Tarcísio tem abastecimento de água e limpeza de rios como desafios em SP

Governador também precisa lidar com aquecimento global, desmatamento e poluição

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São Paulo

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), tem o desafio de avançar em medidas que garantam o abastecimento hídrico do estado e a universalização do saneamento.

Um dos principais gargalos é a ameaça de que o estado volte a sofrer as consequências da crise hídrica, como a de 2014. Para eliminar esse risco, precisará realizar obras, modernizar o sistema de abastecimento e aumentar a eficiência.

Ao mesmo tempo, se verá às voltas com questões ambientais que vão da limpeza de rios Tietê e Pinheiros ao aquecimento global.

Marginal do rio Tietê na altura da ponte da Freguesia do Ó: trecho que corta a capital é um dos mais poluídos
Marginal do rio Tietê na altura da ponte da Freguesia do Ó: trecho que corta a capital é um dos mais poluídos - Eduardo Knapp/Folhapress

Quais são os principais desafios na questão do abastecimento de água no estado de São Paulo? O estado convive com problema de restrição hídrica em um quadro de aumento de demanda e redução da média histórica de precipitações, o que acende um alerta para o abastecimento nos próximos anos.

Em 2014, São Paulo passou por grave crise hídrica, que motivou obras para aumento da oferta de água (construção de novos sistemas e também transposição de águas) e também baixou o padrão de consumo da população –hoje 12% a menos em média do que antes daquele período.

Apesar disso, a situação não está resolvida. O sistema Cantareira, que abastece a Grande São Paulo, por exemplo, voltou ao estado de alerta no ano passado, ficando abaixo da marca de 40%.

Nessas situações, pode haver redução de pressão na água, causando desabastecimento em diversos pontos em determinados horários do dia.

Por que o estado enfrenta esses problemas? De acordo com Antonio Carlos Zuffo, professor associado de hidrologia e gestão dos recursos hídricos da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), historicamente, há períodos de maior e menor precipitação. Desde a última década, o estado sofre os efeitos de um período mais seco.

"Você tem de três a cinco décadas chovendo mais, de três a cinco décadas chovendo menos. A média de precipitação anual, nesse período mais seco, cai em torno de 10%, 15%. Só que impacta muito mais a redução da vazão. Você tem um número menor de dias de chuva", diz.

Para ele, o estado enfrentará um quadro que pode se agravar nos próximos anos.

O que precisa ser feito para evitar um cenário como o de 2014? Um dos meios de melhorar o abastecimento de água seria diminuir o índice de perdas no estado, diz Zuffo.

A perda de água pode estar associada a vazamentos durante a distribuição, mas também a erros técnicos de mensuração e ao uso não autorizado, como em ligações clandestinas.

Em São Paulo, o índice é de cerca de 34%, segundo o levantamento anual feito pelo Instituto Trata Brasil. O número é abaixo da média nacional, que chega a 40%. No entanto, está acima de outros países do mundo –na Austrália, por exemplo, o índice é de por volta de 10% e na China, de 20%.

Represa Atibainha, parte do sistema Cantareira, que ficou em estado de alerta em 2022
Represa Atibainha, parte do sistema Cantareira, que ficou em estado de alerta em 2022 - Rubens Cavallari - 23.nov.22/Folhapress

Uma das formas de resolver o problema é renovar a rede. O custo, porém, é alto.

Zuffo afirma que ainda que há espaço para mais reservatórios. "O sistema do Alto Tietê, o segundo maior da região metropolitana, foi projetado para ter sete reservatórios. Até agora, cinco estão construídos", diz.

A Sabesp tem algumas medidas para aumentar o abastecimento em curso, entre elas a reversão do rio Itapanhaú, que traria água suficiente para abastecer mais 600 mil pessoas.

