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Café na Prensa - David Lucena
David Lucena

Lei antidesmatamento da UE fere nossa soberania, diz ministro da Agricultura

Fávaro afirma que imposição de norma ambiental 'é cláusula pétrea para não ser tocada no acordo Mercosul-UE'

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Barra de Santo Antônio (AL)

O ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro (PSD-MT), disse que o Brasil tem suas próprias legislações ambientais e que a imposição de normas internacionais fere a soberania do país e não será admitida.

O ministro respondia ao questionamento do Café na Prensa sobre o Regulamento da União Europeia para Produtos Livres de Desmatamento (EUDR).

"O Brasil tem legislação competente para legislar com relação a meio ambiente e produtores rurais. Não venham querer nos impor legislação, que isso fere inclusive a nossa soberania. Nós não vamos admitir. Essa é cláusula pétrea para não ser tocada no acordo Mercosul-União Europeia. E se querem uma boa vizinhança, uma boa parceria e grandes oportunidades com o Brasil, tirem isso da mesa", disse.

Carlos Fávaro durante entrevista em abril, em Brasília - Ueslei Marcelino/Reuters

Questionado se a lei poderia obstruir o fechamento do acordo entre o Mercosul e a União Europeia, ele disse que ela atrapalha as relações.

"A manutenção dessa legislação atrapalha as nossas relações comerciais com a União Europeia. Nós sabemos da nossa responsabilidade, mas sabemos também da nossa soberania", disse.

O Regulamento da União Europeia para Produtos Livres de Desmatamento (EUDR) proíbe a importação de produtos provenientes de áreas com desmatamento identificado até dezembro de 2020. A lei passa a ser aplicada em janeiro de 2025 e incide sobre soja, madeira, café, cacau, óleo de palma, carne bovina e borracha.

As declarações do ministro ocorreram na noite desta quarta-feira (15), após a cerimônia de abertura do 29º Encontro Nacional da Indústria de Café (Encafé), evento organizado pela Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café), que reúne alguns dos principais empresários do setor no município de Barra de Santo Antônio, litoral norte de Alagoas.

Como o Café na Prensa mostrou, o café é a commodity que mais preocupa o Brasil após a aprovação do regulamento europeu. Isto porque, diferentemente de outros itens afetados pela norma, o café tem uma proporção muito grande de exportação para a região. Cerca de metade de todo o café exportado pelo país tem como destino a União Europeia.

A norma exige uma série de comprovações de que não houve desmatamento. Como muitos dos produtores de café brasileiro são pequenos proprietários de terra, há uma dificuldade em produzir essas evidências, uma vez que elas demandam tecnologia e custos.

Por isso, a legislação sofreu críticas de setores produtivos no Brasil e em outros países –sobretudo na América Latina e na África– por ter sido uma decisão unilateral dos países europeus e sem nenhum tipo de auxílio aos produtores.

Em agosto, a diretora-executiva da Organização Internacional do Café, Vanusia Nogueira, disse que é preciso discutir quanto essa implementação vai custar e como ela será financiada.

"Uma coisa é você exigir tudo aquilo que eles estão exigindo de grandes produtores, que têm toda uma infraestrutura e muitas vezes têm empresas por trás para apoiar. Outra coisa é você exigir isso de pequenos produtores, em muitos dos países produtores mínimos", disse Nogueira.

Philip von der Goltz, gerente da importadora de café alemã List + Beisler, afirma que a maneira como a norma está sendo imposta pode ter efeitos colaterais sociais nocivos, sobretudo em locais com estruturas mais precárias, como países produtores da África, nos quais há certas áreas rurais em que sequer há eletricidade.

"O que acontecerá, se não mudarem a lógica, muito provavelmente, é que o trader se afastará dessas origens que desesperadamente precisam do café como fonte de renda e se voltará para parceiros mais confiáveis, que são capazes de trazer essas informações, esses dados", diz von der Goltz.

No Brasil, o regulamento desencadeou uma corrida por rastreabilidade. Produtores e exportadores tentam implementar tecnologias capazes de rastrear a produção e emitir as evidências exigidas pela legislação europeia.

Apesar da preocupação, especialistas dizem que o Brasil é um dos mais preparados para lidar com a nova regra europeia, uma vez que tem fazendas maiores e mais estruturadas do que países como Colômbia, Etiópia e Quênia.

Além disso, o Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil) tem atuado fortemente para conseguir desenvolver tecnologias de rastreabilidade que sejam capazes de atender às exigências da EUDR.

Em janeiro, inclusive, o conselho deve lançar uma plataforma de rastreabilidade própria. O lançamento vai ocorrer em Bruxelas, justamente para mostrar ao mercado europeu que o Brasil está correndo para se adequar à lei.

O jornalista viajou a convite da Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café).

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