Descrição de chapéu Financial Times mercado de trabalho

Empresas adotam práticas para bem-estar de olho no pós-pandemia

Covid reordenou maneira pela qual empregadores respondem às questões de saúde de seus empregados

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Andrew Jack
Financial Times

A cada semana os empregados da Fujitsu reservam uma hora em suas agendas para uma atividade não relacionada ao trabalho, que eles podem escolher livremente. Reservam períodos para "tempo de foco protegido", nos quais não devem ser perturbados, e comprimem as reuniões online essenciais restantes em blocos de 25 e de 45 minutos, para garantir que tenham intervalos entre elas.

"São coisas realmente simples que renderam um feedback muito positivo", disse Kelly Metcalf, vice-presidente de diversidade, inclusão e bem-estar na divisão norte-europeia do grupo japonês de tecnologia. "Uma das grandes queixas entre nossos trabalhadores remotos era a fadiga por reuniões virtuais constantes. Eles estavam saturados de olhar para telas o dia inteiro".

Mulher usa um laptop que está em cima de uma mesa; ela sorri e segura um copo de café com uma das mãos
Empregadores adotam o bem-estar no lugar de trabalho - Credit Deagreez/Adobe Stock

As medidas estão entre as diversas que essa empresa –e diversos empregadores de todo o planeta– estão testando em seu ajuste a um mundo pós-pandemia caraterizado por trabalho mais flexível, híbrido e remoto, com um foco maior no bem-estar dos empregados integrado às suas operações.

O bem-estar no local de trabalho muitas vezes foi tratado como um benefício incidental, com intervenções individuais para encorajar mais atividade física e alimentação saudável, por exemplo o fornecimento de frutas no refeitório, sessões que ajudem trabalhadores a deixar de fumar ou subsídios para que eles frequentem academias de ginástica.

Mas existe uma discussão crescente sobre a necessidade de abordagens mais extensas para lidar com o bem-estar mental, e que também vão mais fundo e tratem das causas subjacentes do estresse no local de trabalho, enraizado na maneira pela qual as organizações são gerenciadas.

Uma razão é o avanço das pesquisas sobre os vínculos entre saúde física, saúde mental e produtividade. O exercício físico pode reforçar o bem-estar mental, por exemplo, enquanto sintomas físicos como dores nas costas podem ser indicadores de preocupações de saúde mental subjacentes.

Christian van Stolk, vice-presidente executivo do instituto independente de pesquisa Rand Europe, aponta para diversos estudos, entre os quais um sobre os locais de trabalho mais saudáveis do Reino Unido, patrocinado pelo jornal Financial Times, que demonstram que problemas de saúde física e mental dos trabalhadores estão associados a quedas de desempenho, medidas por fatores que incluem o absenteísmo e também o "presentismo", um termo que significa que os trabalhadores estão presentes mas seu desempenho é inferior ao esperado.

"Existe um vínculo particularmente forte entre o bem-estar e a quantidade e qualidade de sono", diz. Stolk também aponta para as crescentes preocupações sobre o desgaste financeiro adicional causado pela alta no custo de vida e pela baixa remuneração dos trabalhadores.

A Covid-19 deflagrou um reordenamento na maneira pela qual os empregadores operam e respondem às questões de saúde de seus empregados. Metcalf argumenta que a pandemia foi um catalisador na Fujitsu, para uma mudança de foco rumo a uma abordagem mais holística. "Não havia opção exceto abraçar o bem-estar dos trabalhadores. Não teríamos conseguido sustentar a produtividade e continuado a produzir resultados de outra maneira".

Ela também aponta para fatores mais amplos que levaram os empregadores a tratar desse tipo de questão: a força do mercado de trabalho atual, em muitos países, significa que os executivos precisam encontrar maneiras de tornar os locais de trabalho mais atraentes a fim de recrutar e reter trabalhadores mais jovens.

A professora Carol Black, médica e consultora do governo britânico sobre trabalho e saúde, menciona preocupações paralelas sobre a grande onda de demissões voluntárias de trabalhadores mais velhos e experientes que estão optando por deixar seus empregos, gerando novas reflexões sobre o que fazer para retê-los.

"A saúde e o bem-estar realmente subiram de posição nas agendas do governo e da indústria", disse.

