Café na Prensa

Tudo sobre a bebida, do grão à xícara

Café na Prensa - David Lucena
David Lucena

Café é produto que mais preocupa o Brasil após norma antidesmatamento europeia

Metade da exportação da cafeicultura brasileira tem como destino a Europa, e setor corre para se adequar à lei

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

O café é a commodity que mais preocupa o Brasil após a aprovação da lei pela União Europeia que proíbe a importação de produtos provenientes de área com desmatamento.

Isto porque, diferentemente de outros itens afetados pela norma, o café tem uma proporção muito grande de exportação para o bloco europeu.

O Regulamento da União Europeia para Produtos Livres de Desmatamento (EUDR) proíbe a importação de produtos provenientes de áreas com desmatamento identificado até dezembro de 2020. A lei passa a ser aplicada em janeiro de 2025 e incide sobre soja, madeira, café, cacau, óleo de palma, carne bovina e borracha.

A Europa é o principal destino do café brasileiro. Cerca de metade de todo o café exportado pelo Brasil tem como destino a União Europeia, razão pela qual a norma preocupa o setor.

Plantações de café vista do alto
Vista de plantações de café na região de Guaxupé (MG) - Joel Silva/Folhapress

"Do ponto de vista de representatividade, o café é o que mais nos preocupa. Porque, por exemplo, apesar de a soja ter exportado US$ 8,8 bilhões para a Europa no ano passado, isso foi 14,5% do que a gente exportou", disse Sueme Mori, diretora de relações internacionais da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), durante entrevista na Semana Internacional do Café, em Belo Horizonte, na última quinta (9).

A norma europeia exige uma série de comprovações de que não houve desmatamento. Como muitos dos produtores de café brasileiro são pequenos proprietários de terra, há uma dificuldade em produzir essas evidências, uma vez que elas demandam tecnologia e custos.

Por isso, a legislação sofreu críticas de setores produtivos no Brasil e em outros países –sobretudo na América Latina e na África– por ter sido uma decisão unilateral dos países europeus e sem nenhum tipo de auxílio aos produtores.

Em entrevista concedida ao Café na Prensa em agosto, a diretora-executiva da Organização Internacional do Café, Vanusia Nogueira, disse que a predominância na cafeicultura mundial é de pequenos proprietários e que este é um problema enfrentado por todos os países produtores. Segundo ela, é preciso discutir quanto essa implementação vai custar e como ela será financiada.

"Uma coisa é você exigir tudo aquilo que eles estão exigindo de grandes produtores, que têm toda uma infraestrutura e muitas vezes têm empresas por trás para apoiar. Outra coisa é você exigir isso de pequenos produtores, em muitos dos países produtores mínimos", disse Nogueira.

"Eles exigirem demais de um lado, que vai levar uma pessoa que já vive na miséria a uma miséria absoluta, é uma incoerência com a própria preocupação europeia com o social", disse.

Philip von der Goltz, gerente da importadora alemã List + Beisler, vai na mesma direção. Ele afirma que é urgente combater o desmatamento, mas a maneira como a norma está sendo imposta pode ter efeitos colaterais sociais nocivos.

"O risco, ao forçar isso na velocidade em que estão forçando, é que haverá muitos países pequenos –ou países maiores, mas com infraestruturas desorganizadas–, como na África Ocidental, onde nem mesmo há eletricidade em certas partes das áreas rurais –portanto, esqueça esse tipo de informação que estão pedindo... então, o que acontecerá, se não mudarem a lógica, muito provavelmente, é que o trader se afastará dessas origens que desesperadamente precisam do café como fonte de renda e se voltará para parceiros mais confiáveis, que são capazes de trazer essas informações, esses dados", diz von der Goltz.

Com isso, o setor corre atrás para conseguir rastrear a produção e emitir as evidências exigidas pela legislação europeia. Como o Café na Prensa mostrou, a lei desencadeou uma correria por rastreabilidade.

Uma das principais empresas responsáveis por desenvolver tecnologia de rastreabilidade, a Safetrace diz que a procura pelos seus serviços disparou após a aprovação da lei europeia. Se antes eles tinham que prospectar muitos clientes, agora precisam concentrar seus esforços em atender a demanda dos interessados que os procuram.

A questão da rastreabilidade foi um dos principais temas discutidos na Semana Internacional do Café deste ano, que ocorreu de 8 a 10 de novembro em Belo Horizonte. O mais importante evento do setor na América Latina costuma reverberar as tendências do mercado e mostrar para onde o setor caminha.

"Essa rastreabilidade precisa ser bem estabelecida. Então, quando o comprador, o exportador, por exemplo, compra de um intermediário, ele precisa dizer ao intermediário, ‘ei, eu preciso ter os dados do produtor, eu preciso saber de qual fazenda esses cafés estão vindo’. Essa é a parte complicada, eu acho", diz von der Goltz.

Apesar da preocupação, o Brasil é um dos mais preparados para lidar com a nova regra europeia, uma vez que tem fazendas maiores e mais estruturadas do que países como Colômbia, Etiópia e Quênia.

Além disso, o Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil) tem atuado fortemente para conseguir desenvolver tecnologias de rastreabilidade que sejam capazes de atender às exigências da EUDR.

Em janeiro, inclusive, o conselho deve lançar uma plataforma de rastreabilidade própria. O lançamento vai ocorrer em Bruxelas, justamente para mostrar ao mercado europeu que o Brasil está correndo para se adequar à lei.

Acompanhe o Café na Prensa também pelo Instagram @davidmclucena e pelo Twitter @davidlucena

Qual assunto você gostaria de ver aqui no blog? Envie sugestões para david.lucena@folhapress.com.br

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.