Crônica de Paris: a greve de 2019
Parisienses convivem bem com situação anormal
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Bem que nos preveniram para não vir a Paris neste momento de greve. Ainda por cima, a previsão do tempo anunciava chuva todos os dias e muito frio. Para o trajeto do aeroporto ao hotel, deveríamos prever terríveis duas horas.
Teimosos, desembarcamos no Charles de Gaulle por volta do meio-dia do último dia 9, uma segunda-feira. O tempo estava encoberto, mas firme. A temperatura amena, 12 ºC. E, em 45 minutos, estávamos no boulevard Saint-Germain.
Tanto na segunda-feira como na terça (10), os elegantes pisca-piscas azuis e as sirenes estridentes da polícia avisavam que alguma coisa acontecia para além das ruas meio desertas do 6º “arrondissement” (distrito). A combinação dos silvos das viaturas com o toque dos sinos das igrejas nas horas redondas produzia curiosas sinfonias, um fundo musical adequado à cenografia reinante.
Para um turista que conhece Paris, a greve pode trazer alguma vantagem. Os táxis circulam, embora sejam mais disputados. O Museu d’Orsay não tinha filas na terça-feira. Por falta de funcionários, a entrada foi liberada; só o vestiário não funcionava. Havia pouca gente, talvez a única ocasião de ver (ou rever) calmamente a exposição “Degas na Ópera” sem ser empurrado ou atropelado.
O concerto das 12h30 ocorreu normalmente, auditório cheio, e ainda agradeceram aos que se deslocaram para assisti-lo. Tudo fecha mais cedo, as lojas e até os restaurantes. Nos cafés, dois temas monopolizam as conversas: a idade mínima da aposentadoria e a greve.
Cada um explica sua expectativa de aposentadoria, fazendo contas e, em geral, discordando do projeto do governo. Depois de relatar os inconvenientes de cada um com a paralisação dos transportes, em geral apoiam a greve e censuram o governo.
Na quarta-feira (11), o primeiro-ministro Édouard Philippe anunciou as linhas gerais da reforma pretendida. Acabar com os regimes diferenciados e estabelecer um sistema único de Previdência. E adotar a idade mínima de 64 anos para os nascidos depois de 1975.
Depois de ter feito concessões aos “gilet jaunes” (coletes amarelos), parece que o governo agora escolheu o caminho da firmeza. Os sindicatos não se sensibilizaram, e muitos já apostam que a greve vai até o Natal.
As manifestações públicas foram as maiores depois de muito tempo, como é possível ver na televisão. Mas o clima, até então, é tranquilo. Os parisienses convivem bem com essa situação fora do normal, numa espécie de recreio da escola.
Nada lembra 1968, e um sociólogo apontou uma aparente contradição. Embora o projeto de mudança vise maior igualdade, o povo resiste. E ressalva: afinal, se a elite sempre defendeu seus privilégios, é normal que os trabalhadores também defendam os seus.
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