemplo, uma comissão interna que discute os casos com uso de armas de fogo, além de investimentos em armas não letais.

Após Rodrigo cogitar mudanças, o governo afirmou que a política será ampliada, com 10 mil policiais militares utilizando as câmeras nos uniformes até agosto.

Do ponto de vista de segurança, qual é a situação da cracolândia? A polícia paulista passou a fazer sucessivas operações na cracolândia, o que espalhou usuários de drogas por diversas áreas do centro.

A estratégia é similar à adotada em 2012, quando, após diversas operações, a cracolândia voltou ao ponto original, ainda que com pequenas aglomerações em novos pontos. Com a prisão de traficantes, o tráfico ficou a cargo de usuários que prestam serviços em troca de crack —eles são conhecidos como "lagartos".

Questionado, o governo afirmou tratar-se de uma questão de saúde pública e que houve aumento das internações.

A prefeitura paulistana ainda anunciou diversas internações involuntárias, mas a grande maioria não tem relação com a cracolândia ou com o uso de drogas.

A administração afirma que, desde 2019, mais de 1.700 pessoas foram presas por tráfico na região, e 3,8 toneladas de droga, apreendidas.

Os homicídios no estado seguem tendência de queda. Há espaço para uma redução maior? Atualmente, o índice de homicídios de São Paulo é o menor do país, com redução em mais de 80% nos últimos 22 anos. Em 2021, a redução foi de 6% —de 2.893, no ano anterior, para 2.713. Apesar dos resultados, especialistas consultados pela Folha frisam que ainda há espaço para uma redução maior.

Uma das principais estratégias seria a maior fiscalização das armas em circulação. Entre essas possíveis irregularidades está o uso de laranjas como falsos colecionadores de armas.

Neste ano, a polícia apreendeu uma série de armas de fogo em endereços ligados a supostos membros do PCC. As apreensões levaram à abertura de uma nova investigação, porque todo o armamento estava registrado legalmente em nome de CACs (colecionadores, atiradores e caçadores).

Qual é a situação das polícias no estado? Durante a gestão de João Doria (PSDB), havia grande descontentamento com o governo por parte dos policiais. Neste ano, o agora ex-governador deu aumento de 20% às forças de segurança. As entidades de classe que representam tanto a Polícia Militar quanto a Polícia Civil, porém, continuaram insatisfeitas e afirmaram que o reajuste não cobre a inflação.

Entre policiais civis, há ainda um grande sentimento de que a corporação é sucateada e preterida em relação à Polícia Militar, que recebe equipamentos melhores e não enfrenta a mesma falta de funcionários. No entanto, apesar disso, a PM tem o menor efetivo desde os anos 1990.

Atualmente, o efetivo da corporação é de 83 mil homens, o menor desde 1999, quando havia 81 mil. Rodrigo, ao assumir, tem feito uma série de acenos às polícias. Recentemente, autorizou a abertura de editais para a contratação de 2.700 policiais militares e para a reforma de 27 distritos policiais.

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