Bolsonaro diz que não tomou vacina da Covid-19 e nega adulteração em cartão

Ex-presidente afirma que ação da PF em sua casa foi uma 'operação para esculachar'

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Brasília

Alvo de operação da Polícia Federal, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) disse na manhã desta quarta-feira (3) que não tomou a vacina contra a Covid-19, assim como sua filha, Laura Bolsonaro, e que não houve adulteração no seu cartão.

"Não tomei a vacina. Nunca me foi pedido cartão de vacina [para entrar nos EUA]. Não existe adulteração da minha parte. Não tomei a vacina, ponto final. Nunca neguei isso. Havia gente que me pressionava para tomar, natural. Mas não tomava, porque li a bula da Pfizer", disse o ex-chefe do Executivo.

Bolsonaro foi crítico da vacinação contra o coronavírus, espalhou mentiras sobre o tema e sempre diz não ter se imunizado. Agora, a PF apura se houve adulteração no seu cartão do SUS e de sua filha.

As vacinas contra a Covid, como a da Pfizer, são seguras e tiveram sua eficácia comprovada em estudos científicos. Em todo o mundo, já foram aplicadas mais de 6 bilhões de doses. De modo geral, os efeitos da vacina são leves, sendo os mais comuns dor no local da aplicação, irritação e dores no corpo. Não há nenhuma contraindicação na bula da vacina da Pfizer restringindo seu uso.

O ex-presidente Jair Bolsonaro nesta quarta-feira em Brasília
O ex-presidente Jair Bolsonaro nesta quarta-feira em Brasília - Adriano Machado/Reuters

O ex-chefe do Executivo contou que teve o seu celular apreendido por agentes da polícia e que o aparelho não tem senha.

De acordo com o advogado Marcelo Bessa, que acompanhava o presidente, o aparelho da ex-primeira dama Michelle não foi apreendido. Ela foi vacinada em 2021, quando viajou para os Estados Unidos.

Bolsonaro disse que não se vacinou e que, se isso tivesse sido demandado quando ele viajou para a Flórida antes do término do seu mandato, teria sido noticiado.

As declarações foram dadas a jornalistas na porta de sua casa num condomínio de alto padrão em Brasília.

"Que bom [seria] se estivéssemos num país democrático, onde se pudesse discutir todas as coisas. Até assuntos que é proibido falar no Brasil. Um deles é vacina", afirmou Bolsonaro, antes de entrar no carro e partir.

Bolsonaro, depois, deveria prestar depoimento à Polícia Federal, mas sua defesa comunicou que ele não compareceria. O ex-presidente seguiu para a sede do seu partido, o PL, onde passou a manhã reunido com alguns aliados mais próximos.

Estiveram com eles seus filhos, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), e o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto. Também participaram das reuniões o deputado e ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem (PL-RJ), o líder do PL na Câmara, Altineu Côrtes (PL-RJ), e o ex-ministro da Cidadania João Roma.

No início da tarde, em entrevista à Jovem Pan, o ex-mandatário afirmou que a ação da PF em sua casa foi uma "operação para esculachar".

"Eu chamo de operação para te esculachar. Podiam perguntar sobre vacina pra mim, cartão, eu responderia sem problema nenhum. Agora existe uma pressão enorme, 24 horas por dia, o dia todo, desde antes eu assumir a Presidência, até agora. Não sei quando isso vai acabar", disse.

Ele chegou a chorar durante a entrevista ao comentar que os agentes federais fotografaram o cartão de vacina de Michelle. "Por que eu fico emocionado? Mexer comigo, sem problema. Quando vai para esposa, filha, aí o negócio é desumano", afirmou.

A ex-primeira-dama também é investigada pela PF sob suspeita de fraude no registro de vacinação. O ministro do STF Alexandre de Moraes, porém, autorizou a operação apenas contra Bolsonaro, não contra Michelle.