Faixas de operação do sistema Cantareira

  1. Normal: volume útil acumulado igual ou maior que 60% e limite de retirada de 33 m³/s;
  2. Atenção: volume útil acumulado igual ou maior que 40% e menor que 60% e limite de retirada de 31 m³/s;
  3. Alerta: volume útil acumulado igual ou maior que 30% e menor que 40% e limite de retirada de 27 m³/s;
  4. Restrição: volume útil acumulado igual ou maior que 20% e menor que 30% e limite de retirada de 23 m³/s;
  5. Especial: volume acumulado inferior a 20% do volume útil e limite de retirada de 15,5 m³/s.

Fonte: ANA (Agência Nacional de Águas) e resolução conjunta nº 925/2017

Por que Tarcísio quer privatizar a Sabesp, responsável pelo abastecimento? O governador afirma que a privatização trará dinheiro para melhorar a eficiência da empresa, citando como exemplo custos menores na iniciativa privada.

O modelo de privatização almejado por ele é o da Eletrobras, com oferta de ações e diminuição de participação do estado. A Sabesp é uma empresa controlada pelo Governo de São Paulo, mas com 49,7% das ações negociadas em bolsa, tanto em São Paulo como em Nova York.

Na estatal federal, o governo manteve poder de veto em questões societárias, para impedir que novos sócios tenham grande influência sobre sua gestão, por meio da chamada "golden share".

Críticos afirmam que essa medida pode causar aumento das tarifas, o que Tarcísio nega. Além disso, levantamento da base de dados internacional Public Services aponta que as reestatizações que mais aconteceram nos últimos anos no mundo foram no setor de serviços integrados de água, como tratamento de esgoto e fornecimento de água potável.

O governador afirma que entre as prioridades a cargo da empresa, para a qual se precisaria de maior investimento, está a universalização do acesso ao saneamento –hoje, a Sabesp coleta 92% e trata 78% do esgoto.

Além disso, há a meta de instalação de melhores sensores para reduzir as perdas para vazamentos e redução das manchas de poluição nos rios como Tietê e Pinheiros.

Em que estágio está a despoluição do rio Pinheiros? A gestão iniciada por João Doria e terminada por Rodrigo Garcia, ambos do PSDB, conseguiu melhorias visíveis no rio Pinheiros –com mudança no aspecto da água e no cheiro.

De acordo com o governo, de 13 pontos de monitoramento, 11 deles já apresentam o chamado DBO (demanda bioquímica de oxigênio) abaixo de 30 mg/l, a quantidade mínima para que a água não tenha odor, melhore a turbidez e permita vida aquática.

A melhoria na situação se intensificou após o início de ações do governo para reduzir o esgoto lançado nos afluentes do rio Pinheiros, com a conexão de 650 mil imóveis à rede. Além disso, houve a retirada de mais de 86 mil toneladas de lixo flutuante e a remoção de sedimentos do fundo do rio.

Agora, estão sendo construídas cinco unidades de recuperação da qualidade das águas, que ajudarão a reduzir o esgoto que chega ao rio. O atual governador terá de continuar esse trabalho, além de prevenir focos de poluição, como, por exemplo, novas ocupações com despejo clandestino de esgoto.

E como está o rio Tietê? No caso do rio Tietê, muito maior do que o Pinheiros (com mais de 1.100 km de extensão, contra apenas 25 km), a situação é mais complexa e o atual governador terá muito mais trabalho a se fazer.

O trecho de água poluída se divide em duas partes: entre a cidade de Suzano e a ponte das Bandeiras, em São Paulo; e no município de Porto Feliz. Nesse locais, a água é imprópria para usos e inadequada para a vida aquática.

De acordo com análise feita pela Fundação SOS Mata Atlântica como parte do projeto Observando os Rios, a mancha de poluição no rio Tietê cresceu cerca de 43% em um ano e agora atinge 122 km do corpo d’água no estado de São Paulo. Houve também uma diminuição das águas boas no rio.

