Negociadores mantêm divergências, e COP27 se estende pelo fim de semana

Estados Unidos e União Europeia resistem a propostas de financiamento

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Sharm el-Sheikh (Egito)

Reunidos há duas semanas, os representantes dos 196 países signatários do Acordo de Paris chegam ao final da COP27 do Clima –apelidada de COP da implementação–, longe de qualquer consenso sobre como colocar em prática o acordo climático.

A conferência, que deveria se encerrar nesta sexta (18), já tem reuniões previstas para o sábado e pode chegar ao final apenas no domingo (20). Esse atraso não foi necessário nem quando os países brigavam pelas linhas que definiriam o Acordo de Paris, assinado numa noite de sábado, em 2015.

Jovem negra ergue cartaz com escrito 'payment overdue' em meio a outras pessoas
Nakeeyat Dramani Sam, ativista de Gana, segura cartaz dizendo "pagamento atrasado" (em inglês), em referência à falta de financiamento climático, na COP27, no Egito, nesta sexta (18) - Mohamed Abd El Ghany/Reuters

As nações mantêm divergências em 13 textos, mas já conseguiram consenso em 16 temas –todos de ordem técnica, como adoção de métricas comuns para reporte, inventários e mecanismos tecnológicos.

O nó central para a implementação do acordo climático, no entanto, continua sendo o buraco no financiamento das ações climáticas.

Os países ricos, cobrados por conta de suas emissões históricas de gases causadores do aquecimento global, já não vinham cumprindo a promessa feita em 2009 de arrecadar US$ 100 bilhões para o Fundo Verde do Clima. Agora a retórica passou a acompanhar a inação.

Neste ano, os líderes dos países desenvolvidos passaram a falar nos palcos (não só nos corredores) que não há dinheiro para financiar ações de adaptação climática e de reparação por perdas e danos nos países em desenvolvimento.

Com isso, o bloco desenvolvido busca negociar um outro fluxo de financiamento climático para evitar que o destino da ajuda financeira seja justamente um competidor econômico de grande porte: a China.

Negociadores de países ricos afirmam não ter justificativas para seus contribuintes sobre o envio de dinheiro para fundos multilaterais que terminam financiando a economia chinesa.

Os Estados Unidos e a União Europeia resistiram durante as duas semanas de negociação a qualquer proposta de financiamento. As principais falam sobre dobrar os recursos para o Fundo de Adaptação e criar um outro fundo voltado para a reparação de perdas e danos.

O bloco europeu chegou a fazer uma proposta para financiar perdas e danos nos países em desenvolvimento, mas uma condição central da oferta irritou o bloco G77 e China: o fundo seria restrito às nações mais vulneráveis ao clima, como as pequenas ilhas.

"E o que a gente diz para um país como o Paquistão?", questionou Harjeet Singh, coordenador global da CAN (sigla em inglês para Rede de Ação Climática), que reúne mais de mil organizações ambientais observadoras das negociações. Negociadores paquistaneses e de outros países do G77 endossaram as críticas.

Arrasado pelas chuvas e inundações no meio deste ano, o Paquistão é usado como exemplo na COP de que mesmo as economias de médio porte não têm preparo para responder a eventos climáticos extremos. Portanto, também precisam de acesso a fundos internacionais para se recuperar dos desastres climáticos.

Há diversos critérios que testam como um mecanismo sobre perdas e danos climáticos poderia identificar e pagar uma reparação. Mas devido à complexidade do tema, países ricos defendem que uma decisão sobre esse assunto deveria ser adiada para o próximo ano.

O bloco europeu chegou a propor um mecanismo cujo rascunho começaria a ser trabalhado agora, para ser assinado em 2024 e implementado em 2025. Para o G77, a falta de avanço no tema nesta COP27 significa quebra de confiança entre os blocos. O grupo já afirmou em salas de negociação que deve condenar o resultado da conferência caso ela adie um resultado sobre perdas e danos.

O principal texto que deve sair da COP neste fim de semana é o de decisão geral do evento, que busca abarcar todos os temas e demandas, podendo ir além das linhas específicas de negociação.

O último rascunho tem dez páginas. Ele repete a menção feita na decisão de Glasgow, no último ano, sobre a importância de limitar o aquecimento global a um teto de 1,5ºC –um pleito fundamental aos países mais vulneráveis, considerando que o texto do Acordo de Paris ainda permitia uma janela de aquecimento de até 2ºC.

Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, faz breve discurso na semana de abertura da COP27, no Egito - Mohamed Abd El Ghany - 11.nov.2022/Reuters

Países em desenvolvimento, incluindo o Brasil, veem na decisão uma tentativa de renegociar o documento assinado na França, o que poderia causar insegurança sobre outros pontos do acordo.

Há apenas dois dias, o rascunho da decisão da COP27 trazia 20 páginas com uma lista de pontos, em vez de parágrafos. O texto foi apelidado de "árvore de Natal" por negociadores, por expressar todos os pedidos de todos os países, sem um esforço de negociação por parte da presidência egípcia da conferência, que vem sendo bastante criticada por não forçar avanços nos entendimentos.

A expectativa dos negociadores para a conclusão da COP é bastante pessimista –não só sobre a possibilidade de se chegar a um consenso para deslanchar a implementação do Acordo de Paris, como também sobre a chance de se recuperar a confiança entre os blocos de países no sistema multilateral.

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.

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