Restauração de obras depredadas por golpistas na Câmara pode levar 1 ano

Principal prejuízo será com carpete verde, um dos maiores símbolos da casa legislativa

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Brasília

A restauração de obras do acervo artístico destruídas na Câmara dos Deputados por golpistas na invasão de 8 de janeiro pode levar até 12 meses. O maior prejuízo será com um dos maiores símbolos da Casa: o carpete verde do principal salão de circulação do Congresso será substituído ao custo de R$ 921,5 mil.

No total, a Câmara calcula prejuízos de cerca de R$ 3,5 milhões com a depredação, segundo levantamento das áreas técnicas da Casa obtido pela Folha. O valor inclui as estimativas com reparos, restaurações e também mensuração de danos irreversíveis.

Imagem mostra parte do salão verde, há dois seguranças ao fundo e, no primeiro plano, um amontoado de papeis e documentos no chão
Câmara terá de trocar carpete verde de salão da Câmara após ataque golpista. - Gabriela Biló/Folhapress

É pelo salão verde —cuja denominação é inspirada na cor do carpete— que circulam parlamentares, membros da sociedade civil e jornalistas. O local é considerado um ícone da Câmara.

No dia 8, os vândalos inundaram o local e provocaram furos e danos por fogo no carpete. O processo para substituição já teve início, segundo o documento elaborado por técnicos da Câmara.

A umidade excessiva do carpete fez com que os técnicos da Câmara retirassem temporariamente do salão verde a obra Muro Escultórico, de Athos Bulcão. A peça também foi danificada, com um grande furo na parte inferior, e precisará de restauração.

A Câmara contabilizou danos em 64 bens do acervo cultural da Casa, como pinturas, esculturas, presentes protocolares e painéis. Há casos de obras com menor impacto, que foram apenas sujas, e danos de maior relevo.

obra é verde e há um buraco nela
Obra Muro Escultórico, de Athos Bulcão, que fica no salão verde da Câmara, danificada por golpistas - Câmara

Somente o reparo desses itens tem uma estimativa de custo de R$ 1,4 milhão. A previsão de prazo para a finalização dos tratamentos levou em consideração trabalhos anteriormente realizados, "principalmente nos grandes painéis inseridos à arquitetura", segundo a avaliação técnica.

"A compreensão dos atos enquanto fator de prejuízo passa pelo entendimento de que há valoração cultural e financeira sobre esses bens. A primeira, repleta de fatores simbólicos, se estrutura sobre os seguintes componentes de valores: histórico, social, técnico/científico, artístico/estético, de raridade e de procedência", diz documento do Centro de Documentação e Informação da Câmara.

"Já na esfera financeira, os componentes se referem ao valor econômico dos itens, conforme referências de mercado."

A obra de maior valor atacada por golpistas foi a escultura "Maria, Maria", uma peça em bronze da artista Sônia Ebling (1918-2006), avaliada em R$ 180 mil. A escultura foi amassada pelos vândalos. Ela já teve seu tratamento finalizado.

A escultura "Bailarina", de Victor Brecheret, foi manchada e teve parte da estrutura de apoio rompida. A obra, avaliada em R$ 70 mil, também foi tratada e aguarda polimento.

Três vasos e um ovo de avestruz foram totalmente destruídos e têm restauração considerada improvável. Todas foram presentes de autoridades, como um vaso dado à Câmara pelo então presidente da Assembleia Nacional da Hungria em 2011.

Várias dessas peças atacadas estavam em exposição na Casa, próximo à passagem interna para o Senado. A peça "The Pearl", em ouro, pérola e couro, ainda está desaparecida —a obra foi presente em 2019 do ministro das Relações Exteriores do Qatar, Mohammed bin Abdulrahman Al-Thani, ao deputado Rodrigo Maia, então presidente da Câmara.

Também foram furtados 16 itens da Polícia Legislativa da Câmara. São capacetes, escudos e máscaras de proteção contra gases.

Dois carros Nissan Frontier foram vandalizados, sendo um deles incendiado. No entanto, os automóveis, no valor total de R$ 238 mil, eram locados e há previsão de cobertura de todos os custos por conta de seguro.

Carro incendiado por dentro
Viatura incendiada por golpistas na Câmara em 8 de janeiro de 2023 - Câmara

Dessa forma, dos R$ 3.556.509,14 de prejuízos apurados, ficará a cargo dos cofres públicos da Câmara o valor de R$ 3.318.098,42. Os valores também constam no documento.

Centenas de golpistas apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) invadiram, na tarde de 8 de janeiro, os prédios do Congresso Nacional, Palácio do Planalto e STF (Supremo Tribunal Federal).