O governo aponta para a redução histórica –passando de 163 km, em 2019, para 85 km, em 2021. Nos anos 1990, o trecho sem vida do rio chegou a ser de 530 km.

A última gestão, do PSDB, citava uma série de ações que ajudaram a diminuir essa mancha, que vão do desassoreamento do rio ao início do tratamento de esgoto de 12 milhões de pessoas da região metropolitana.

"Ao todo, a Sabesp investiu US$ 3,4 bilhões nas obras, construindo no período mais de 5.000 km de redes coletoras, coletores-tronco e interceptores de esgoto", disse o governo estadual, ainda sob a gestão tucana.

Qual a situação de desmatamento no estado de São Paulo? A mata atlântica, o bioma brasileiro mais devastado, vive um grande crescimento do desmatamento.

A destruição na mata atlântica saltou 66% em 2020-2021, em comparação ao período anterior (2020-2019). É o maior aumento percentual registrado desde o início do monitoramento, em 1985 (até 2010 os dados eram divulgados e englobavam um período de cinco anos).

Até mesmo estados que se aproximavam de desmatamento zero (quando os dados não passam de 100 hectares no ano) apresentaram crescimento na destruição, caso de São Paulo.

O estado teve aumento de 45% no desmatamento, segundo e relatório da ONG SOS Mata Atlântica e do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) divulgado no ano passado. O desmatamento em 2020/2021 foi de 311 hectares.

Na ocasião do lançamento do relatório, a Secretaria de Infraestrutura e Meio Ambiente de São Paulo respondeu que o estado tem os menores índices de desmatamento do país e uma área de mata atlântica de 5,4 milhões de hectares.

E sobre a questão climática, o que o atual governador pode fazer? O governador deveria, entre outros pontos, trabalhar para aumentar a cobertura vegetal do estado, sustenta Jorge Abrahão, coordenador geral do Instituto Cidades Sustentáveis e colunista da Folha.

"Existe em São Paulo um déficit em reserva legal, que se dá sobretudo nas grandes propriedades. Você pensar em ter um trabalho de reflorestamento nesses espaços deve aumentar a cobertura vegetal", diz.

A reserva legal é área dentro dos terrenos particulares que deve ter cobertura vegetal. No estado de São Paulo, ela é de, no mínimo, 20% do total da propriedade.

Outros pontos apontados por ele são a preservação e recuperação das matas ciliares e a manutenção das áreas verdes existentes.

Como está a questão do combate à poluição? O estado de São Paulo não cumpriu sua meta climática, a de diminuir em 20% seus gases-estufa até 2020, com base nos números de 2005. Apesar disso, o governo que se encerrou sustentava que seria possível cumprir sua nova promessa, de zerar essas emissões até 2050.

Embora parte das políticas nesta área caibam mais diretamente ao município, o estado é responsável pelo controle, fiscalização e monitoramento das atividades geradoras de poluição, por meio da Cetesb.

As emissões paulistas vêm principalmente do setor de energia, o que engloba a queima de combustível. Estão dentro disso, portanto, a indústria, a geração de eletricidade e os transportes —fator com maior peso nos números de São Paulo.

Ao longo dos anos, medidas no controle da emissão de poluentes produziram melhorias na qualidade do ar para a maior parte dos poluentes monitorados, gerada principalmente por veículos automotores.

No entanto, uma análise do Iema (Instituto de Energia e Meio Ambiente) mostra como a cidade de São Paulo apresenta, em todos os índices avaliados, taxas de poluição superiores às recomendadas pela OMS (Organização Mundial da Saúde). O município evitar anualmente 11.372 mortes caso melhorasse seus indicadores ambientais.

Entre os pontos que podem melhorar o problema, está, por exemplo, a promoção da troca de motores da frota do transporte público, adoção de opções energéticas e de transportes de carga alternativos, como ferrovias e hidrovias, e maior foco na inspeção veicular.

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