Ciclocosmo

Um blog para quem ama bicicletas

Ciclocosmo - Caio Guatelli
Caio Guatelli

Presos de Jundiaí ganham formação em mecânica de bicicletas

Além da capacitação profissional, curso pode ajudar na redução da pena

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O catarinense Fábio da Silva Damião, 24 anos, é um operário da construção civil sem formação profissional. Deixou a pequena cidade de Saudades, com menos de 10.000 habitantes, e decidiu tentar novas chances de trabalho em São Paulo. Sonhava em ser patrão, em ter seu próprio negócio.

Tudo o que conseguiu foi a inevitável combinação de rotina exaustiva e pouco dinheiro. Como a maioria dos retirantes, aprendeu depressa a chamar isso de realidade.

Atrás de um portão de cadeia, homem caminha ao lado de uma bicicleta
Após receber aulas de mecânica, preso testa bicicleta no pátio de cadeia de Jundiaí. - Caio Guatelli

Oprimido, manteve seu sonho confinado nos dormitórios superlotados do canteiro de obras de seu último trabalho.

Em abril de 2020, nos devaneios de um domingo manguaçado, escapou da rotina e se envolveu numa briga de faca. Desde então, num outro ajuste de contas, desta vez com a justiça, viu qualquer resto de sonho ser transformado em um pesadelo acordado.

De dormitório de obra para cela de cadeia, seu confinamento superlotado se tornou inescapável.

Histórias como a de Damião se multiplicam aos montes por aí, disso todo mundo sabe. A novidade, para muitos desesperançados, é que atrás das grades existem boas oportunidades. A última delas vem do CDP (Centro de Detenção Provisória) Marcos Antônio Alvez Bezerra, em Jundiaí (interior de São Paulo), onde é oferecida capacitação profissional para montagem e manutenção de bicicletas.

O curso, batizado de Projeto Pedalar, está disponível para a população de 1230 presos provisórios que superlotam aquela cadeia —a capacidade máxima é de 848 detentos.

Dentro dos muros, em celas adaptadas, funcionam o espaço para aulas teóricas, com lousa e carteiras escolares, e uma oficina prática, onde estão duas bancadas de trabalho, uma dúzia de ferramentas e duas bicicletas doadas pelo Instituto Ação pela Paz.

À frente das aulas está o voluntário Marco Antônio Bueno. "Nesse espaço eles tem a chance de conhecer uma nova profissão e exercitar a mente de forma produtiva, numa atividade diferente", diz o professor ao mostrar a cela de aula através das barras de aço.

Alexandre Apolinário de Oliveira, diretor do CDP e um dos criadores do projeto, comenta que a ideia surgiu quando sua equipe identificou que a crescente demanda por mecânicos de bicicleta poderia ser uma oportunidade para o preso provisório.

"Procuramos um nicho de mercado onde o próprio preso, depois de livre, poderá montar seu negócio e não mais reincidir no crime. Nossa missão é transformar a realidade dos que passam por aqui", diz Oliveira.

As aulas, que começaram em 18 de março, tem duração de um mês e fazem parte do plano de remição de pena —a cada três dias estudados ou trabalhados, o preso tem descontado um dia de sua futura condenação.

Na semana passada, Damião completou sua quarta aula e já soma 12 horas para seu plano de remição de pena.

"Bicicleta para mim tem o significado de liberdade", diz o preso enquanto segura seu primeiro diploma de capacitação profissional.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.