Bolsonaro também disse que uma pistola sua foi apreendida durante a operação. Nesse momento, disse que relatou aos agentes que não era "seguro" seguir desarmado. E relatou que a arma foi devolvida na sequência.

O ex-presidente também afirmou que não sabe o motivo pelo qual seus ex-assessores foram presos.

Questionado se a operação da PF seria uma "cortina de fumaça", o mandatário disse que ele "incomoda" seus adversários, que saberiam que ele tem poder político para desequilibrar uma eleição. E então acrescentou que a sua missão não terminou, embora não saiba se atuará como candidato ou como cabo eleitoral.

"Esses dois fatos últimos [a retirada de pauta do PL das Fake News e a operação da PL] podem ser coincidência. 'Ah, estão preocupados com 26'. A minha vinda aqui para o PL, eu poderia estar de folga, depois de um total de 49 anos de serviço. Mas achei que minha missão não acabou ainda. Ou como candidato no futuro ou como colaboração para que o partido nosso e quem defende as nossas bandeiras, de outros partidos também, cresçam. Isso incomoda, porque eu como candidato ou cabo eleitoral tenho certeza que a gente desequilibra as questões eleitorais no Brasil", afirmou o ex-presidente.

Bolsonaro também afirmou que a CPI mista será uma oportunidade para esclarecer os fatos de 8 de janeiro. Nesse momento, chamou alguns dos participantes dos atos golpistas de "bobos".

"Tinha baderneiro lá, tinha marginal lá dentro e esse cara precisa pagar pelo seu crime. Mas a grande maioria estava lá de bobo", afirmou.

Bolsonaro também disse que não cometeu irregularidades ao entrar nos Estados Unidos sem ter a vacinação.

"O tratamento dispensado a chefe de Estado é diferente de cidadão comum. Tudo é acertado antecipadamente. E em minhas idas aos Estados Unidos nunca foi pedido cartão vacinal. Então não existe fraude da minha parte no tocante a isso", afirmou.

O advogado Marcelo Bessa afirmou não ter mais informações sobre o inquérito, que corre sob sigilo. Mas classificou a operação como arbitrária e precipitada.

Os Estados Unidos exigem a apresentação de comprovante de vacina contra a Covid-19 para viajantes —obrigatoriedade que será encerrada no próximo dia 11. Segundo o governo americano, há exceções, como pessoas em viagens diplomáticas ou oficiais de governos estrangeiros. De acordo com a Embaixada dos EUA, fraudar documentos para tentar entrar no país é crime que pode ser punido com multa ou prisão.

O senador Flávio Bolsonaro afirmou haver uma tentativa orquestrada de assassinar a reputação do pai dele e que a operação da PF tinha motivação "infantil".

"Como para o Bolsonaro a gente sabe que não existe a presunção de inocência, e é óbvio que uma busca e apreensão na casa de um ex-presidente gera repercussão mundial, fica a pergunta: qual a intenção de alguém autorizar busca e apreensão na casa de um ex-presidente por causa de um motivo infantil desse?"

Mais à noite, ao deixar a sede do PL, a defesa do Bolsonaro voltou a falar com a imprensa e afirmou que o ex-presidente nunca acessou o sistema do governo onde os usuários concentram e têm acesso às informações sobre imunizações. E acrescentou que Bolsonaro nunca pediu que auxiliares acessassem por ele.

"Vamos pontuar com correção: o presidente nunca acessou, o presidente nunca soube senha, nunca manuseou o Gov.br", afirmou o ex-chefe da Secretaria da Comunicação da Presidência e integrante da defesa de Bolsonaro, Fabio Wajngarten.

O ex-secretário do governo Bolsonaro disse também que Bolsonaro nem mesmo chegou a pedir que assessores e auxiliares acessassem a sua conta no sistema do Sistema Único de Saúde.

"Não houve nenhum pedido [para acessar o cartão de vacinação] até porque para o presidente da República não há obrigatoriedade de nenhum certificado. Para os países onde exige qualquer teste, vacina, ou o presidente fazia o teste anteriormente à viagem ou ele declinava o convite", completou Wajngarten.

