Turismo no sertão de Pernambuco une vinícolas, natureza e tradição

Passeios envolvem até degustação de manga, além de visita a igrejas, rapel e contato com artesãos

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Sertão pernambucano

O sertão nordestino, para além do estigma da pobreza, revela grandes atrativos. Cidades investem no turismo com natureza, áreas históricas e gastronomia singular, com visitas a vinícolas, degustação de manga, igrejas típicas e contato com artesãos.

Em Pernambuco, onde o maior território é o sertão, há atrações rurais e de aventura. O Ribeirinhos do Velho Chico é um roteiro traçado para impulsionar o setor. "São pacotes extremamente ricos de vivências com a própria comunidade, experimentação dos sabores e banho no São Francisco", diz a consultora de turismo Maria Izabel Bezerra, 46.

Mulher com camisa branca e saia estampada em frente a casa de madeira e barro com placa museu
Museu comunitário construído pelos moradores do Quilombo de Santana, em Cabrobó (PE) - Adriano Alves/Folhapress

Santa Maria da Boa Vista, que cresceu ao redor da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, tem nas tradições seus principais atrativos. É conhecida pela Serenata da Recordação, que toma as ruas da cidade todo julho, e tem a maior concentração de reisados tombados do estado.

Para aventureiros, o paredão de pedra do Monte Carmelo é ideal para rapel, com vista privilegiada do rio São Francisco. E, nas águas, há passeios de caiaque.

A região tem dezenas de ilhas. Belém do São Francisco, que já foi cenário de novela, soma 88. Na cidade, todas as ruas levam ao rio. O passeio passa por chalés estilo colonial e calçadas com pedras tiradas do rio.

A cidade é berço dos bonecos gigantes, onde surge o primeiro do Carnaval do estado, em 1919. No Memorial de Zé Pereira e Vitalina, é possível conhecer a história. Diferente dos famosos de Olinda, os bonecos do sertão são inspirados em figuras e lendas locais.

"É um turismo de experiência. Estamos nos preparando para permitir que o turista possa mexer no papel machê e fazer máscaras", diz o diretor Antony Dunes, 42.

Na cidade, também há locais de mistérios, como a casa assombrada do Capitão Alves, onde dizem que ninguém consegue morar por causa do arrastar de correntes. E na Igreja de Nossa Senhora do Patrocínio, há um cadáver de mulher em processo de mumificação que foi encontrado enterrado em pé na parede.

Outro atrativo de Belém do São Francisco é o turismo rural. Na rota da manga, visita-se a maior produtora de manga do Brasil, onde se vê o manuseio da fruta que sai do sertão e chega a mais de 11 países.

O passeio custa R$ 40 por pessoa e inclui a visita com degustação debaixo da sombra de uma mangueira. A experiência se complementa com um passeio de balsa que leva para a roda d’água, instrumento histórico da irrigação.

O arrecadado é destinado à escola que a empresa mantém para atender crianças do município. O roteiro também passa pela instituição, que oferece estrutura diferenciada de ensino.

Comunidade do Quilombo Santana, em Cabrobó (PE)
Comunidade do Quilombo Santana, em Cabrobó (PE) - Adriano Alves/Folhapress

"A gente tem que ter lucro com a manga, mas o turismo vai ser útil para a região se desenvolver e também ajudar a escola. Então, é um turismo social", afirma Paulo Dantas, 67, diretor-presidente da Agrodan.

Já em Orocó, o turismo rural tem uma rota com vaqueiros. O encontro com a figura que virou símbolo da região é feito ao fim de tarde, ao redor de uma fogueira e ao som dos aboios.

No balneário Estação do Sol, se passeia sobre pedras que eram submersas pelo rio antes da construção da barragem de Sobradinho, na Bahia. O espaço serve a gastronomia local. Um baião de dois e peixe frito para quatro pessoas sai por R$ 80.

Pegando um barco, ainda é possível visitar a Ilha de São Félix. A comunidade, também dos trukás, tem tradição de reisado e preserva uma igreja construída com pedras tiradas do rio em 1672.

Os amantes de vinho podem aproveitar a viagem para conhecer uma das vinícolas do Vale do São Francisco. Em Lagoa Grande, está a Garziera, que produz 20 milhões de litros de vinho e 200 milhões de sucos ao ano.

Ex-votos deixados em igreja da Ilha do Pontal, em Lagoa Grande (PE)
Ex-votos deixados em igreja da Ilha do Pontal, em Lagoa Grande (PE) - Adriano Alves/Folhapress

Um pacote simples de visita e degustação custa R$ 45. Há também um mais completo, de R$ 120, onde se conhece toda a produção, além da degustação e almoço incluso.

"Como é uma região que se produz todo o ano, dá para conhecer todas as fases da videira em um só dia", diz o guia Edvaldo Barbosa, 40.

Na fazenda, é possível fazer compras com preços abaixo do mercado. Vinhos de R$ 12 a R$ 20, espumantes de R$ 28 a R$ 32, frisantes de R$ 20 a R$ 24 e, uma novidade, o chope de vinho por R$ 11.

Na mesma cidade, há a Ilha do Pontal, área de reforma agrária. A comunidade de agricultores familiares oferece turismo rural com pesque e pague, colha e pague, casa de farinha e banho de rio.

Para o presidente da associação da comunidade Regivaldo Araújo Siqueira, 51, o turismo "cria outras possibilidades econômicas para a comunidade, que vem de 33 anos de luta".

Transformações já começam a aparecer na vizinhança. José Inácio de Oliveira, 76, conhecido como Zé do Pife, resgatou sua banda de pífanos que estava há 15 anos silenciada. O grupo, que reúne amigos e seu irmão mais novo, mantém a tradição familiar.

Igreja na Ilha do Pontal, em Lagoa Grande (PE)
Igreja na Ilha do Pontal, em Lagoa Grande (PE) - Adriano Alves/Folhapress

"Eu estou deixando [de tocar] porque já estou ficando velho e aí acaba o fogo, mas vou gravar, porque morre o homem e fica o nome".

Em Cabrobó, comunidades tradicionais permitem uma imersão ancestral. No Quilombo de Santana, o visitante participa de oficina de artesanato com fibra de caroá e assiste à dança típica da mazurca.

No memorial da comunidade, construído pelos próprios moradores, há artefatos tradicionais. "A gente fez o museu de taipa porque vai chegar o tempo das crianças não saberem o que são essas coisas", diz a líder comunitária Luzimar Maria de Andrade, 53.

Uma trilha de 2,5 km, no território quilombola, leva a um olho d’água. No caminho, o guia fala da importância da água para a região e apresenta plantas medicinais.

No mesmo município, a Ilha de Assunção é território indígena dos trukás. Logo após a descida da ponte que liga à cidade, há um centro de artesanato comandado por José Alfredo Carinhanha, 64, onde é possível encontrar colares, brincos e chocalhos.

Carinhanha, juremeiro da tribo, conta que produz artesanatos desde criança e planta as sementes que usa. "Eu pego meu cachimbo, jogo a fumaça pro ar. Meu cachimbo é um ‘cegueiro’ pra quem me deseja o mal", cantarola.

O repórter viajou a convite do Sebrae Pernambuco e Conrio (Consórcio Intermunicipal do Vale do São Francisco).

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