Mônica Bergamo é jornalista e colunista.
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O Cremesp (Conselho Regional de Medicina de São Paulo) afirmou ao STF (Supremo Tribunal Federal) que vai paralisar todos os expedientes instaurados na autarquia paulista para apurar eventuais desvios éticos de médicos que atuaram em casos de aborto legal.
Como revelou a coluna, o conselho mantinha, até esta semana, processos abertos contra ao menos dez médicos que realizaram o procedimento na rede pública de saúde. Os profissionais trabalham no Hospital Maternidade Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte da capital paulista, e atenderam vítimas de estupro.
A manifestação do Cremesp ocorre após intimação do ministro Alexandre de Moraes, que determinou que o conselho comprovasse que está cumprindo uma decisão cautelar proferida por ele que vetou punições a médicos por interrupções legais acima de 22 semanas de gestação.
O despacho se deu no âmbito da ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 1141, que questiona a resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina) que restringia o acesso ao procedimento.
No dia 24 de maio, o ministro suspendeu todos os processos judiciais e procedimentos administrativos e disciplinares motivados pela norma. Ele ainda proibiu a instauração de qualquer novo procedimento contra médicos baseado na norma do CFM, suspensa por ele.
Em ofício apresentado ao Supremo, o conselho paulista afirma que os processos ético-administrativos contra os profissionais do Vila Nova Cachoeirinha "ultrapassam as questões" da resolução do CFM, que "sequer existia à época dos fatos apurados".
A autarquia ainda defende que as apurações tenham continuidade para averiguar o que chama de "graves condutas éticas e criminais".
O conselho paulista já votou pela interdição cautelar de duas médicas, em um processo que pode levar à cassação definitiva de seus registros —a palavra final cabe ao CFM.
As duas profissionais puderam voltar ao trabalho após decisões liminares proferidas pela Justiça Federal, que acolheu mandados de segurança apresentados por elas.
De acordo com pessoas familiarizadas com os casos, a autarquia não divulgou ofício algum formalizando às defesas dos demais médicos que os processos estavam suspensos. Havia o entendimento, portanto, de que as sindicâncias continuavam correndo normalmente, com prazo de defesa prévia aberto.
O Cremesp afirma a Moraes que, com exceção das medidas cautelares adotadas contra as duas profissionais, nenhum dos outros casos apurados teve "qualquer avanço na tramitação processual, permanecendo paralisados até o presente momento".
Na sequência, o conselho paulista diz que, "primando pelo integral cumprimento de todas as decisões do Poder Judiciário" e "por cautela", expediu ordem para paralisar todas as apurações relacionadas ao aborto.
"Foi proferido despacho firmado por este presidente [do Cremesp, Angelo Vattimo], que será encartado em todos os expedientes relacionados, determinando à Seção de Sindicâncias, à Seção de Processos Ético-Profissionais e Procuradoria Jurídica deste Regional ciência quanto ao cumprimento da determinação de paralisação de todos os expedientes que envolvam apuração de eventuais desvios éticos em casos de aborto legal e condutas médicas concernentes a tal procedimento", diz o ofício enviado ao STF.
Como mostrou a coluna, parte das sindicâncias contra os médicos do Vila Nova Cachoeirinha foi iniciada dias antes da publicação da resolução do CFM, e outra parte, menos de uma semana depois de a norma entrar em vigor.
Apesar de utilizar os mesmos fundamentos da medida do conselho federal e de já ter admitido seu uso junto ao Supremo, o Cremesp não cita a norma nominalmente nos processos contra os médicos. Segundo profissionais do direito ouvidos pela coluna, a medida pode funcionar como uma espécie de manobra para afastar a aplicação da decisão de Moraes aos casos.
Integrantes do conselho paulista questionaram se uma das pacientes de fato tinha sido estuprada e acusaram médicas que realizaram o procedimento legal de praticar tortura, tratamento cruel, negligência, imprudência e até mesmo o assassinato de fetos.
Considerado referência na capital paulista e um dos poucos, em todo o estado de São Paulo, que interrompia gestações mais avançadas, o serviço de aborto legal no Cachoeirinha foi suspenso pela Prefeitura de São Paulo em dezembro do ano passado.
A gestão de Ricardo Nunes (MDB) afirmou, por diversas vezes, que a paralisação no Cachoeirinha seria temporária, para dar lugar à realização de "cirurgias eletivas, mutirões cirúrgicos e outros procedimentos envolvendo a saúde da mulher", mas jamais retomou o atendimento.
A versão da prefeitura diverge da apresentada pelo Cremesp, que já afirmou ao STF que sua decisão em punir médicas "influenciou na suspensão do programa aborto legal no Hospital Vila Nova Cachoeirinha".
com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH
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