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Jornalista e apresentador, autor de “A Fantástica Volta ao Mundo”.

Descrição de chapéu Olimpíadas 2024

'Après nous, le déluge'

Paris vai retomar seu ritmo, quem sabe até mais feliz

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Paris vai se despedindo dos Jogos Olímpicos. Os paralímpicos vêm aí, é verdade, mas a cidade-sede do maior evento desportivo do mundo já dá ares de que quer voltar ao normal. Ou a um novo normal.

A frase famosa que usei no título, atribuída segundo o dicionário de citações Larousse a Madame de Pompadour, favorita de Luís 15, descreve um cenário lúgubre que o rei vivia em meados do século 18. Como se uma grande inundação fosse inevitável depois de grandes contratempos.

Esses magníficos Jogos Olímpicos passam longe das complicações políticas que levaram à Revolução Francesa. Mas eu não comemoraria esse triunfo de logística, estética e segurança (até o momento em que aqui escrevo) ao lado de qualquer parisiense.

Torcida francesa em partida contra a Alemanha pelas quartas de final do handebol feminino - Reuters

Boa parte dos habitantes da cidade simplesmente adiantou suas férias de verão e deixou Paris bem antes da feérica, ainda que molhada, abertura do evento no rio Sena. Muitos que ficaram tentavam evitar mesmo sair às ruas para não cruzar os turistas olímpicos —"quel herreur"! E outros tantos disfarçavam que uma grande festa estava acontecendo.

Mas quem olhasse de perto, como eu fiz nos últimos dias, perceberia um certo orgulho desses mesmo parisienses de terem sido coadjuvantes de uma celebração mundial que deu tão certo. Longe da perfeição mas... "Quand même!" (ainda assim).

Dezenas de atletas pegaram Covid, que prestigiou também boa parte dos turistas ganhando até o status de mini surto. Um punhado deles passou mal ao disputar provas banhadas pelo Sena. O bilhete de metrô, indignação maior, custava o dobro do normal!

Mas isso é reclamação para o que chamo de "a turma do rejunte", pessoas que, diante de uma belíssima parede de azulejos art déco, como a do antigo restaurante Vivant, na rue des Petires Écuries, logo pensa: imagina o trabalho para limpar esse rejunte.

Aos muxoxos eu responderia: "vous avez tort, mesdames et messieurs", uma expressão quase intraduzível ao pé da letra, mas que quer dizer algo como "você não têm razão" —ou ainda "vocês têm... não razão" ou "vocês têm erro"! Quão adorável e polida é uma língua que não critica a pessoa ("você está errado"), apenas a ideia que ela tem? Mas eu divago...

Os críticos dos Jogos Olímpicos não querem é dar o braço a torcer. O que vi foi uma cidade relativamente tranquila, com pontuais problemas de circulação por curtos períodos. E uma impecável organização em todas as competições que presenciei.

Talvez sussurrando, uma vez que barulho é quase um tabu na cidade, os parisienses que ficaram contarão aos que migraram que "tout s'est bien passe" —tudo "rolou bem". A cidade inevitavelmente vai retomar seu ritmo, quem sabe até mais feliz.

Uma das melhores crônicas dessa temporada saiu na The Economist, proclamando: "Os Jogos Olímpicos ensinaram os franceses a torcer novamente". O verbo no título original em inglês é "cheer", que também serve para descrever animação, astral e até o que a gente chama de "dar um up".

E é por isso que acho que vou voltar em breve a andar pelas ruas de Paris ligeiramente mais feliz. Algumas rabugices são atávicas, estou ciente, mas tanto eu, visitante, quanto eles e elas, habitantes, saberemos driblar isso. Porque no final das contas... Foi "cool" —que aqui eles pronunciam "kúle".

Se vier uma enchente, ela vai ser de união e compreensão. De celebração de um pódio de ginástica com três atletas negras —uma brasileira no topo dele. De um super-herói francês nas piscinas. De uma judoca poderosa e dourada de Peruíbe (SP).

De gente linda demais para caber numa página.

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