Nos EUA, setor de espetáculos se preocupa com baixa audiência

Apesar do retorno aos palcos, público não retomou frequência do pré-pandemia

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Michael Paulson Javier C. Hernández
Nova York | The New York Times

A retomada dos espetáculos ao vivo nos Estados Unidos após a paralisação causada pela pandemia causou muita alegria nos últimos 12 meses. Mas o público que tem aparecido para aplaudir é bem menor do que os produtores esperavam.

Tanto em Nova York quanto no restante do país, a audiência permanece em baixa. O número de pessoas que assistiram a espetáculos da Broadway durante a temporada que terminou recentemente, por exemplo, é menos da metade do que foi registrado na temporada anterior —6,7 milhões de espectadores contra 14,8 milhões antes da pandemia.

O Metropolitan Opera viu seu número de espectadores pagos cair para 61% da capacidade da casa, contra 75% antes da Covid-19.

Público no Gershwin Theatre, em Manhattan, em setembro de 2021, durante espetáculo de reabertura da Broadway
Público no Gershwin Theatre, em Manhattan, em setembro de 2021, durante espetáculo de reabertura da Broadway - Jeenah Moon/The New York Times

"A força magnética que os sofás exercem sobre as pessoas é muito maior do que eu imaginava", disse Jeremy Blocker, diretor administrativo do New York Theatre Workshop.

"As pessoas se acostumaram a não sair de casa, e nós vamos ter dificuldades com isso por alguns anos", afirma Blocker.

Muitos produtores preveem que a queda nas bilheterias se estenderá até a próxima temporada, e talvez mais além. E alguns temem que o vírus tenha servido para acelerar tendências de longo prazo que perturbam as organizações artísticas há anos, como a queda de venda de ingressos para eventos de música clássica e o declínio do modelo de assinaturas para as temporadas de muitas organizações artísticas.

Para alguns profissionais do setor, parte do público ainda se sente apreensiva quanto à possibilidade de contrair o coronavírus. "Há bolsões consideráveis de pessoas que continuam a encarar com cautela as visitas a espaços públicos", disse Oskar Eustis, diretor artístico do Public Theater de Nova York.

No entanto, há exceções. Algumas remontagens na Broadway conseguiram atrair grandes audiências, entre as quais a comédia conjugal "Plaza Suite", de Neil Simon, que ofereceu aos fãs a oportunidade de ver o casal Sarah Jessica Parker e Matthew Broderick contracenando no palco.


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O setor dos shows musicais, que atrai espectadores mais jovens do que setores das artes cênicas, vem sendo um destaque. A Live Nation, uma das gigantes internacionais na produção de shows de música pop, anunciou que, em seu mais recente ano fiscal, vendeu 100 milhões de ingressos, mais do que em 2019.

Os sucessos ocasionais e os shows lotados, porém, podem desviar a atenção da realidade que, para a maioria das instituições e espetáculos clássicos e teatrais, o comparecimento está em baixa e o número de produções em cartaz caiu.

O otimismo inicial sobre o fim da paralisação foi prejudicado pelas novas variantes do vírus, que levaram a cancelamentos de apresentações e ausências de artistas.

"Estávamos otimistas na metade do ano passado, quando a vacina apareceu pela primeira vez, e todo mundo sentiu que aquilo era ótimo e que era hora de voltar com tudo", disse Adam Siegel, diretor-executivo do Lincoln Center Theater, organização sem fins lucrativos de Nova York.

"Artisticamente, o ano foi excelente", disse Barry Grove, produtor executivo do Manhattan Theatre Club, observando que os três espetáculos que a organização encenou na Broadway tiveram grande sucesso entre os críticos. "Financeiramente, a história é outra. Apesar de todo o sucesso artístico, as vendas tanto de assinaturas quanto de ingressos individuais caíram em quase um terço."

"Há menos turistas, menos pessoas mais velhas e muito poucos grupos, e a outra coisa que não pode ser subestimada é que as pessoas continuam a trabalhar remotamente", diz Sue Frost, uma das produtoras de "Come From Away", musical sobre os atentados do 11 de setembro de 2001, que estreou em 11 de setembro de 2017. "Não sei quando isso vai mudar."

"Eu estaria mentindo se dissesse que estou feliz", afirma Brian Kelsey, diretor executivo do Peninsula Players Theatre, no condado de Door, Wisconsin —destino popular de turismo no centro-oeste dos Estados Unidos. "Não sei se as pessoas perderam o hábito de ir ao teatro, não sabem que os espetáculos estão de volta ou se a clientela que a cidade recebe agora só se interessa pelos jardins ao ar livre."

O estrago financeiro é real, mas até agora muitas organizações, tanto comerciais quanto sem fins lucrativos, receberam ajuda financeira significativa, tanto do governo federal quanto de doadores, que provavelmente se beneficiaram da alta do mercado financeiro na época. Mas agora o dinheiro federal acabou, Wall Street está passando por oscilações, a inflação é alta e há instabilidade política interna e externa.


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E agora? O que espera o mercado cultural americano? Profissionais do setor dizem que estão aprendendo a conviver com a incerteza. O risco de novas variantes da doença parece ser menor do que no início da pandemia, mas o perigo de interrupção dos negócios continua alto, pois contágios continuam a provocar cancelamentos. E não está claro quando o público vai voltar de vez aos eventos.

"Não tenho ilusão de que basta estalar os dedos e as coisas se resolverão", diz Siegel, do Lincoln Center Theater. Grove, do Manhattan Theatre Club, concorda. "Estou confiante em que o público voltará", afirma. "Mas parei de fingir que sou um profeta capaz de adivinhar quando."

Tradução de Paulo Migliacci

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