Defesa de Cid mira soltura enquanto negocia detalhes de delação sob pressão de bolsonaristas

Advogado de militar diz que tratativas estão em andamento; Moraes pode decidir sobre o caso nos próximos dias

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Brasília

A defesa de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), pediu a liberdade provisória ao ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), em meio à negociação de uma delação premiada que pode atingir o ex-presidente.

O pedido foi feito após ele manifestar ao ministro na última quarta-feira (6) a intenção de firmar um acordo com os investigadores. Preso há mais de quatro meses no Batalhão do Exército de Brasília, Cid era um dos assistentes mais próximos de Bolsonaro e adotou postura de maior cooperação com autoridades policiais após mudar de advogado, em agosto.

Mauro Cid e Jair Bolsonaro, em 2019 - Adriano Machado - 18.jun.19/Reuters

O atual responsável pela defesa do tenente-coronel do Exército, Cezar Bittencourt, disse à Folha nesta sexta-feira (8) que as tratativas sobre o acordo ainda estão em andamento. "Não fechamos, estamos conversando sobre os detalhes, mas isso [vai ficar] para a semana que vem", afirmou.

Cid foi preso em uma operação da Polícia Federal sob suspeita de ter falsificado cartões de vacinação de Bolsonaro e familiares. O tema é um dos focos sobre os quais a PF demanda mais detalhes –principalmente aqueles relacionados ao envolvimento do ex-presidente.

O militar também é investigado em outros casos, como o do vazamento de dados sigilosos sobre a urna eletrônica e os ataques golpistas do 8 de janeiro. De acordo com relatos feitos por aliados de Bolsonaro nas últimas semanas, o ex-assessor está preocupado com a família e poderia falar o possível para sair da prisão.

O acordo de Cid já foi aceito pela Polícia Federal, mas ainda precisa ser homologado por Moraes. A decisão pode ocorrer nos próximos dias.

A proposta também deverá ser analisada pela PGR (Procuradoria-Geral da República) –que, procurada, afirmou que "o processo corre sob sigilo". A decisão de Moraes independe da posição do órgão.

Segundo pessoas próximas às investigações, para o acordo de delação de Cid ser aprovado, as autoridades precisam avaliar que há novidade e provas quanto às informações apresentadas.

A delação não pode, isoladamente, fundamentar sentenças sem que outras informações corroborem as afirmações feitas. Os relatos devem ser investigados, assim como os materiais apresentados em acordo.

Em meio às negociações de Cid, outro assessor de Bolsonaro, Max Guilherme Machado de Moura, foi liberado nesta quinta-feira (7) por decisão de Moraes. Ele havia sido preso no mesmo dia que Cid e agora cumprirá medidas cautelares, passando a ser monitorado por meio de tornozeleira eletrônica.

A suspeita é de que Max teria participado do esquema de fraudes no sistema do Ministério da Saúde. Ele confirmou, em depoimento à PF, ter emitido seu certificado de vacinação como se estivesse imunizado mesmo sem ter recebido doses contra a Covid.

Também são esperadas contribuições de Cid sobre o papel dos envolvidos no escândalo das joias, em que houve suposto desvio, venda, recompra e devolução de presentes de alto valor recebidos por Bolsonaro de autoridades estrangeiras.

A PF incluiu Cid entre os responsáveis pelo que classificou de "operação resgate", executada por alguns dos principais auxiliares do ex-presidente para reaver nos Estados Unidos joias anteriormente vendidas –mas que autoridades brasileiras consideraram pertencer ao patrimônio público do país.

A apuração das joias é, até o momento, a mais preocupante para o entorno do ex-presidente, por aproximá-lo de um suposto esquema de desvio de dinheiro público.

Também podem ser abordados na colaboração detalhes sobre um documento encontrado no celular de Cid que continha uma espécie de plano de golpe para reverter a eleição de Lula (PT) no ano passado.

Foram identificadas mensagens em que um oficial das Forças Armadas pede que Cid convença Bolsonaro a ordenar uma intervenção militar —o que configuraria um golpe de Estado.

A proposta de delação foi feita após idas e vindas do advogado de Cid sobre a disposição do militar de envolver Bolsonaro.

Menos de um mês após assumir a defesa do militar, Bittencourt acumulou recuos em versões e chegou a afirmar que a possibilidade de Cid fazer uma delação era "zero".

No dia 31, Cid prestou depoimento de dez horas à PF sobre o caso das joias. No dia seguinte, Bittencourt disse que o ex-ajudante de ordens "assumiu tudo" e não incriminou Bolsonaro.

Bolsonaro e a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro optaram por ficar em silêncio em depoimentos marcados com a PF sobre o caso.

Em meio às notícias sobre o ex-auxiliar, Bolsonaro e a esposa participaram de um culto no DF, na noite desta quinta-feira (7), em que ela chorou e usou o microfone para orar e citar palavras como perseguição. "Vão nos atacar. O Senhor não nos prometeu que seria fácil. O Senhor falou que nós seríamos perseguidos. Todos aqueles que tivessem Cristo como o Senhor salvador seriam perseguidos. E nós estamos sendo perseguidos e injustiçados".

A possível delação provocou reação de aliados de Bolsonaro, como o ex-secretário de Comunicação da Presidência Fabio Wajngarten.

Ele publicou que "não há o que delatar" em seu perfil oficial na plataforma X, antigo Twitter, nesta quinta-feira.

A declaração, escrita fora de contexto, foi vista como uma referência às movimentações de Cid.

"A quem possa interessar em pleno feriado de 7 de setembro completamente esvaziado: não há o que DELATAR", afirmou, fazendo referência também aos desfiles do feriado de 7 de Setembro sob gestão do governo Lula.

Wajngarten, que além de assessor também é um dos advogados de Bolsonaro, havia saído em defesa de Cid em julho, quando o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro prestou depoimento à CPI do 8 de janeiro, em andamento no Congresso.

Na ocasião, Wajngarten protestou contra o fato de o tenente-coronel estar preso desde maio e disse que o detiveram e "jogaram a chave fora" da prisão.

"Hoje completa 70 dias que ele está preso, sem nenhuma razão que fundamente sua prisão preventiva, providência extrema e que teve o parecer expressamente contrário da PGR—que, ademais, opinou pela revogação da prisão", disse.

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