Mônica Bergamo

Mônica Bergamo é jornalista e colunista.

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Conselho mantém processos contra médicos por aborto legal apesar de decisão de Moraes

OUTRO LADO: Procurado, Cremesp não respondeu; profissionais alvos de sindicâncias trabalham no Hospital Maternidade Vila Nova Cachoeirinha, na capital paulista

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Brasília

O Cremesp (Conselho Regional de Medicina de São Paulo) mantém abertos processos administrativos contra ao menos dez médicos que realizaram abortos legais na rede pública de saúde.

A iniciativa destoa de uma decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes que vetou punições aos profissionais motivadas por uma resolução do CFM (Conselho Federal de Medicina).

Bruno Santos - 28.set.2023/Folhapress
Ato pela descriminalização e pela legalização do aborto na avenida Paulista, em São Paulo - Bruno Santos/Folhapress

Os médicos trabalham no Hospital Maternidade Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte da capital paulista, e realizaram abortos legais em mulheres vítimas de estupro.

De acordo com pessoas familiarizadas com os casos, a autarquia não divulgou ofício algum formalizando às defesas dos médicos que os processos estão suspensos. Há o entendimento, portanto, de que as sindicâncias continuam correndo normalmente, com prazo de defesa prévia aberto.

O conselho paulista já votou pela interdição cautelar de duas médicas, em um processo que pode levar à cassação definitiva de seus registros —a palavra final cabe ao CFM.

As duas profissionais puderam voltar ao trabalho após decisões liminares proferidas pela Justiça Federal, que acolheu mandados de segurança apresentados por elas. O Cremesp, contudo, recorreu e apresentou recurso contra as médicas após decisão de Moraes.

Em 24 de maio, o ministro suspendeu todos os processos judiciais e procedimentos administrativos e disciplinares motivados pela norma do CFM. Ele ainda proibiu a instauração de qualquer novo procedimento contra médicos baseado na norma publicada em abril e depois suspensa por ele.

A decisão do ministro foi motivada por um pedido de ingresso, pelo próprio Cremesp, como amicus curiae (amigo da corte) na ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 1141, que questiona a norma. Na intenção de apoiar o CFM, o conselho paulista admitiu à corte que tem punido médicos a partir da resolução.

A autarquia afirmou que "a Resolução CFM nº 2.378/2024 embasou fiscalizações realizadas pelo Cremesp, que apuram as práticas realizadas". A norma, suspensa cautelarmente até decisão final do plenário do STF, vetava o procedimento de assistolia fetal em gestações superiores a 22 semanas.

Parte das sindicâncias contra os médicos do Vila Nova Cachoeirinha foi iniciada dias antes da publicação da resolução do CFM no Diário Oficial, e outra parte, menos de uma semana depois de a norma entrar em vigor.

Apesar de utilizar os mesmos fundamentos da medida do conselho federal e de admitir seu uso junto ao Supremo, o Cremesp não cita a norma nominalmente nos processos contra os médicos. Segundo profissionais do direito ouvidos pela coluna, a medida pode funcionar como uma espécie de manobra para afastar a aplicação da decisão de Moraes aos casos.

Procurado pela coluna, o Cremesp respondeu, após a publicação deste texto, que recebeu a determinação de Moraes e que já vinha cumprindo "a decisão do Pretório Excelso".

O conselho afirma ainda que "reforça o compromisso institucional e induvidoso cumprimento às decisões judiciais publicadas pelo Poder Judiciário" e que solicitou uma audiência com o ministro "para debater esta importante e gravíssima situação que ocorre no estado de São Paulo".

Segundo o Cremesp, as apurações em curso não se restringem à resolução do CFM e "extrapolam a questão do Programa Aborto Legal".

"Reiteremos o pedido de audiência ao excelentíssimo ministro para discutirmos os aspectos éticos e legais contemplados nos citados expedientes alvo da determinação", afirma a autarquia, em nota.

Os atendimentos de abortos legais analisados pelo conselho paulista são anteriores à edição da resolução. A Polícia Civil investiga a Prefeitura de São Paulo por supostamente ter acessado os prontuários das pacientes de forma ilegal e por violar o sigilo médico.

Como mostrou a coluna, o acesso dos prontuários pelo Cremesp também se deu sem o consentimento das pacientes envolvidas. Alguns desses documentos, inclusive, foram encaminhados à Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, comandada por Guilherme Derrite, e à Polícia Civil para eventuais apurações, gerando o temor de que sejam abertas investigações criminais contra as vítimas de estupro.

Integrantes do Cremesp questionaram se uma das pacientes de fato tinha sido estuprada e acusaram médicas que realizaram o procedimento legal de praticar tortura, tratamento cruel, negligência, imprudência e até mesmo o assassinato de fetos.

Considerado referência na capital paulista e um dos poucos, em todo o estado de São Paulo, que interrompia gestações mais avançadas, o serviço de aborto legal no Cachoeirinha foi suspenso pela Prefeitura de São Paulo em dezembro do ano passado.

Poucas semanas depois, meninas vítimas de estupro tiveram que viajar a outros estados para ter acesso à interrupção legal. Uma delas, de 12 anos de idade, foi para Uberlândia (MG). A outra, de 15 anos, viajou a Salvador.

Elas foram assistidas pela ONG Projeto Vivas, organização que se dedica a viabilizar o acesso à interrupção legal e foi procurada por dezenas de pacientes após a suspensão no Cachoeirinha.

Atualmente, o aborto é considerado legal no Brasil em situações de gravidez após estupro, de anencefalia e quando há risco de morte materna, não sendo estabelecido, em lei, um limite gestacional para o procedimento.

A gestão de Ricardo Nunes (MDB) afirmou, por diversas vezes, que a paralisação no Cachoeirinha seria temporária, para dar lugar à realização de "cirurgias eletivas, mutirões cirúrgicos e outros procedimentos envolvendo a saúde da mulher", mas jamais retomou o atendimento.

A versão da prefeitura diverge da apresentada pelo Cremesp, que afirmou ao STF que sua decisão em punir médicas "influenciou na suspensão do programa aborto legal no Hospital Vila Nova Cachoeirinha".


FELIZ, ALEGRE E FORTE

A primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, marcou presença na cerimônia de outorga do título de doutora honoris causa da USP (Universidade de São Paulo) à cantora Marisa Monte, que foi realizada na sede da instituição, na tarde de segunda-feira (24), em São Paulo. A cardiologista Ludhmila Hajjar, professora titular da mesma instituição e uma das maiores apoiadoras da homenagem, participou da solenidade. O reitor da universidade, Carlos Gilberto Carlotti Junior, chancelou a entrega do título.

com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH

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