Patrimônio mundial no país sofre com falta de público e de gestão

Prefeituras pedem criação de política nacional para cuidar dos 21 locais que têm chancela da Unesco

Rua de pedra em cidade histórica, com carros e igreja ao fundo
Rua no centro histórico de Goiás (GO), antiga capital do estado e patrimônio cultural da humanidade - Ana Luiza Tieghi/Folhapress
Goiás (GO)

O Brasil tem 14 patrimônios culturais e sete naturais definidos pela Unesco e se compromete a preservá-los, mas nem sempre é assim.

"O principal problema é a falta de políticas públicas que garantam infraestrutura adequada, o que afeta o patrimônio", afirma Andrey Schlee, diretor do departamento de patrimônio material e fiscalização do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional).

O resultado são centros históricos abandonados, sem turistas, com construções caindo aos pedaços, acúmulo de lixo e insegurança. 

O centro de São Luís (MA) é um exemplo disso. Patrimônio cultural desde 1997, sofre com a degradação. O Iphan está financiando obras no local. "Se a cidade é boa para o cidadão, vai ser boa para qualquer visitante", afirma Schlee.

Para mostrar exemplos de preservação e apontar soluções para a falta de recursos, o Iphan realizou um seminário sobre gestão de sítios culturais do patrimônio, entre 13 e 15 de agosto, em Goiás (GO)

"O compromisso com a Unesco nos diferencia no lado da despesa, então queremos ser tratados de forma diferente na hora de acessar as fontes de recurso", disse no evento Marcos Santana, prefeito de São Cristóvão (SE), uma das 13 cidades brasileiras com patrimônios culturais.

Cuidar do patrimônio e dar condições para que as pessoas o visitem é obrigação do país. Ao receber o título, o estado se compromete a proteger o bem. Se não fizer isso, o local vai para um lista de risco e pode perder a designação. 

Uma das formas de conseguir recursos é o PAC Cidades Históricas, que desde 2013 investiu R$ 651 milhões em projetos de melhorias e fez obras em 23 municípios.

A cidade de Goiás foi a primeira a entregar todas as obras previstas, em março.

Robson de Almeida, diretor do departamento de projetos especiais do Iphan, que coordena o programa, afirma que o próximo passo do PAC é investir em melhorias no entorno da área histórica. 

"Queremos reformar as calçadas, embutir fiação e investir em saneamento básico, que muitas cidades históricas não têm", afirma.

O objetivo vai ao encontro da própria ideia de patrimônio, que mudou desde os anos 1970, quando a Unesco começou a dar os títulos. 

Antigamente os patrimônios eram vistos de forma isolada. Hoje já se reconhece que, quando um monumento recebe o título de patrimônio mundial, também é preciso se preocupar com o seu entorno.

Manter a região histórica intocada, sem viabilizar comércios e moradias, expulsa moradores e atrapalha sua preservação. "Isso acontece em São Luís, Salvador e até em Ouro Preto. O centro perde a sua vitalidade", afirma Schlee.

Para combater esse fenômeno, ele aconselha que seja incentivado o desenvolvimento econômico da região, aliado ao diálogo com o Iphan e com a sociedade.

Concorrer a patrimônio mundial pode exigir que algumas obras sejam feitas.

Em Belo Horizonte, a preparação do Conjunto Moderno da Pampulha, nomeado patrimônio em 2016, incluiu a restauração da Casa de Baile, do Museu Casa Kubitscheck e de jardins de Burle Marx. Houve ainda limpeza da lagoa e investimento na rede de esgoto. 

Segundo a secretaria de cultura da cidade, a visitação na Pampulha aumentou até 50% após a nomeação de patrimônio. Em 2017, mais de 191,3 mil pessoas conheceram o local.

Para conseguir o título de patrimônio cultural para o Sítio Arqueológico Cais do Valongo, em 2017, a Prefeitura do Rio de Janeiro se comprometeu a fazer melhorias no local, que deve se tornar um museu a céu aberto até 2020. 

O cais era porta de entrada de escravos africanos: estima-se que 900 mil chegaram à América do Sul por ali.

A necessidade de investir nos patrimônios mundiais foi ressaltada em uma carta assinada, no evento do Iphan, pelos prefeitos das 13 cidades que têm locais com o título. 

O documento será entregue aos candidatos a presidente e servirá para a formulação de uma política nacional de gestão turística do patrimônio, feita pelos ministérios de Turismo, Meio Ambiente e Cultura, que deve ser enviada ao Congresso em novembro.

Trata-se de uma resposta ao Tribunal de Contas da União, que constatou em 2017 a falta de eficácia das medidas para cuidar do patrimônio.

A jornalista viajou a convite do Iphan e da Prefeitura de Goiás

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