Avanço no ensino da matemática demanda conteúdo com sentido prático

Melhora nos indicadores da educação básica dependem de currículos consistentes e formação continuada de professores

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Luciana Alvarez
Lisboa

De cada 100 estudantes que concluíram o ensino básico na rede pública em 2019, só 5 aprenderam o que deveriam sobre matemática, de acordo com um estudo de 2021 feito pelo Iede (Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional) com base nos resultados do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica).

Para mudar esse cenário, precisam entrar na equação uma melhor formação dos professores, um maior contato das crianças com o tema e abordagens que tragam sentido prático aos conteúdos.

A diretora-executiva do Instituto Reúna, Kátia Smole, afirma que a capacidade do cérebro humano de aprender línguas e matemática é inata. "Temos que acabar com a crença de que algumas pessoas são incapazes."

Professor explica operação de matemática a aluno do segundo ano da Emef Pedro Aleixo, na zona leste de São Paulo
Professor explica operação de matemática a aluno do segundo ano da EMEF Pedro Aleixo, na zona leste de São Paulo - Lalo de Almeida - 29.nov.18/Folhapress

Entretanto, para que o cérebro absorva o aprendizado, os humanos precisam ser expostos aos conhecimentos de forma adequada. Ter mais crianças nas creches e pré-escolas seria um bom primeiro passo.

"Na educação infantil, existe uma intencionalidade no tipo de brinquedo que oferecem, na forma como o parque está estruturado. A criança vai explorando a matemática pelas relações espaciais."

Mas ainda faltam profissionais bem formados para intermediar esse contato. Segundo Edda Curi, à frente do programa do ensino de ciências da Universidade Cruzeiro do Sul, muitas professoras de anos iniciais tiveram problemas com a matéria quando crianças e, por isso, procuram ensinar menos do que deveriam para tentar evitar traumas.

A partir das ementas disciplinares, Curi faz levantamentos sobre como a matemática está presente nos cursos de pedagogia. "Em geral, é uma disciplina só, com poucas horas, e desatualizada."

Também demandam melhorias as licenciaturas, que formam os responsáveis pela disciplina a partir do quinto ano, e a formação continuada.

"O professor precisa se atualizar, trazer a matemática de uma forma que dialogue com o dia a dia do estudante", diz Jaqueline Mesquita, presidente da SBM (Sociedade Brasileira de Matemática).

Ela lembra que o Brasil tem matemáticos de ponta —como Artur Avila, vencedor da medalha Fields, considerada o Nobel da matemática— e defende que todos tenham oportunidade de aprender. "É preciso chegar até as escolas mais afastadas."

Para Nina da Hora, cientista da computação e diretora do Instituto da Hora, as aulas precisam considerar contextos sociais e culturais para garantir inclusão. "Deveríamos sair dessa prisão da cosmologia eurocêntrica do ensino da matemática."

No livro "African Mathematics" (matemática africana), o autor Abdul Karim Bangura descreve como os avanços matemáticos fora da Europa têm sido ignorados e distorcidos. Foram os árabes, por exemplo, que revolucionaram a álgebra por volta dos anos 800 d.C..

Artur Avila, matemático brasileiro que em 2014 ganhou a medalha Fields, considerada o Nobel da matemática, na Flip (Feira Literária de Paraty) de 2015
Artur Avila, matemático brasileiro que em 2014 ganhou a medalha Fields, considerada o Nobel da matemática, em mesa da Flip (Feira Literária de Paraty), em 2015 - Zanone Fraissat - 4.jul.15/Folhapress

A cientista defende ainda que aprender bem diz respeito ao desenvolvimento pessoal e não apenas ir bem em provas e ter um bom emprego no futuro.

Para a gerente de desenvolvimento e soluções do Itaú Social, Sonia Dias, as melhorias dependem de, entre outros fatores, tornar as carreiras de ensino mais atrativas.

"Há menos formados em matemática do que o necessário, e muitas vezes os formados encontram melhores salários em outras profissões que não o magistério."

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