As mudanças no Código Nacional de Trânsito podem ajudar ou atrapalhar?

Médico e sindicalista apontam prós e contras do projeto de Bolsonaro enviado ao Congresso

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Trânsito em avenida

Tráfego às 6h30 na avenida das Nações Unidas sob a ponte Octavio Frias de Oliveira, na zona sul de São Paulo Eduardo Knapp/Folhapress

São Paulo

Dobrar o limite de pontos e a validade da Carteira Nacional de Habilitação (CNH), não multar quem conduz crianças sem cadeirinha no banco traseiro e eliminar exames toxicológicos para motoristas profissionais na hora de habilitar ou renovar a carteira são algumas das propostas de mudanças no Código de Trânsito Brasileiro

O projeto de lei, encaminhado ao Congresso pelo presidente Jair Bolsonaro no início de junho, é controverso. Só traz "prejuízos", na visão de Dirceu Rodrigues Alves, médico especializado em medicina do trânsito e do trabalho e diretor da Abramet (Associação Brasileira de Medicina do Trânsito).

Já para Francisco Xavier da Silva, secretário-geral do Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores em Transporte Rodoviário Urbano de São Paulo, as alterações devem beneficiar, além da sua categoria, toda a população. 

O aumento da pontuação para suspensão da carteira de 20 para 40 pontos é uma das reivindicações do sindicato. "Quem mais precisa da carteira está mais exposto a multas, é fácil chegar aos 20 pontos com infrações menores e involuntárias, e isso penaliza quem trabalha, tira o direito de o motorista exercer sua profissão e se sustentar", diz Xavier da Silva. 

Para Alves, da Abramet, um limite de pontos mais baixo força o motorista a guiar com cautela e deixa o trânsito mais seguro. Elevar para 40 "vai causar danos pessoais, materiais, para a saúde e a sociedade", diz. No caso do aumento do prazo para o exame de renovação da habilitação, a preocupação também é com a segurança de condutores, passageiros e pedestres.

"Concentração e respostas motoras são fundamentais para a pessoa dirigir com segurança, e essas condições mudam em prazos menores que dez anos, precisam ser reavaliadas com frequência."

Idosos acima de 65 anos, que hoje precisam renovar o exame a cada três anos, teriam esse prazo ampliado para cinco. "Não tem cabimento. A ciência já provou que, a partir dos 50 já há diminuição de reflexos, visão, audição. As avaliações médicas precisam ser ainda mais frequentes", diz Alves. 

Xavier da Silva discorda. "Aumentar o tempo de validade vai beneficiar milhões de pessoas que estão sem dinheiro para renovar a CNH. É uma medida para ajudar a população e a economia", afirma. 

O mesmo raciocínio vale para os idosos com mais de 65. "É muito caro fazer a renovação, e o Brasil tem muitos aposentados recebendo só um salário. Pagar o exame a cada três anos é muito pesado", diz Xavier da Silva. 

Outra mudança polêmica é o fim da obrigatoriedade do exame toxicológico para caminhoneiros, motoristas de transporte de passageiros ou de máquinas agrícolas na hora da tirar ou renovar a carta. 

Não há respostas fáceis neste caso. Alves considera o exame importante, mas não da forma como tem sido feito, conforme o código atual. No momento da renovação, o exame toxicológico não é garantia de que o condutor não usa ou não usará substâncias que comprometem a sua capacidade de direção. 

O motorista deveria ser examinado quando está em trânsito, nas estradas e nas ruas, segundo Alves, da Abramet. 

O secretário-geral do sindicato dos motoristas também considera a exigência atual cara e pouco eficaz para coibir o uso dessas substâncias. E há ainda a questão dos resultados falsos-positivos. "Para não ficar sem carta, quando o resultado é falso, o trabalhador tem que pagar mais um exame de contraprova", diz Xavier da Silva.

As visões do médico e do sindicalista convergem ainda em relação à proposta que tem chamado muita atenção: aquela que alivia a punição para quem transporta crianças sem a cadeirinha. O projeto substitui a atual penalidade (multa gravíssima e retenção do veículo) por uma simples advertência por escrito. 

"Como cidadão, sou contrário à mudança. As crianças ficam vulneráveis, já foi provado que a cadeirinha salva muitas vidas", diz Xavier da Silva. 

O diretor da Abramet concorda. "Lutamos pela preservação da vida, mas vivemos uma doença de cidadania no trânsito. Em muitas situações, só advertência não funciona."

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.