Siga a folha

Descrição de chapéu
Gideon Rachman

China pode ser crucial para fim da Guerra da Ucrânia e começa a gostar da ideia de pacificação

Conflito prolongado no Leste Europeu está se tornando um peso estratégico para Pequim

Assinantes podem enviar 5 artigos por dia com acesso livre

ASSINE ou FAÇA LOGIN

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

Gideon Rachman

Colunista-chefe de relações exteriores do jornal nipo-britânico Financial Times

Financial Times

O impasse na Guerra da Ucrânia será rompido em Bakhmut ou em Pequim? No momento, todos os olhos estão voltados para a esperada contraofensiva ucraniana, que deve começar em breve. Mas também há fatos significativos na frente diplomática.

Na semana passada, Xi Jinping ligou para Volodimir Zelenski. Em uma recente visita a Kiev, fiquei surpreso com a grande expectativa –tanto no gabinete do presidente quanto no Ministério das Relações Exteriores– sobre essa conversa com o líder chinês. Agora a ligação de Xi-Zelenski finalmente aconteceu e, segundo o ucraniano, foi "longa e significativa". Pequim anunciou mais tarde que nomearia um enviado para trabalhar no sentido de um acordo de paz.

Putin cumprimenta Xi Jinping durante visita do líder chinês ao Kremlin, em Moscou - Serguei Karpukhin/Sputnik/AFP

Há razões óbvias para se desconfiar dos esforços diplomáticos da China. Xi enfatizou repetidamente sua consideração por seu "querido amigo" Vladimir Putin. O plano de paz da China para a Ucrânia, divulgado no início deste ano, era vago e não exigia a retirada das tropas russas. Há claros benefícios de propaganda para Pequim em se proclamar interessada pela "paz", embora não faça muito a respeito. Mesmo que a China esteja falando sério, será extremamente difícil superar o abismo entre Kiev e Moscou.

No entanto, é errado descartar a ideia de que a China poderia desempenhar um grande papel no fim desse conflito brutal. Por diferentes razões, Ucrânia, Rússia, Estados Unidos, Europa e a própria China têm um potencial interesse no envolvimento de Pequim.

Os ucranianos entendem que Xi tem uma influência única sobre Putin, caso ele decida usá-la. Diante das sanções ocidentais, a Rússia depende da China para manter sua economia à tona.

O governo Biden avalia que há muito pouca probabilidade de a China exercer uma pressão significativa sobre a Rússia, e algumas autoridades graduadas ainda temem que Pequim vá na direção oposta e forneça armas à Rússia. Mas os ucranianos estão mais esperançosos. Eles pensaram ter visto sinais reais de tensão entre Putin e Xi durante a recente visita do presidente chinês a Moscou –e até afirmaram para mim que Xi abreviou sua visita.

Por que Xi estaria perdendo a paciência com Putin? Não há dúvida de que os líderes russo e chinês estão unidos na hostilidade ao poder dos Estados Unidos. Uma rápida vitória russa na Ucrânia poderia ter sido útil para a China. Mas uma guerra prolongada está se tornando um peso estratégico para Pequim. Em vez de enfraquecer o sistema de aliança liderado por Washington, a guerra aproximou as democracias dos EUA, da Europa e da Ásia.

A China passou décadas tentando ampliar sua influência na Europa. Mas sua autoproclamada parceria "ilimitada" com a Rússia convenceu muitos europeus de que Pequim hoje também é uma ameaça. Americanos e europeus estão usando a mesma linguagem sobre "remover o risco" de seu relacionamento com a China reduzindo as dependências econômicas. Isso é importante para Pequim porque a União Europeia é o maior mercado de exportação da China. Os laços militares entre o Japão, a Europa e os EUA também estão se fortalecendo.

A melhor maneira de Pequim reconstruir sua reputação na Europa seria desempenhar um papel visível e positivo no fim da guerra. Esse tipo de movimento também teria um impacto global –apoiando a narrativa preferida de Xi de que o poderio americano está recuando e que a China é uma força de paz.

Certamente há evidências de que Pequim começa a gostar do negócio de pacificação. A China está aproveitando a publicidade positiva obtida por seu papel na normalização das relações entre o Irã e a Arábia Saudita. Os chineses presidiram recentemente uma conferência em Samarcanda sobre a paz no Afeganistão. Pequim chegou a falar em mediar o processo de paz entre israelenses e palestinos. (Quando mencionei isso em Washington, a notícia foi recebida com um sorriso e um "boa sorte com essa".)

Dada a crescente rivalidade entre Washington e Pequim, poderíamos esperar que os EUA tivessem uma visão negativa do envolvimento da China na Ucrânia. Mas, após algum debate interno, o governo Biden decidiu não descartar a iniciativa de paz chinesa de imediato, mas sim tentar moldá-la.

Os americanos entendem os perigos de parecerem "antipaz". Mas não é só isso. Os EUA também estão cada vez mais interessados em encontrar uma maneira de acabar com a Guerra da Ucrânia. Washington sabe que quanto mais tempo o conflito durar mais difícil será manter um consenso ocidental sobre despejar bilhões em ajuda militar e econômica na Ucrânia.

A visão dominante em Washington e em muitas capitais europeias é que os ucranianos devem receber o máximo de apoio possível, antes de sua contraofensiva. O objetivo ucraniano é obter uma vitória tão decisiva que a era Putin termine. Mas é uma meta muito difícil. Um resultado mais provável é que a Ucrânia fortaleça sua posição no campo de batalha, antes das negociações de paz.

Tem havido muita discussão sobre se a aliança ocidental algum dia pressionaria a Ucrânia a negociar. Menos discutido, mas provavelmente mais importante, é quem poderia forçar a Rússia a fazer concessões significativas –incluindo retirar-se do território ocupado e abandonar o esforço para destruir a Ucrânia.

A única resposta plausível para essa pergunta é a China. Somente Xi pode oferecer um caloroso aperto de mão a Putin em público e um braço torcido em particular. Em algum momento, o líder chinês poderá decidir que é do interesse de seu país fazer exatamente isso.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

Receba notícias da Folha

Cadastre-se e escolha quais newsletters gostaria de receber

Ativar newsletters

Relacionadas