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Diretora do Instituto Gerar de Psicanálise, autora de "Criar Filhos no Século XXI" e “Manifesto antimaternalista”. É doutora em psicologia pela USP

Descrição de chapéu casamento

Grávida sexy perturba?

Gestação e sexualidade ainda dão nó da cabeça de homens e mulheres

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Ao imaginário ideal do abdome em forma de gomos, a gestante vem responder com a fruta inteira, no caso, a melancia. Na contramão do ideal imposto, segue o desejo exigindo satisfação. Não são poucos os casos nos quais a gravidez embanana a vida sexual de uma mulher e seu/sua companheiro/a. Podem surgir fantasias de machucar ou fazer o feto sofrer durante o sexo. Estão aí os médicos para desfazer mitos de que a relação sexual poderia ferir o bebê. Medo infundado, que as consultas de pré-natal ou mesmo uma olhada rápida no Google poderia resolver.

Tais impedimentos, no entanto, estão menos nos campo do anatomofisiológico do que das fantasias infantis que nos habitam, refratárias aos fatos.

É claro que a gravidez afeta a sexualidade, afinal, ela é um evento sexual, mas sexo, para a psicanálise, é tudo que está para além do orgânico, tudo o que soçobra da necessidade e do instinto. Para Freud o sexual está por todo o corpo, concentrado em partes, mas a partir da relação com quem cuidou, desde o nascimento. Daí que olhar, cheirar, tocar, ouvir, falar, escutar façam tanto ou mais parte do sexual do que o coito em si.

Grávida posa para fotos no Brooklyn, em Nova York - Ed Jones - 20.abr.21/AFP

Algumas culturas indígenas são ciosas do sexo durante a gestação pois acreditam que o esperma é que alimenta o bebê no útero. Sim, o sexo entre humanos é sempre cultural, como tudo o mais o que fazemos e consideramos erroneamente como dado pela natureza.

Qual não foi minha (grata) surpresa, então, quando soube que a querida Martha Nowill, atriz linda e talentosa, havia interpretado uma gestante que fazia sexo virtual em um dos episódios da série “5 X Comédia” (Prime Video). Acontece que, tendo acertado sua participação na série anteriormente, Martha descobriu-se grávida dos gêmeos Benjamin e Maximilian, que lhe deram, à época da gravação, um ventre indisfarçável.

O tema da grávida que tem que se virar para pagar as contas, depois de perder o “job”, saiu melhor do que a encomenda. Entre cenas impagáveis da atriz se descobrindo uma gestante sexy diante da tela do computador, um detalhe é digno de nota: a personagem nunca se desculpa pelo trabalho que realiza.

Seja por se tratar de uma profissional do sexo, seja por se tratar de uma gestante, não seriam poucas as concessões para tornar o episódio mais palatável ao gosto do cidadão do bem, afinal, trata-se de uma série de apelo popular. [Detalhe: no Brasil a prostituição não é crime, mas tampouco é regulamentada, como tenta conseguir o projeto de lei 4.211/12, de autoria do ex-deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ).]

É sabido que gestantes são consideradas especialmente sexy por muitos homens e mulheres e, se isso causa algum estranhamento, se deve ao fato de termos uma dificuldade historicamente datada e psiquicamente arraigada de associar sexualidade e maternidade.

Já tivemos a oportunidade de presenciar essa desmontagem em cena no belíssimo "Boi Neon" (2016), na qual Juliano Cazarré e Samia de Lavor —também gravidíssima— encenam um encontro sexual de tirar o fôlego. Gabriel Mascaro, diretor do premiado longa, faz questão de colocar as mulheres em uma atitude ativa e sexualmente desimpedida. O filme é imperdível pela forma como desnaturaliza estereótipos sem fazer uso de discursos, nem de militância.

Lutemos para que Max e Ben possam fazer parte de um mundo no qual mulheres não continuem a se penalizar nem sejam impedidas de viver sua sexualidade por serem mães. Nenhum filho merece carregar o fardo de ter - supostamente - tolhido a vida de uma mulher, principalmente da própria mãe.

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