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Flexibilização dos planos de saúde divide especialistas

Proposta de coberturas enxutas pode reduzir custos, mas há risco de retrocesso nos direitos do consumidor

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São Paulo

A proposta de flexibilização dos planos de saúde, que passariam a ter coberturas mais enxutas do que hoje determina a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), dividiu especialistas que participaram da 8ª edição do seminário Saúde do Brasil, realizado pela Folha na última segunda-feira (20).

Hoje, há cinco tipos de plano: ambulatorial, hospitalar com ou sem obstetrícia, referência —que inclui atendimento em consultórios, exames e internação— e cobertura odontológica. As empresas são obrigadas a oferecer uma lista de procedimentos, definida pela ANS.

Um projeto de lei de 2006, que voltou a ser discutido na Câmara neste ano, propõe retirar a obrigatoriedade e permitir que operadoras ofereçam coberturas reduzidas, em que o consumidor pode contratar só parte dos serviços.

Se por um lado a proposta pode resultar em opções mais baratas, há risco de retrocesso nos direitos dos consumidores, segundo os debatedores.

Vera Valente, diretora-executiva da FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar), defendeu que planos mais segmentados vão permitir um maior acesso à saúde, com ofertas mais acessíveis para quem, hoje, não consegue pagar o serviço.

“Não estamos falando em mudar os planos atuais, é para quem hoje não está no sistema e depende apenas do SUS [Sistema Único de Saúde].”

Segundo Valente, a lista de procedimentos obrigatórios encarece os planos, e os consumidores deveriam ter a opção de escolher. “Se você puder pagar, ótimo. Não entendo defender que, ou as pessoas têm o plano completo, ou não tem nada”, diz.

Para Ana Carolina Navarrete, coordenadora do programa de saúde do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), as mudanças podem ser feitas via regulação sem necessidade de alterações profundas na lei.


Veja, abaixo, a transmissão do debate.


Ela argumenta que a negociação de cobertura não traz benefícios para o consumidor. “Quando permitimos um plano que oferece exame, mas não dá direito ao tratamento, o que a pessoa faz com o diagnóstico? Não faz sentido mudar a lei e tirar a proteção [do consumidor] para que empresas possam concorrer com clínicas populares.”

De acordo com dados do Idec, as operadoras lideraram o ranking de reclamações dos consumidores até 2019—no ano passado, os serviços financeiros tomaram a liderança. Navarrete diz que as reclamações mais comuns eram relacionadas à falta de cobertura, mas, de 2018 para cá, passaram a ser sobre reajuste.

Em uma decisão inédita em julho deste ano, a ANS determinou um reajuste negativo de -8,19% para planos individuais ou familiares. A justificativa foi a queda de procedimentos eletivos como consultas, exames e cirurgias registrada em 2020, motivada pela pandemia de Covid-19.

A medida só valeu para os usuários que tenham contratos individuais, fatia que representa 17% do total de beneficiários. Os planos coletivos empresariais e por adesão não são regulados pela ANS.

A ANS ainda suspendeu o reajuste de mensalidade de 2020, mas a partir de janeiro deste ano esse reajuste —anual ou por mudança de faixa etária— pode voltar a ser cobrado, parcelado em 12 vezes. No entendimento do Idec, afirma Navarrete, a cobrança das mensalidades suspensas não deveria ter acontecido sem avaliação desse impacto para o consumidor.

Ela também critica a ausência de regulação nos planos coletivos, criando uma competição desigual. “Se você deixa uma parte menos regulada, a tendência do mercado é ir para onde ele é mais livre.”

Já a diretora-executiva da FenaSaúde diz que não cabem interferências por ser uma negociação entre empresas. O fato do reajuste do plano individual ser calculado de forma única para todo setor, diz, desestimula operadoras pois há um risco de o valor não cobrir a despesa assistencial da empresa.

Valente avalia que as mudanças na estrutura etária e no perfil epidemiológico do país, somadas às novas tecnologias do mercado, aumentaram o custo dos planos de saúde.

E, embora tenha tido uma queda na sinistralidade no ano passado, hoje há uma tempestade perfeita. “A segunda onda da Covid-19 trouxe internações mais caras, pois houve um aumento nos custos dos insumos e as cirurgias e procedimentos voltaram a padrões pré-pandemia”, diz, acrescentando que isso deve refletir nos próximos reajustes.

Entre março de 2020 e julho deste ano, 1,3 milhão de pessoas adquiriram um plano de saúde, segundo dados da ANS, e o número de beneficiários já alcança a marca dos 48,3 milhões, o maior desde 2016.
“Os números vêm crescendo de forma contínua, o que demonstra o interesse da sociedade no acesso à saúde suplementar e na segurança que ela representa, especialmente neste momento de pandemia”, complementa Paulo Rebello, diretor-presidente da ANS.

Segundo ele, entre os principais desafios do setor está a busca pela sustentabilidade, com operadoras saudáveis que garantam atendimento de qualidade em tempo adequado, e maior transparência para que o consumidor possa tomar melhores decisões.

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