Descrição de chapéu indígenas

Povo paiter suruí recebe investimento para criação da primeira agência de turismo indígena do Brasil

Projeto usa contrapartidas da Zona Franca de Manaus para impulsionar o etnoturismo e a bioeconomia amazônica

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São Paulo

No ano em que o turismo mundial pretende superar os níveis pré-pandêmicos, o Brasil ganhará a sua primeira agência de turismo criada e mantida por povos originários na Amazônia.

O projeto, que sairá do papel ao longo deste ano, pretende ampliar a estrutura, aumentar e capacitar a equipe e implementar uma experiência virtual de visitação ao Yabnaby, o espaço turístico mantido pelo povo paiter suruí na Terra Indígena Sete de Setembro, próximo a Cacoal, a 480 km de Porto Velho, em Rondônia.

Bangalocas do Complexo Turístico Paiter Suruí, que fica próximo à Cacoal, a 480 km de Porto Velho (RO)
Bangalocas do Complexo Turístico Paiter Suruí, que fica próximo à Cacoal, a 480 km de Porto Velho (RO) - Divulgação

Inaugurado no ano passado como parte de um plano de gestão de 50 anos do território suruí, o Yabnab tem uma recepção e duas "bangalocas" (misto de bangalô e oca) que podem receber até 5 pessoas cada, simultaneamente.

O pacote de hospedagem inclui alimentação tradicional local, banho de rio, dança, contação de histórias, passeios de barco, trilhas na floresta e vivência com as atividades produtivas já estabelecidas na região, como a plantação de café, de cacau e a extração de óleos e outros produtos que são vendidos às indústrias de cosméticos.

Celebridades como o apresentador Luciano Huck e o cantor Xamã já se hospedaram por lá mas, durante boa parte do ano, o espaço fica ocioso —principalmente por causa da distância dos centros urbanos, dos preços do transporte aéreo até lá e das dificuldades em promover o local como um destino turístico. Mas, recentemente, o espaço recebeu um investimento de R$ 522 mil que promete transformar essa realidade, levando cada vez mais turistas ao coração da floresta.

O aporte veio do Programa Prioritário de Bioeconomia (PPBio), política pública federal que repassa para startups recursos que as indústrias da Zona Franca de Manaus são obrigadas a investir como contrapartida dos incentivos fiscais. Com ele, os paiter suruí pretendem ampliar as bangalocas, capacitar 30 jovens indígenas em hotelaria, empreendedorismo e gestão e criar ferramentas e estratégias digitais para promover o Yabnaby.

Hoje, por exemplo, quem deseja visitar o espaço precisa entrar em contato pelo Instagram ou WhatsApp; no futuro, entretanto, um site próprio concentrará todas as reservas, além de mostrar detalhes sobre como é se hospedar em uma terra indígena. Para aqueles que não têm condições de viajar até o interior de Rondônia, o programa também criará uma experiência virtual de visitação —como um aperitivo da experiência real de interação com as atividades econômicas e o modo de vida local.

"O turismo em terras indígenas é algo novo para o turismo e também para o nosso povo, que está entendendo que essa é uma maneira de gerar emprego e renda sustentável não só para os indígenas, mas para toda a região", explica Almir Suruí, líder do povo paiter suruí e premiado internacionalmente pela sua luta em favor da floresta e dos povos que nela vivem —que, no entendimento deles, são uma coisa só.

O cacique lembra que, nos anos 1980, seu próprio povo se envolveu com a retirada ilegal de madeira da floresta. Mas, em 1994, ao perceber a insustentabilidade daquela atividade, seu pai, então cacique, decidiu dar um basta. Não por decreto, mas com um plano estratégico de gestão do território para os próximos 50 anos, desenvolvido coletivamente com mais de 2.000 pessoas e finalizado em 2000. O documento se tornou referência mundial para o desenvolvimento sustentável e, entre os seus 12 eixos de ação, estava o turismo.

O líder indígena Almir Suruí
O líder indígena Almir Suruí - Divulgação

O primeiro investimento para começar a desenvolver o turismo na Terra Indígena Sete de Setembro, de R$ 490 mil, só veio em 2019, por meio de projetos de fomento ligados ao Fundo Amazônia. O dinheiro foi usado para estruturar o espaço turístico, incluindo a construção das bangalocas. Agora, com o novo investimento do PPBio, a ideia é impulsionar o Yabnaby —que poderá, inclusive, transmitir os conhecimentos adquiridos nesse processo a outros povos e aldeias, ampliando o impacto do programa.

"As comunidades tradicionais ficam à mercê das alterações da natureza e por isso precisam de maior diversificação na geração de renda para ter estabilidade financeira", explica Paulo Simonetti, líder de captação e relacionamento com o investidor do PPBio. "Além de gerar emprego, o turismo cria consciência ambiental e uma conexão maior com aquele território, que passa a ser visto para além de uma fonte de matéria-prima. Quem visita passa a ter uma relação mais social com o local, a entender a complexidade dos povos ali dentro."

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