Barreiras à inovação no Brasil vão de burocracia a mão de obra

Para especialistas, reforma tributária e marco legal de startups podem abrir caminhos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Sistemas tributário e regulatório complexos. Falta de estabilidade no financiamento de ciência e pesquisa. Competição frágil entre empresas. Carência de mão de obra qualificada. Essas são as quatro principais barreiras à inovação no país, segundo especialistas.

O diagnóstico foi feito no 4º seminário Inovação no Brasil, realizado pela Folha, na quinta-feira (25).

Para transpor a primeira barreira, a aposta é a reforma tributária, em tramitação no Legislativo, e o marco legal das startups.

Além de simplificar o cipoal de impostos brasileiro, a reforma pode estimular a inovação. Na tributação de automóveis, por exemplo, é possível privilegiar os carros elétricos ou veículos que emitem menos carbono.

O marco legal das startups, que também tramita no Congresso, pode ajudar a estimular investimentos. Aprovado por unanimidade pelo Senado em fevereiro, o texto aguarda nova análise da Câmara, sua casa de origem.

Em linhas gerais, o marco desburocratiza os processos de abertura e fechamento de negócios, além de prever regras e critérios para que as empresas sejam consideradas startups.

Para o advogado Marcel Daltro, sócio do Nelson Wilians Advogados, o principal avanço está na proteção do investidor. “Como o investidor-anjo [pessoa física que aplica o próprio patrimônio em startups] deixa de ser considerado sócio, ele acaba sendo protegido, o que incentiva mais investimento.”

Na prática, isso significa que os investidores-anjo não respondem por dívidas das startups. Eles compartilham os lucros, mas sem a responsabilização que teriam por fazer parte do capital social da empresa.

Esse tipo de segurança jurídica move o setor privado que, em certa medida, pode suprir a falta de investimentos públicos, mas há um limite.

Os especialistas são unânimes ao afirmar que as constantes reduções no investimento em pesquisa e ciência pelo governo federal são preocupantes.

“Não há bala de prata ou solução mágica. A única saída é persistir em políticas que valorizam educação, saúde, ciência e tecnologia”, diz o sociólogo Glauco Arbix, coordenador do Observatório da Inovação da USP.

Além do montante de cortes já feitos, pesa a preocupação sobre o que pode aparecer no plano de redução dos incentivos fiscais que o presidente Jair Bolsonaro deve enviar ao Congresso até setembro. O plano será feito para cobrir os gastos da PEC Emergencial (agora emenda constitucional 109/2021).

O deputado federal Aliel Machado (PSB-PR), que preside a Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara, diz que, para que a PEC fosse aprovada, o governo firmou com parlamentares da oposição o compromisso de que os setores de ciência e tecnologia não serão impactados.

A única nota pública do Ministério da Economia, porém, é mais breve, e afirma que a Lei de Informática, dispositivo que reduz impostos de empresas que produzem hardwares, não será afetada.

O deputado lembra que uma vitória recente foi a derrubada do veto presidencial na proibição de contingenciamento de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, uma das principais fontes de financiamento da inovação no país.

“Não há como fomentar a inovação se não tivermos consciência da importância do investimento”, afirma.

Gianna Sagazio, diretora de Inovação da CNI, concorda que faltam políticas públicas que incentivem pesquisa e desenvolvimento. “Estamos na contramão do que está acontecendo no mundo. Os países mais inovadores reconhecem que essa é a principal estratégia de desenvolvimento.”

Ela cita como exemplo países membros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), como Israel e Coréia do Sul, com investimento em P&D de até 5% do PIB. No Brasil, ela estima que o valor esteja por volta de 0,5%.

Para Leonardo Gomes, professor de administração da FEA-USP, a competitividade é outro importante gatilho do processo de inovação. O exemplo, nesse caso, são as fintechs (startups com foco em agilizar, com tecnologia digital, serviços financeiros), que levaram os grandes bancos a procurarem soluções inovadoras no atendimento aos clientes.

“O Brasil é muito fechado para o comércio internacional, o que limita a competição e o acesso a tecnologias, que entram no mercado brasileiro a um preço muito superior”, afirma Fernanda De Negri, economista do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

Para promover inovação, porém, é preciso mão de obra qualificada. Alberto Miyazaki, diretor-chefe em tecnologia (CTO) da IBM Brasil, defende que a missão das empresas é contribuir para a formação de seus funcionários. “Com a pandemia, as empresas tiveram que promover mudanças rapidamente. O principal desafio daqui para frente vai ser como continuar inovando. É necessário atrair e preparar os talentos.”

Uma vez nas empresas, esses novos colaboradores precisam sentir que a cultura corporativa aceita o erro. “Existe uma dificuldade gigantesca em entender que a inovação envolve experimentação e falhas”, afirma Leonardo Gomes, da USP.

O professor resume o desafio: “Inovação tem que ser um esporte nacional praticado por todas as empresas”.

O webinário foi mediado por Vinicius Torres Freire, colunista da Folha, e teve patrocínio de Santander, Synapcom, além de apoio do grupo Nelson Wilians.


Confira a íntegra do webinário

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.