Lula mantém Juscelino, e governo cobra União Brasil por apoio no Congresso

Decisão ocorre após risco de piora na relação com o partido; auxiliares do presidente esperam que gesto seja convertido em voto

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Brasília

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu manter na Esplanada o ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil-MA), há dias sob pressão pela revelação de suposto uso irregular de diárias do governo. A decisão foi tomada após reunião de Lula com o seu ministro na tarde desta segunda-feira (6).

Antes do encontro, líderes da União Brasil disseram a ministros palacianos que exonerar Juscelino elevaria a rejeição do partido ao governo.

Embora tenha indicado três ministros, a legenda ainda não se assume como base de apoio a Lula no Congresso Nacional. Integrantes do partido, porém, fizeram chegar ao Palácio do Planalto o recado de que demitir Juscelino poderia significar levar a União Brasil definitivamente para a oposição. A sigla tem 59 deputados e 10 senadores.

A manutenção do ministro no cargo ocorre após pressão de aliados por sua saída, em meio a acusações de irregularidades envolvendo diárias recebidas pelo titular das Comunicações e o asfaltamento de uma estrada, com recursos de emenda, na sua fazenda no Maranhão.

Lula com o então indicado a ministro das Comunicações, Juscelino Filho, em dezembro de 2022. - Pedro Ladeira--29.dez.22/Folhapress

Durante a reunião com Lula nesta segunda, o ministro rebateu as acusações e foi aconselhado a defender-se publicamente.

Após o encontro, Juscelino publicou uma mensagem nas redes sociais dizendo que a reunião foi "muito positiva". "Na ocasião, esclareci as acusações infundadas feitas contra mim e detalhei alguns dos vários projetos e ações do ministério. Temos muito trabalho pela frente."

Aliados de Lula esperam que a partir de agora o Planalto aumente a cobrança sobre a União Brasil para que entregue no Congresso Nacional o apoio e os votos para avançar as propostas de interesse do governo.

Segundo aliados do mandatário, caso a sigla não corresponda as expectativas, haverá retaliação ao partido como um todo.

Uma ala da União Brasil diz que a decisão de manter Juscelino representa um gesto de Lula e deve reduzir a resistência de parte do partido.

No entanto não há a expectativa de que isso seja suficiente para colocar a legenda na base do governo.

Além de minimizarem as denúncias, uma ala dos aliados de Lula cita ao menos dois principais motivos para manter o ministro no cargo: não se indispor com a União Brasil; e não abrir a porteira para saída de ministros e criar desgaste com pouco mais de dois meses de governo.

Em entrevista à CNN, Juscelino Filho afirmou que o apoio da União Brasil ao governo não foi tratado no encontro com Lula. No entanto, disse não ter dúvidas de que o partido "será um grande parceiro" do governo e que vai entregar os votos necessários.

"Eu não tenho dúvidas de que o União Brasil vai entregar os votos e o apoio da maioria de suas bancadas para o presidente, tanto na Câmara como no Senado Federal, como entregou na PEC da Transição o que possibilitou o governo de ter um plano tão arranjado de retomada do crescimento, de retomar programas importantes nesse início do governo", afirmou o ministro, acrescentando que o partido vai ajudar nas pautas prioritárias do governo, citando em particular a reforma tributária.

Juscelino disse ainda que o partido optou por se declarar "independente", mas que há uma maioria da bancada que vai dar sustentação ao governo.

"Essa questão de se declarar base ou independente, acho que mais importante do que isso é entregar os votos necessários e declarar o apoio dentro do Congresso Nacional. E Acredito que o União Brasil fará isso", completou.

Alguns integrantes da União Brasil dizem que a legenda está fechada em apoio a Juscelino.

Ademais, há um outro complicador: a saída do ministro abriria uma frente de disputa dentro do PT. O partido já queria, durante a transição, ter ficado com as Comunicações e poderia, segundo aliados, tentar avançar sobre o ministério mais uma vez.

Fora isso, a demissão de Juscelino abriria um precedente muito cedo na Esplanada. Ministros com complicações parecidas no futuro seriam pressionados a deixar o cargo da mesma forma.

O entorno do chefe do Executivo diz que, apesar da decisão, Lula está irritado com o episódio.

Antes da reunião com o presidente, Juscelino publicou um vídeo nas suas redes sociais no qual se defende das acusações de uso indevido de diárias e do avião da FAB (Força Aérea Brasileira).

O ministro aponta um "erro no sistema de diárias", que acabou incluindo indevidamente no cálculo dos valores as datas referentes a fins de semana, quando não teve agendas públicas. Juscelino ainda acrescenta que todas as diárias pagas indevidamente foram devolvidas aos cofres públicos.

No vídeo, o ministro afirma que vem sendo vítima de "ataques distorcidos", diz que é "ficha limpa" e alega que não houve qualquer tipo de irregularidades em suas viagens.

Sobre o asfaltamento da estrada que passa em frente a sua fazenda, Juscelino afirmou à CNN que a obra não aconteceu nesse trecho, mas defendeu o projeto. Afirmou que a população da região não pode ser penalizada apenas porque ele tem um imóvel no caminho da estrada.

"Conversei com o presidente, expliquei tudo e agora é foco no trabalho", completou.

Na semana passada, o presidente havia demonstrado insatisfação com a postura do auxiliar e afirmado que, caso não comprovasse sua inocência, ele não seria mantido no governo.

No sábado (4 ), Juscelino Filho foi às redes sociais para dizer estar comprometido em mostrar a Lula que não houve irregularidade.

"Estou comprometido em esclarecer ao presidente Lula todas as denúncias infundadas feitas pela imprensa. Reitero que não houve irregularidades nas viagens citadas e que tudo está devidamente documentado. Também agradeço a oportunidade de ser ouvido com isenção e serenidade", disse.

A saída do ministro dividia aliados do chefe do Executivo. Enquanto a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), defendeu o afastamento temporário dele, outra ala do entorno de Lula vinha pregando que ele não poderia ser demitido —ao menos, não no curto prazo.

No fim de semana, a União Brasil saiu em defesa de Juscelino. Em nota da bancada, repudiou as declarações de Gleisi.

A Comissão de Ética Pública da Presidência da República vai, na próxima reunião do conselho, analisar o caso do ministro, conforme disse o colegiado à Folha.

"Informo que os conselheiros da Comissão de Ética Pública já tomaram conhecimento do caso, pela imprensa, e irão adotar as tratativas pertinentes sobre caso na próxima reunião do Colegiado", afirmou.

O próximo encontro dos conselheiros ocorrerá em 28 de março.

Juscelino recebeu diárias do governo federal por dias sem agenda de trabalho em São Paulo, São Luís e até no exterior.

De acordo com uma nota divulgada pela pasta na quinta (2), o titular da pasta decidiu devolver o valor das diárias referentes às viagens do Maranhão e de São Paulo.

Na viagem a São Paulo, o ministro teve apenas duas agendas oficiais e aproveitou a estadia na capital paulista para participar de um evento relacionado a cavalos Quarto de Milha, como revelou o jornal O Estado de S. Paulo. Juscelino Filho é criador de animais da raça.

Ele foi para São Paulo e voltou para Brasília em aviões da FAB. Isso aconteceu, segundo o Ministério das Comunicações, porque "o ministro foi cumprir agenda oficial, de interesse público".

Além disso, também segundo o jornal, Juscelino Filho direcionou verba do Orçamento para asfaltar uma estrada que corta sua fazenda, em Vitorino Freire (MA), antes de assumir o Ministério das Comunicações, quando exercia o mandato de deputado.

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