O rastro de destruição atingiu não apenas obras de arte e a estrutura da Câmara, mas também os locais de trabalho de parlamentares e assessores. A área técnica contabilizou 98 bens patrimoniais afetados, como mobiliário, computadores, aparelhos telefônicos e monitores de vídeo.

Imagens anexadas aos documentos mostram computadores e mesas cobertos de urina. Os vândalos ainda jogaram água em impressoras e colocaram fogo em centrais de cabeamento de internet e cadeiras.

Há menção a danos nos gabinetes das lideranças do PT, MDB e PSDB, com um total de 52 bens quebrados —esses de propriedade privada, das equipes que ali trabalham.

O gabinete da liderança do PT, partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi o mais atacado. A lista inclui forno micro-ondas, cafeteiras e quadros e molduras do partido, de Lula e da ex-presidente Dilma Rousseff.

Ainda serão necessários a substituição de equipamentos e reparos nos sistemas de áudio e vídeo, além de consertos nos sistemas de detecção e combate a incêndio. Até peças do elevador do salão verde foram atingidas.

A reposição por perda total de duas maquetes do complexo de edifícios da Câmara ainda aguarda decisão para restauração. A previsão é de um custo de R$ 100 mil.

Algumas obras do acervo atingidas

  • "The Pearl", sem data
    Autor desconhecido
    Ouro, pérola e couro
    Presente do ministro das Relações Exteriores e vice-primeiro-ministro do Estado do Catar, Mohammed bin Abdulrahman Al-Thani, em 2019.
    Status: Desaparecido
    Obra lembra uma concha, de ouro, com uma pérola no meio
    Obra The Pearl, de ouro, pérola e couro, foi levada por golpistas na invasão de 8 de janeiro. - Acervo Câmara
  • Vaso Vausa Val, sem data
    Porcelana
    Presente do deputado Lászlo Kövér, presidente da Assembleia Nacional da República da Hungria, em 2011
    Status: Destruído, restauração improvável
    vaso bege com desenho de flores vermelhas
    Vaso Vausa Val, de porcelana, foi destruído por golpistas que invadiram a Câmara - Acervo Câmara
  • Muro Escultórico, 1976
    Athos Bulcão
    Madeira laqueada
    Status: Arranhões e grande perfuração
    painel Muro Escultórico, de Athos Bulcão
    Painel Muro Escultórico, de Athos Bulcão, no Salão Verde da Câmara dos Deputados - Folhapress
  • "Maria, Maria", 1980
    Sônia Ebling
    Bronze
    Obra com maior avaliação entre as atingidas, de R$ 180 mil
    Status: Amassamento
    obra em bronze representa uma mulher sentada
    Obra Maria, Maria, de Sônia Ebling, uma das peças da Câmara danificadas por golpistas - Câmara
  • Vaso chinês, sem data
    Autor desconhecido
    Laca
    Presente de He Guoqiang, membro do Comitê Permanente do Birô Político do Comitê Central do Partido Comunista da China, em 2008
    Status: Quebrado, restauração provável
    vaso é vermelho, com relevos e duas alças
    Vaso chinês depredado por golpistas na Câmara - Acervo Câmara
  • Adaga, sem data
    Autor desconhecido
    Prata e pedras preciosas
    Presente do presidente da República Argelina Democrática e Popular, Abdelaziz Bouteflika, em 2005
    Status: Amassamento na extremidade
    adaga de prata ornamentada com pedras
    Adaga prateada com pedras preciosas e bainha foi danificada - Brito Júnior/Câmara

Estimativas de danos patrimoniais

  • Substituição de persianas verticais em tecido sintético: R$ 17.115,52
  • Substituição do carpete do salão verde: R$ 921.482,20
  • Reposição por perda total das duas maquetes do complexo edificado da Câmara: R$ 100.000,00
  • Fornecimento e Instalação de vidros (fachadas e internos), vidraçaria e obra civil (material e mão de obra): R$ 191.803,25
  • Reparos nos sistemas elétricos (material e mão de obra): R$ 18.956,46
  • Reparos nos sistemas hidráulicos (material e mão de obra): R$ 1.511,93
  • Substituição de equipamentos e reparos nos sistemas de áudio e vídeo (material e mão de obra): R$ 123.393,48
  • Reparos nos sistemas de detecção e combate a incêndio: R$ 35.509,11
  • Substituição de peças no elevador do salão verde, reparos no sistema de transportes prediais: R$ 2.814,00
  • Serviços de limpeza e conservação: R$ 100.000,00
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