PF quer Bolsonaro, não Cid, e chance de delação é zero, diz novo advogado do militar

Defensor muda tom após conversar com tenente-coronel, afirma que ele tinha autonomia e evita irritar ex-presidente

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Brasília

O novo advogado do tenente-coronel Mauro Cid, Cezar Roberto Bitencourt, diz acreditar que as investigações da Polícia Federal contra seu cliente têm como foco principal o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

"O que eles querem mesmo é o presidente [Jair Bolsonaro], não o Cid", disse à Folha.

Mesmo com essa percepção, Bitencourt recuou de quarta-feira (16) para quinta-feira (17) —após uma primeira e longa conversa com Mauro Cid no Batalhão do Exército, em Brasília— e passou a afirmar que o militar não apenas cumpria ordens.

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O tenente-coronel Mauro Cid contratou novo advogado na terça-feira (15) para defendê-lo diante do avanço das investigações da PF - Pedro Ladeira/Folhapress

"Eu tenho a impressão de que ele tinha certa autonomia. E mais: se eu erro aqui, eu conserto ali. Se fiz uma coisa errada aqui, posso consertar lá", completou o advogado. Antes ele havia afirmado a alguns veículos de comunicação que o cliente só cumpria ordens do chefe.

O advogado disse ainda que iria interromper as entrevistas nesse primeiro momento porque "você irrita o outro lado", em referência ao ex-presidente. "É bom não cutucar abelha com vara curta."

Em uma postura diferente da adotada na véspera, quando afirmou que Cid era um cumpridor de ordens, Bitencourt passou a dizer nesta quinta que Cid, por ser um "assessor competente e preparado", realizava ações em favor de Bolsonaro sem necessariamente ter sido convocado para a missão.

Ele disse ainda que é "advogado da defesa, não acusador". Segundo militares próximos da família de Cid, a tendência é que o tenente-coronel assuma a responsabilidade pelos atos ao invés de transferir a culpa para Bolsonaro —por mais que ele possa ter recebido alguma ordem ilegal do ex-presidente.

Bitencourt é antigo crítico da delação premiada, especialmente pelo uso do instituto durante a Operação Lava Jato. A possibilidade de Cid usar do instrumento diante do avanço das investigações da Polícia Federal, no entanto, passou a assombrar o entorno de Bolsonaro.

Mesmo tendo assumido a função há poucos dias, o advogado já descarta a chance de Cid fechar uma delação premiada.

"A gente não pensa em delação, não tem nem por quê. Possibilidade zero. Vou fazer a defesa do Cid, não tem porque delatar ninguém. Eu sou contra isso."

Cid está preso desde maio no Batalhão do Exército, em Brasília. A cela possui 20 metros quadrados. O militar só costuma sair do local duas horas por dia, para um período de banho de sol em que tem disponível grande espaço para realizar corridas e musculação.

No início da prisão, o Exército adotou protocolo menos rígido e permitiu que o tenente-coronel recebesse uma série de visitas de militares, amigos e familiares. As regras passaram a ser mais rígidas após o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), determinar que as visitas, exceto de familiares e advogados, devem ser autorizadas por ele.

A razão seria o número "elevadíssimo" de visitas recebidas por Cid, segundo o ministro: 73 pessoas em 19 dias de prisão.

O advogado Cezar Bitencourt se nega a fazer comentários sobre a forma como Moraes vem conduzindo os inquéritos em que Cid está implicado. Ele, porém, avalia que a prisão já se estendeu por tempo demais.

"Eu acho a prisão desnecessária. Não tem por que ele estar preso já há tanto tempo. Mas isso eu vou resolver com o Judiciário", disse.

Ele espera encontrar Moraes e o delegado da Polícia Federal responsável pelos inquéritos na próxima semana.

A defesa do militar ainda diz que as movimentações suspeitas das contas de Cid identificadas pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) não são resultado da venda das joias ou outros crimes.

Segundo o advogado, Cid tem cerca de R$ 4 milhões em imóveis e fez transações nos últimos meses, cujos detalhes estariam em seu Imposto de Renda.

Mauro Cid foi preso em 3 de maio por suspeita de adulterar o seu cartão de vacinação, o de Bolsonaro, o de sua esposa, Gabriela Cid, e de uma de suas filhas. Segundo a Polícia Federal, o militar teria colocado a informação falsa de que eles haviam sido vacinados para permitir a ida deles aos Estados Unidos dias antes da posse de Lula.

Após a prisão e apreensão dos celulares de Cid, a Polícia Federal enviou um relatório ao STF mostrando que o militar tinha documentos em seus telefones para dar um verniz jurídico a um golpe contra a eleição de Lula.

O relatório mostrou ainda que militares fizeram apelos a Cid para que auxiliasse Bolsonaro na aventura golpista.

Em um novo desdobramento, Cid e seu pai, o general Mauro Cesar Lourena Cid, foram descobertos pela PF em negociações para vender presentes recebidos por Bolsonaro em viagens oficiais. Os bens são considerados de Estado, e Bolsonaro não poderia apoderar-se dos itens valiosos, segundo entendimento do TCU (Tribunal de Contas da União).

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