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MP-SP e Defensoria vão à Justiça contra prefeitura que recolheu livros sobre mulheres cientistas

Órgãos acusam São José dos Campos (SP) de censura; Secretaria de Educação diz que medida 'não configura prejuízo pedagógico'

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O Ministério Público (MP-SP) e a Defensoria Pública de São Paulo apresentaram uma ação na Justiça contra o município de São José dos Campos (SP) por recolher livros infantojuvenis sobre mulheres cientistas de suas escolas municipais. O episódio ocorreu em junho deste ano.

Os órgãos acusam a prefeitura de praticar censura e cobram uma indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 150 mil —o equivalente a R$ 10 por cada aluno da rede.

Capa do livro 'Meninas Sonhadoras, Mulheres Cientistas', recolhido de salas de leitura em São José dos Campos - Divulgação

A medida foi tomada após dezenas de representações serem encaminhadas por professores, vereadores, munícipes e parlamentares como as deputadas federais Fernanda Melchionna (PSOL-RS) e Sâmia Bomfim (PSOL-SP), todos contrários à retirada de circulação da obra.

Escrito pela juíza Flávia Martins de Carvalho, que integra os quadros do Tribunal de Justiça de São Paulo e é juíza-ouvidora do STF (Supremo Tribunal Federal), o box de livros "Meninas Sonhadoras, Mulheres Cientistas" (editora Mostarda) traz ilustrações e versos que contam, resumidamente, a história de mulheres de destaque em diversos campos das ciências.

Os volumes foram recolhidos pela Secretaria de Educação de São José dos Campos após queixas serem feitas pelo vereador do PL Thomaz Henrique. O bolsonarista acusou a obra de "doutrinação
ideológica" e "apologia do aborto" por citar a vereadora Marielle Franco (PSOL), brutalmente assassinada em 2018, e a antropóloga Debora Diniz, reconhecida por sua atuação no campo dos direitos reprodutivos.

Para o Ministério Público e a Defensoria, porém, não foram encontrados quaisquer indícios que justificassem a retirada dos volumes. Pelo contrário: os órgãos afirmam haver "fortes evidências" de que a decisão teve viés político e foi desprovida "de qualquer preocupação estritamente técnico-educacional".

A ação cita a conclusão de uma comissão responsável por reavaliar o conteúdo da obra, instituída pela própria Secretaria de Educação. Para o colegiado, o conteúdo "não tem nenhuma conotação político-ideológica", e Marielle Franco, por exemplo, "é retratada por ser uma socióloga que contribuiu com mudanças importantes na área onde atuava".

"A justificativa de que o livro aborda 'direitos reprodutivos' é completamente descabida, uma vez que não há aprofundamento do tema, mencionado uma única vez no decorrer de toda a obra e apenas para retratar uma das bandeiras da cientista Debora Diniz", afirmam o Ministério Público e a Defensoria na ação.

A 15ª Promotoria de Justiça e a 14ª Defensoria Pública do município pedem à Justiça a determinação de que os livros sejam devolvidos às salas de leitura em até cinco dias. A ação corre na Vara da Infância e da Juventude da Comarca de São José dos Campos, vinculada ao Tribunal de Justiça de São Paulo.

"É de clareza solar que a retirada do livro 'Meninas Sonhadoras, Mulheres Cientistas' das instituições de ensino foi motivada exclusivamente por questões político-ideológicas, configurando ato de censura e afetando diretamente todas as crianças e adolescentes", afirmam.

"A decisão de suprimir o livro das salas de leitura transmite indiscutível mensagem de intolerância e de cerceamento do debate, comprometendo a função educativa da escola e minando a confiança da comunidade no sistema educacional público", completam.

Procurada pela coluna para comentar a ação, a Secretaria de Educação não respondeu até a publicação deste texto.

Ao se manifestar sobre o caso no âmbito do inquérito civil, a pasta disse que seu Departamento de Ensino Fundamental concluiu que "os livros devem ser utilizados na Educação de Jovens e Adultos".

"A ausência desses volumes nas demais faixas etárias não configura prejuízo pedagógico, na medida em que o acervo das salas de leitura já contempla outros títulos que podem ser utilizados como alternativas pedagógicas para a idade do estudante", afirmou.

O Ministério Público e a Defensoria destacam que, segundo o inquérito civil, o recolhimento foi determinado às pressas por meio de mensagem enviada via WhatsApp a todos os diretores das escolas municipais. A ordem se deu após discurso feito na Câmara Municipal pelo vereador Thomaz Henrique, em 11 de junho.

"Não há como admitir que a prefeitura, ao que se indicou, cedendo a pressões políticas, tenha removido o livro das salas de leitura escolares e ofendido gravemente o direito dos alunos, dos educadores e da comunidade escolar a uma educação livre e plural", diz a ação.

"A censura promove a exclusão de conteúdos que são essenciais para a formação cidadã e cultural, o que é inaceitável em um Estado democrático de Direito e passível, portanto, de indenização por dano moral coletivo", completa.

com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH

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