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Diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

Descrição de chapéu inflação juros

Alterar a meta fiscal não seria uma boa decisão

Mudança aumentaria a incerteza em relação a qualquer novo anúncio de política econômica

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Nas últimas semanas, os rumores sobre mudanças na meta de primário de 2024, prevista pelo arcabouço fiscal que substituiu o teto de gastos, ganharam força e começaram a influenciar negativamente os preços dos ativos domésticos.

A meta de zerar o déficit público em um ano sempre foi vista como ambiciosa, pois desde seu anúncio estava claro que seria buscada exclusivamente via aumento de arrecadação —cujo desafio é da ordem de R$ 160 bilhões. Se os analistas (ao menos os que participam da pesquisa Focus) em nenhum momento projetaram um resultado primário dentro das bandas permitidas pelo arcabouço, então por que a mudança da meta foi percebida como um fator de risco para o mercado?

O ano de 2024 marca o começo da vigência do novo arcabouço fiscal, que foi justamente concebido para ser uma restrição duradoura e proporcionar um compromisso crível com a disciplina orçamentária. Ainda que o que torna a nossa dívida sustentável a médio prazo seja o controle do crescimento do gasto público, não o aumento de arrecadação, abrir mão da meta de resultado primário sem antes tentar buscar o aumento de arrecadação a todo custo ou sem demonstrar disposição de controlar despesas via algum contingenciamento enfraquece a credibilidade da regra fiscal.

Ainda assim, alguns analistas entendem que, com a volta de mecanismos de indexação do gasto (Saúde e Educação) e com a aprovação da nova regra para o reajuste do salário mínimo, o crescimento da despesa obrigatória será significativo ao menos até 2025, tornando a meta de primário inexequível nesses próximos anos. Ou seja, se a credibilidade da regra já não é total, por que não ajustá-la à realidade?

Acontece que o abandono da meta de primário agora, evitando "a dor" de uma negociação com o Congresso para aprovação de aumento de tributos e afastando-se dos conflitos políticos de um contingenciamento, aumentará a incerteza em relação a qualquer novo anúncio de política econômica. Pode até rapidamente corroer a vitória que foi a manutenção da meta de inflação pelo CMN, em julho deste ano. Sem credibilidade fiscal, as expectativas de inflação não só não serão ancoradas em torno da meta de 3% como poderão começar a subir novamente e atrapalhar o processo de queda de juros já iniciado no mês passado.

O atual momento também não seria nenhum pouco favorável a uma possível mudança de meta de primário em razão do veto presidencial publicado na semana passada ao novo arcabouço fiscal. Ele derrubou a proibição de que a Lei de Diretrizes Orçamentárias previsse a exclusão de despesas primárias da meta de resultado primário. Ainda que a motivação do governo tenha sido acomodar operações com precatórios, o veto enfraquece o arcabouço, pois, em um cenário de dificuldade para encontrar receitas para o cumprimento da meta fiscal, o caminho para tirar gastos (por exemplo, investimentos do PAC) da meta fica desobstruído.

Nosso desafio para estabilizar a dívida já era enorme antes da PEC da Transição, que aumentou a despesa obrigatória em 2% do PIB sem nenhuma contrapartida, em um país que já mostrava enorme dificuldade em subir a carga tributária nas últimas décadas. Agora teremos de lidar com uma dívida maior, mas precisamos minimizar seu ritmo de crescimento a todo custo.

Como bem colocou Berry Eichengreen no seu trabalho apresentado em Jackson Hole, as dívidas públicas de vários países dispararam para níveis sem precedentes em tempos de paz e não diminuirão significativamente no futuro próximo. Teremos de conviver com essa nova realidade, já que grandes e persistentes superávits primários não estão nas cartas políticas e requerem um grau de solidariedade política que atualmente não existe em quase nenhum lugar do mundo.

Dívidas elevadas são geralmente um problema muito maior para países emergentes do que para economias avançadas. Em um cenário no qual as taxas de juros globais fiquem mais altas por um tempo prolongado, os desequilíbrios fiscais de alguns dos emergentes podem trazer maior vulnerabilidade do que a ocorrida no último grande movimento de elevação de dívidas —durante a grande crise financeira de 2008.

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