Descrição de chapéu STF

Gilmar defende Cármen, aponta omissão de autoridades e fala em rapinagem institucional

Ministro rebate falas de Jefferson e diz que agentes públicos cobiçam 'papéis que não lhes foram dados'

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Brasília

Em um forte discurso que rebate os ataques do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB) à ministra Cármen Lúcia, o decano do STF (Supremo Tribunal Federal), Gilmar Mendes, criticou nesta quarta-feira (26) a omissão de autoridades em proteger a democracia.

Segundo o ministro —em uma fala com uma série de recados indiretos—, agentes públicos têm cobiçado "papéis que não lhe foram dados" e isso criou um ambiente de "rapinagem institucional" que tenta enfraquecer o Supremo.

"Agentes e instituições que possuem o dever de agir, de proteger o Estado democrático de Direito. Agentes e instituições para os quais a República lhes concedera papel altivo –faltam-lhes, entretanto, o brio necessário. Cobiçam papéis que não lhes foram dados", afirmou o ministro.

O ministro Gilmar Mendes, do STF - Fabio Sampaio - 8.set.21/SCO/STF

"Assim instaura-se um ambiente de rapinagem institucional, no contexto do qual muitos avistam a percepção de dividendos. A muitos interessa um Supremo Tribunal Federal fraco."

O discurso de Gilmar foi feito logo após a presidente do Supremo, ministra Rosa Weber, abrir a sessão desta quarta relendo uma nota divulgada no sábado (22) em que repudiava a "agressão sórdida e vil, expressão da mais repulsiva misoginia, de que foi vítima a ministra Cármen Lúcia".

Jefferson, aliado do presidente Jair Bolsonaro (PL), foi preso no domingo (23), por determinação do ministro Alexandre de Moraes. Ele reagiu à abordagem da Polícia Federal a tiros e lançou granada na direção dos policiais. Dois deles ficaram feridos, atingidos por estilhaços.

A operação ocorreu um dia após o político de extrema direita xingar e comparar Cármen Lúcia a "prostitutas". Após ser preso, em audiência de custódia na segunda-feira (24), ele voltou a ofender a ministra.

No seu discurso, Gilmar disse que, nos últimos anos, fatores políticos, econômicos e sociais "têm dado azo ao recrudescimento do discurso populista, sem que seja tarefa simples identificar as causas da decadência democrática no país".

"Uma delas, entretanto, é fácil de apontar: omissões calculadas e conivências oportunistas das autoridades constituídas", afirmou.

Segundo ele, para enfraquecer o Supremo, nessa lógica, "todo meio é válido".

"Ameaçar a vida de ministros e de seus familiares, financiar quadrilhas que acampam na Esplanada dos Ministérios, bem como incitar seus comparsas a destruir o tribunal – 'tudo isso é política'. Odiosas inversões essas que observamos. Aqueles que exercem atos concretos de destruição da ordem estabelecida apontam o dedo ao tribunal encarregado de zelar pela Constituição e seus direitos fundamentais", acrescentou o decano.

"Como a máquina de desinformação não é combatida (porque as autoridades competentes foram capturadas), a anomia se retroalimenta. Os fatos passam a não importar. Nessa realidade paralela, os que militam por ditadura apresentam-se como defensores da liberdade", disse.

"Como uma mentira dita mil vezes começa a assumir tons de verdade, qualquer decisão do Tribunal que busque proteger o Estado democrático de Direito passa a ser descrita, histericamente, como um abuso. É assim que o Poder Judiciário, um poder desarmado, consegue ser pintado como 'golpista'", continuou Gilmar.

Após a fala de Gilmar, a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, também manifestou solidariedade pela ministra e criticou as falas de Jefferson.

"Não vi uma pessoa até agora achar que aquilo foi minimamente... sei lá, não vou falar. Justo que seria uma palavra que não pode se usar nesse momento", disse Lindôra, que é vista como simpática a Bolsonaro.

"O país está num momento difícil, isso é inegável. A pessoa pode estar revoltada, pode estar tudo, mas nada, sob hipótese alguma, justifica [os ataques]. Eu peço para a senhora [Cármen] aceitar todas as homenagens nossas e saber que estamos sempre do seu lado", disse a vice-PGR.

Cármen, então, agradeceu aos presentes. "Nós sabemos entre nós que, diferente de tantas vezes que dizem por aí que somos 'ilhas', somos um tribunal de um país, de um povo, a lutar por fazer cumprir uma Constituição, que não é tarefa simples, menos ainda em horas de tentativa de subversão ou de erosão democrática ou contra o Estado de Direito", afirmou a ministra.

"Dificuldades fazem parte, mas o Brasil vale a pena, o Estado de Direito vale a pena, a democracia vale o que cada um de nós faz", acrescentou.

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