A Polícia Federal cita no pedido de busca contra Bolsonaro que o acesso ao aplicativo do ConecteSUS e a emissão do certificado de vacinação se deram por meio do celular de Mauro Cid, então chefe da Ajudância de Ordens do ex-presidente.

Para acessar o documento, diz a PF, foi utilizado o sistema Gov.br, do governo federal, por meio de emails de assessores de Bolsonaro.

"Portanto, não se evidenciou qualquer fato suspeito relacionado à utilização indevida do usuário do ex-presidente da República, por terceiros não autorizados, para acessar o aplicativo ConecteSUS", afirma a PF na representação.

Embora cauteloso e sem afirmar de maneira categórica, Wajngarten insinuou a possibilidade de ter havido um ataque hacker na conta do ex-presidente. Ele fez a ilação ao lembrar que isso já teria ocorrido no passado.

"Preliminarmente, a investigação versa sobre falsificação no cartão de vacina do presidente e seus familiares. Se tem uma história que é de domínio público no Brasil e no mundo é a posição do presidente quanto à vacinação. Todo mundo sabe que o presidente não se vacinou. Todo mundo sabe que o cartão de vacinação do Bolsonaro já foi objeto de hackeamento. E diante disso a defesa vai estudar o que se encontra nos autos e no momento oportuno vai se manifestar pelo agendamento do depoimento do presidente", afirmou.

Os advogados voltaram a afirmar que o presidente está à disposição para prestar depoimento, mas não garantiram que isso ocorrerá nesta semana. Disseram que tiveram acesso aos autos pela primeira vez na noite desta quarta-feira e que vão analisá-lo nos próximos dias e traçar as estratégias de defesa.

O também advogado Paulo Cunha Bueno afirmou que é importante que isso aconteça "o quanto antes". O defensor afirma que não existe motivo para que tenha sido feita uma falsificação no cartão de vacina de Bolsonaro.

Também nesta quarta, o presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Antonio Barra Torres, participou de evento da Frente Parlamentar da Vacina no Congresso e fez um apelo para que a população confie nas vacinas aprovadas contra a Covid.

"O que eu digo relacionado com esse problema é que a população deve confiar nas vacinas que o Brasil tem disponíveis. Já são cinco vacinas aprovadas pela Anvisa. Todas as informações, as bulas etc. são públicas, são publicadas. Então, confie na vacina. Leve sua família para se vacinar, suas crianças para se vacinar, isso é o mais importante", afirmou.

No começo da pandemia, Barra Torres chegou a ser um conselheiro de Bolsonaro e participou de manifestação pró-governo. Com o avanço da Covid, o médico rompeu com o ex-presidente e passou a defender a imunização.

Após o mesmo evento, a secretária de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde, Ethel Maciel, disse que a operação da PF não mostra fragilidade no sistema de registro das vacinas contra a Covid.

"Não tem problema de segurança. Ninguém invadiu o sistema. O sistema funciona, em todos os municípios, você tem acessos diferenciados, mas tudo é ligado, tudo é rastreável", disse a secretária.

Os advogados de Bolsonaro soltaram uma nota oficial na noite de quarta-feira (3) para afirmar que Bolsonaro nunca se vacinou contra a Covid-19 e que, enquanto foi presidente, só ingressou em países estrangeiros que aceitavam pessoas não vacinadas ou que ficavam satisfeitos com a realização de teste viral.

"A contrario sensu do quanto amplamente noticiado na data de hoje, não haveria qualquer motivo para que o Ex-Presidente promovesse ou determinasse a confecção de certificados falsos", diz o texto.

Além disso, informam que a ex-primeira-dama foi vacinada "com imunizante de dose única, no ano de 2021" e que a filha do casal "foi proibida de receber qualquer imunizante em razão de comorbidades preexistentes, situação sempre e devidamente atestada por médicos".

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