Mas mesmo que exista demanda reforçada por programas de apoio ao bem-estar dos trabalhadores, e não haja escassez de consultores e serviços que ajudem a atendê-la, as provas quanto ao que realmente funciona são muito mais escassas. "Há muita coisa por aí que não é de boa qualidade, com esse ou aquele app oferecendo bem-estar", disse Metcalf.

Cary Cooper, professor de psicologia organizacional na Universidade de Manchester, diz que estudos rigorosos são raros. Pode ser difícil definir, implementar e medir intervenções padronizadas, já que tanto os acadêmicos quanto as empresas relutam em investir o tempo e o dinheiro requeridos.

"Os pesquisadores organizacionais sentem que não é difícil conseguir publicação de seus trabalhos sobre esse tema, e os empregadores não querem perder tempo fazendo essas coisas", disse.

As pesquisas de Cooper, lastreadas por discussões com o Fórum Nacional de Saúde e Bem-Estar no Trabalho do Reino Unido, uma rede de executivos seniores britânicos que ele supervisiona, apontam para a necessidade de lidar com as razões estruturais subjacentes do estresse dos trabalhadores, frequentemente enraizadas em práticas de gestão precárias.

Ele argumenta que reduzir o estresse no local de trabalho e melhorar a produtividade estão ligados a fatores que incluem a autonomia e o senso de propósito entre os trabalhadores, e à empatia dos gestores.

"Tudo depende do gestor imediatamente responsável –do piso da fábrica ao andar da presidência", diz. "Esses gestores precisam ter capacidades interpessoais, sociais e de empatia. Mas hoje as pessoas são promovidas com base em seu conhecimento técnico especializado. No mundo para o qual estamos avançando, é preciso que exista paridade entre as competências pessoais e as competências técnicas, para os gestores".

Kevin Daniels, que dirige o What Works Centre for Wellbeing, aponta para provas que indicam que os melhores empregadores promovem treinamento regular de seus gestores seniores, e adotam práticas de trabalho flexíveis e consultas frequentes aos trabalhadores sobre tudo, do layout do escritório ao design dos cargos. Para que seja efetiva, qualquer intervenção específica precisa evoluir ao longo do tempo, em resposta ao feedback.

David Roomes, vice-presidente de saúde do fabricante britânico de turbinas Rolls-Royce, argumenta que programas bem-sucedidos requerem discussão descentralizada e envolvimento dos trabalhadores.

"Há uma tonelada de fornecedores no mercado vendendo toda sorte de intervenção, de massagens nos pés a almofadas e pufes e mesas de pebolim. Tudo isso parece bacana na brochura de venda, e talvez faça com que as pessoas se sintam bem, mas é preciso garantir que tenhamos uma base firme de provas", disse.

Desde 2015, ele supervisiona o programa "viva bem", que requer que todos os locais de trabalho da companhia em todo o mundo mantenham um comitê de bem-estar. As equipes são instruídas a reportar sobre o que fazem e a atingir um padrão mínimo, mas as abordagens específicas que elas adotam são delegadas a elas.

Embora seja difícil provar uma relação causa-efeito, ele diz que as divisões que apresentam melhor desempenho em termos de bem-estar também são aquelas em que há menos preocupações de segurança e um engajamento maior da equipe.

A Rolls-Royce combina essa abordagem descentralizada ao treinamento de gestores, a esforços de engajamento promovidos por embaixadores de marca e a seminários periódicos com líderes seniores, entre os quais o presidente-executivo, para estabelecer um exemplo vindo de cima.

"Se os chefes têm expectativas de que as pessoas trabalhem 24 horas por dia, sete dias por semana, isso afeta a organização. Se você é visto como sucesso ao exibir certos traços invencíveis, então é esse o modelo que as pessoas seguem", disse.

"Estamos destruindo o mito de que a produtividade só vai surgir se as pessoas forem sempre pressionadas. Queremos observar a pessoa como um todo e refletir muito mais sobre a maneira pela lideramos e gerimos, a fim de obter melhores resultados", acrescenta Roomes. "Gastamos dezenas de milhões de libras por ano com nossa fabricas e ativos físicos, e todo mundo diz que as pessoas são um de nossos principais ativos, mas o investimento que fazemos nisso é modesto, em comparação".

tradução de Paulo Migliacci

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