Descrição de chapéu Governo Lula São Paulo

Esquerda faz atos esvaziados contra Bolsonaro sob distanciamento de Lula

Manifestações dispersas têm baixa adesão; PT busca evitar comparações com rival e minimiza ausência de presidente

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Ribeirão Preto e São Paulo

Movimentos de esquerda fazem neste sábado (23) uma série de atos dispersos pelo país, convocados em resposta ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), mas que acabaram esvaziados em meio ao distanciamento do governo Lula (PT) e ao racha na visão de partidos e militantes sobre a pertinência da mobilização.

Os protestos foram anunciados por partidos e entidades após ato no mês passado que reuniu uma multidão na avenida Paulista, em São Paulo, a favor de Bolsonaro, investigado pela Polícia Federal no inquérito que apura uma tentativa de golpe.

Os temas da manifestação da esquerda acabaram sendo pulverizados, incluindo a lembrança aos 60 anos do golpe militar (tema que Lula tem defendido esquecer para não irritar militares) e pedido de que não haja anistia para golpistas.

Protesto convocado por movimentos de esquerda contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, no Largo São Francisco, centro de São Paulo - Danilo Verpa/Folhapress

Havia manifestações programadas para 22 cidades no Brasil e no exterior. As da manhã, em capitais como Belo Horizonte, Fortaleza, Curitiba, Campo Grande e Recife, já indicavam que a adesão seria baixa, com a presença de dezenas a centenas de pessoas.

Nas duas principais manifestações, à tarde, em Salvador e em São Paulo, a presença foi um pouco maior, mas muito longe de concentrar multidões com milhares de pessoas, como já ocorreu em atos anteriores da própria esquerda.

Na capital baiana, segundo estimativa da Polícia Militar, o ato reuniu 4.000 pessoas —a previsão era receber ao menos 10 mil participantes.

O grupo da USP Monitor do Debate Político no Meio Digital, porém, estimou em 1.700 pessoas o público presente no pico da manifestação às 16h30. Para o cálculo, foi utilizada metodologia que conta o número de cabeças em imagens ao longo de toda a avenida, sem sobreposição.

Pelo mesmo critério, esse grupo havia estimado em 185 mil pessoas o público presente no pico da manifestação com Bolsonaro na Paulista em fevereiro.

Presente na manifestação em Salvador, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, afirmou que o objetivo da mobilização da esquerda não era se equiparar em números ao ato realizado por Bolsonaro na Paulista, mas sim reforçar o combate a ditaduras e tentativas de golpe.

"[O objetivo] é fazer atos pelo Brasil inteiro, independente de tamanho. Para reunir as pessoas e aqueles que lutaram contra a ditadura e deixar aceso na memória que não podemos voltar a esse tempo. E também para dizer que nós não concordamos com a tentativa do golpe do 8 de janeiro."

Em Salvador, o governador Jerônimo Rodrigues (PT) e o senador Jaques Wagner (PT), que eram esperados, acabaram não comparecendo.

Lula também não participou de nenhuma manifestação e a deixou de lado também em redes sociais. Sobre a sua ausência, Gleisi disse que "não é função do governo nem do presidente fazer mobilizações sociais".

Em São Paulo, sob chuva, o largo São Francisco, no centro, ficou mais cheio depois das 16h, uma hora depois do começo do ato, mas ainda era possível caminhar entre os militantes.

Contribuíam para deixar o espaço menos vazio um tapume de obras no local e duas grandes bandeiras estendidas por manifestantes, uma do Brasil e outra da Frente Povo sem Medo.

"Acho que São Pedro está do lado de lá", brincou o deputado estadual Simão Pedro (PT), comparando a chuva com o dia de sol durante o protesto dos bolsonaristas na Paulista no dia 25.

Com discursos em memória das vítimas da ditadura, pedidos de prisão de Bolsonaro e contra anistia aos golpistas, havia também presença de bandeiras da Palestina e críticas às mortes pela Polícia Militar do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Estavam presentes integrantes do movimento estudantil, da Apeoep (sindicato dos professores), do sindicato dos metalúrgicos, do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e de partidos de esquerda.

Com breve e aplaudida presença no ato, José Dirceu (PT) disse não caber comparação com o público do ato de Bolsonaro, uma vez que a esquerda havia optado por atos espalhados por todo o país em memória do golpe de 1964, o que descaracterizaria um confronto direto com o ex-presidente.

Integrante da Frente Povo Sem Medo, Juliana Donato disse que a chuva atrapalhou a manifestação, mas que o recado contra a anistia aos golpistas foi dado.

Ela avaliou como um erro a decisão de Lula de não endossar a mobilização, assim como a de cancelar o ato que o governo federal faria para marcar os 60 anos do golpe militar.

"Não só pela data redonda, mas porque ainda vivemos uma ameaça à democracia", disse. "Lula não falar sobre o golpe não apaga nem o golpe nem a disputa política."

Em Belo Horizonte, participantes que foram ao ato na praça Afonso Arinos utilizavam camisetas vermelhas com inscrições como "sem anistia". Além do mote "ditadura nunca mais", a defesa da Palestina em meio à guerra com Israel também foi um dos temas.

Os manifestantes que se dirigiram à praça Santos Andrade, em Curitiba, portavam faixas como "democracia sempre" e "sem anistia para golpista".

Em Fortaleza, também com a participação de algumas dezenas de manifestantes, bandeiras do MST, de sindicatos e do PSOL foram agitadas durante a manhã.

Também houve atos em São Luís e em Lisboa, que repetiram os motes.

O dia de mobilização pela democracia foi organizado por partidos de esquerda, centrais sindicais e pelas frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular, que reúnem entidades como MTST, CUT (Central Única dos Trabalhadores), CMP (Central de Movimentos Populares), MST e UNE (União Nacional dos Estudantes).

Ministros do PT e de outros partidos de esquerda evitaram falar que havia uma posição fechada ou mesmo uma orientação para se distanciarem dos atos. Por outro lado, afirmaram que não iriam comparecer por motivos variados, como compromissos familiares e doenças.

Para evitar desgaste com as Forças Armadas, Lula proibiu que ministérios realizassem críticas ou cerimônias em memória dos 60 anos do golpe militar, em 31 de março.

Enquanto isso, líderes dos movimentos de esquerda ressaltaram, ao longo da semana, a importância de lembrar a data para evitar que se repita. As entidades se dividem entre minimizar a postura do governo Lula ou criticar o presidente pelo veto.

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