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Leandro Narloch é jornalista e autor do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, entre outros.

Leis feias com nomes bonitos

Leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc escondem a velha captura do orçamento público por grupos de interesse

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"Lei Aldir Blanc de apoio à cultura": a expressão é bonita demais para discordarmos. Qual cidadão razoável, qual senador ou deputada federal em ano de eleição seria contra leis de apoio à cultura que ainda remetem a nomes ilustres da cultura brasileira?

Mas os nomes bonitos enganam. Por trás deles há leis feinhas que explicam por que o Brasil não dá certo.

Como o economista Marcos Mendes, vizinho aqui na Folha, explicou de forma impecável no livro "Por que o Brasil Cresce Pouco", vivemos desde a redemocratização um conflito entre o interesse coletivo e o de diversos grupos de pressão.

O compositor Aldir Blanc que dá nome a lei vetada pelo presidente Jair Bolsonaro - Alexandre Campbell - 25.nov.05/Folhapress

Cada grupo tenta obter do Estado algum privilégio: verbas, supersalários, penduricalhos, editais, contratos superfaturados, benefícios fiscais, proteção contra concorrentes, crédito subsidiado.

Nascem daí políticas que favorecem quem grita mais alto, mas no longo prazo prejudicam a todos. O Estado, administrado por políticos interessados em votos, precisa atender a tantas demandas de minorias organizadas que não consegue cortar gastos.

A poupança negativa do setor público e os altos impostos sugam o dinheiro que a iniciativa privada poderia usar em investimentos. O resultado é crescimento econômico baixo e prolongamento da pobreza e da desigualdade.

Diante desse nó, quem de fato se preocupa com os pobres deveria pressionar por um acordo social em defesa do corte de gastos e do crescimento da economia.

Deveria ser bastante cético a qualquer aumento de gasto público —e se esgoelar histericamente contra gastos que não beneficiam diretamente os pobres.

É o caso das leis de incentivo à cultura que o Congresso vem tentando emplacar.

Vetada pelo presidente, a lei Aldir Blanc obrigaria a União a repassar R$ 3 bilhões por ano a estados e municípios, que teoricamente investiriam o dinheiro em editais, cursos, espaços culturais, produções artísticas e mais uma coisa com nome lindo: "programas de democratização do acesso à cultura".

Com tantas denúncias de corrupção em repasses da educação e da cultura, por que alguém decidiria tirar ainda mais dinheiro do setor produtivo para transferi-lo a políticos que escolheriam como repassá-lo a artistas e produtores?

É preciso uma boa dose de ingenuidade para acreditar que os bilhões de reais previstos na lei não acabariam no bolso de artistas de classe média e alta. Ou em maracutais de políticos locais —como bravamente denunciou o vereador Fernando Holiday nesta semana.

Mesmo concordando com a tese bastante duvidosa de que o Brasil será um país melhor se tiver mais filmes pernambucanos ou shows de rock paranaense, é difícil acreditar que o dinheiro da Lei Aldir Blanc beneficiaria mais a cultura artística que a cultura de politicagem.

"Lei Paulo Gustavo" e "Lei Aldir Blanc" são nomes bonitos, mas seria mais verdadeiro chamá-las de "Trigésima lei de captura do orçamento público por grupos de interesse" ou "Mais um ‘Bolsa Classe Média’ disfarçado de nobres intenções".

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